Por Mauro Santayana, na Revista do Brasil:
Todas as grandes nações do mundo se ergueram sobre espaços amplos, população instruída, e o ânimo de grandeza. Essas são as condições para que seu povo disponha de autoestima, identidade nacional, e exerça sua influência política e econômica em sua região.
Há países que nascem suficientemente fortes, do ponto de vista territorial e populacional, em determinado continente para o exercício de sua liderança. Esse foi o caso dos Estados Unidos, com relação às Américas, da independência até meados da segunda metade do século passado, ou da Rússia, no território ocupado pela União Soviética, depois da Revolução de Outubro.
Outras nações, ainda que desprovidas de grandes territórios ou população, conseguiram estender sua influência para além de suas regiões de origem, como, por exemplo, Portugal, que foi buscar na África, na Ásia e na América do Sul, uma dimensão que não tinha em sua própria Península, ou no contexto continental daquela época.
Sem autoestima e identidade nacional, os portugueses não teriam cruzado o Atlântico. Os Estados Unidos não se teriam transformado, por extenso período, na nação mais poderosa do mundo. A URSS não teria derrotado o nazismo, ou enviado o primeiro satélite, o primeiro foguete, o primeiro homem para a órbita da Terra, dando início à conquista do espaço.
Sem autoestima e identidade nacional, a China não teria erguido, há 4 mil anos, a Grande Muralha, e construído o Exército de Terracota, nem teria chegado onde se encontra, prestes a se transformar na maior economia do planeta – por poder paritário de compra – antes de dezembro, e na nação mais importante do mundo, nos próximos anos.
Sem autoestima, e identidade nacional, o Brasil não teria, nos últimos anos, contribuído para a derrocada progressiva do G-8, participando decisivamente da criação do G-20; nem do Mercosul, para a qual se esforçaram os cinco últimos presidentes da República; nem fundado a Unasul - União das Repúblicas Sul-Americanas; nem o Conselho de Defesa Sul-Americano, criando as condições para o estabelecimento natural e pacífico de nossa influência política e econômica, no restante do continente.
Há outros países como o México, por exemplo, que, ainda que quisessem, não conseguiriam fazer o mesmo. Na região do mundo em que se situa o México, o país mais importante em economia, território, população, são os Estados Unidos, que lhe tomaram, em ato de guerra, boa parte do território. Além do vizinho do norte, que projeta sobre ele esmagadora influência, o México só faz fronteira com Belize e Guatemala, duas pequenas nações, do ponto de vista territorial e demográfico, que não pertencem ao Nafta, e são incapazes de se aliar a ele em qualquer tipo de alternativa geopolítica ou econômica.
Além do Mercosul, e da Unasul, a influência brasileira se exerce, do ponto de vista global, no Brics, a aliança que nos une à Rússia, China, Índia, e África do Sul, países que têm, como característica, ser – como o Brasil –, cada um à sua maneira, o mais poderoso em suas respectivas regiões.
No âmbito do Brics, se negociarmos, com inteligência, com os chineses, a criação de joint ventures industriais, meio a meio, para o atendimento ao nosso mercado interno, evitaremos que todo o lucro tome, todos os anos, o caminho do exterior, como ocorre com as multinacionais instaladas no Brasil, que são majoritariamente europeias e norte-americanas.
Com a Rússia, e com nossos outros sócios, como os chineses e indianos, podemos aprender a explorar o espaço, como já estamos fazendo, construindo, de igual para igual, satélites como os CBERS sino-brasileiros. Com a Índia, podemos aprender em matéria de software e da capacitação maciça de engenheiros na área de TI.
Com todos eles podemos desenvolver e produzir armamento para defender, se necessário, o quinto território do mundo, e as riquezas da Amazônia Azul, que se escondem em nossas águas do Atlântico. Obtendo a tecnologia de ponta, na área de defesa, que sempre nos foi negada pelos europeus e norte-americanos.
Afinal, se Índia, China e Rússia fossem nações atrasadas, estudantes e cientistas desses países não estariam à frente das maiores descobertas científicas realizadas nos últimos anos, no “ocidente”. Nem venceriam, como estão fazendo os chineses e suas universidades, as maiores competições acadêmicas internacionais.
Na economia, a única região do mundo em que ainda temos competitividade em manufatura – o que se deve também ao protecionismo norte-americano e da União Europeia – é a América Latina, e, mais especialmente, a América do Sul.
Apresentar a Aliança do Pacífico como contraponto ao Mercosul, que nos deu mais de US$ 50 bilhões em superávit nos últimos dez anos, é uma balela. O México só sobrevive por estar na fronteira sul dos Estados Unidos, o maior mercado do mundo. Fazer um acordo de livre comércio com os Estados Unidos não nos aproximaria nem um centímetro a mais de suas fronteiras, que continuariam a milhares de quilômetros e tão distantes de nossos produtos como estão agora.
Nossos salários são muito maiores que os do México. Crescemos mais que eles nos últimos dez anos – incluindo 2013 – e somos superavitários com nações, como a China, que usam o México como plataforma de exportação, enquanto a indústria do país de Zapata teve com Pequim US$ 51 bilhões de prejuízo no último ano. Não existe seguro-desemprego no México. Sessenta por cento de sua população se encontra na informalidade, e ele é, segundo a própria OCDE, organização a que pertence, o país mais desigual das Américas. Ao contrário do México, exportamos mais para o Mercosul do que para os Estados Unidos, e é natural que o façamos, já que não temos fronteira com os Estados Unidos, mas dividimos as nossas com nove diferentes países sul-americanos.
Dizer que os Estados Unidos ou a Europa serão para nós mercados maiores que nossos vizinhos é ignorar a geografia e se burlar da história. Basta ver quantos contenciosos já tivemos com os Estados Unidos, devido a barreiras impostas por eles para nossos produtos, entre eles o aço, o etanol, o suco de laranja etc.
Os acordos assinados entre a Rússia e a China, no dia 21 de maio, para cooperação científico-militar e a exportação de gás no valor de US$ 400 bilhões, mostram onde está o dinheiro, o poder e o futuro. Certamente, ele não está nem em uma Europa decadente, nem em um Estados Unidos que nada nos ofereceram de justo no passado, e que nos compram cada vez menos, sem nos dar um centavo de superávit.
Recente levantamento, realizado pela agência inglesa Ipsus-Mori, em 20 grandes países, comprova isso. Segundo a pesquisa, os norte-americanos são mais pessimistas que os mexicanos, e na França só 7% da população considera que o mundo em que viverão seus filhos será melhor que o de agora. Depois, vêm os 13% de otimistas da Bélgica e os 16% da Espanha, enquanto os habitantes dos Brics são os mais confiantes, com 81% dos chineses, por exemplo, afirmando que o amanhã será muito melhor do que o presente.
Nosso futuro está nos Brics, no qual seus quatro maiores membros se encontram – incluído o Brasil – por qualquer critério, entre as dez primeiras economias do mundo.
O nosso destino, e principal opção estratégica, é fortalecer nossa cooperação com os vizinhos, e nos aliarmos à Rússia, Índia, China e África do Sul, na única aliança que nos pode oferecer um lugar no mundo nas próximas décadas. Ou assumimos isso – uma situação e uma atitude à altura de nossa história e geografia – ou partimos para a abjeta entrega, aos interesses europeus e norte-americanos, de nosso território, recursos, consumidores e do mercado sul-americano.
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