CLUBISTAS DA LUTA: USEM O MEU PORÃO
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CLUBISTAS DA LUTA: USEM O MEU PORÃO


Edward Norton no trabalho, antes de virar homem.

Mesmo que veja com desconfiança uma mensagem anti-consumista vinda de milionários de Hollywood, eu concordo com o lado anti-capitalista de Clube da Luta. Tudo bem, eu também acho que, em geral, temos empregos que não gostamos apenas para comprar coisas que não precisamos. Eu, particularmente, sinto-me superior aos protagonistas do filme, pois quando o Brad Pitt pergunta ao Edward Norton “Como é que nós sabemos o que é um duvet?”, eu penso: eu não sei o que é isso (parece que é um cobertor), nunca ouvi falar, nem dou a mínima pra roupas ou móveis. Eu já sou anti-consumista, e - surpresa! - sem precisar bater em alguém pra encontrar sentido na vida.
Entendo também que eles queiram “despertar” as pessoas - aliás, só os homens (leia sobre a misoginia em Clube aqui) -, fazê-las sair do seu torpor apático causado pelo consumismo. Inicialmente, os planos terroristas de Brad são trocar as imagens nos aviões, para que revelem pânico numa situação de emergência, ao invés de calma; incluir imagens pornôs em filmes de família (funciona: vemos uma menina chorando), e urinar em pratos de restaurantes caros. Esta última parte não serve pra nada, além de satisfazer um desprezo pessoal pelos ricos, e marcar território com urina e esperma (uma característica de machos de várias espécies, essa de marcar território). Mas é só ódio, que não conscientiza ninguém. É como o Patrick Bateman de Psicopata Americano pedindo que sua namorada coma uma sobremesa com cobertura de chocolate que, por baixo, contém a urina de vários homens (a diferença é que, em Psicopata, o próprio título nos avisa que estamos diante de um serial killer misógino, não de um herói admirado por todos, que é como Brad é pintado em Clube). Num segundo momento, os planos terroristas de Brad, mais ambiciosos, são de destruir prédios, empresas de cartões de crédito, e cafés. Quando eles criam uma organização terrorista com hierarquia militar fingindo ser anarquista, o filme fica fascista que dói.
Também acho patético que o antídoto ao anti-consumismo e à apatia seja a porrada. O filme é totalmente sobre male bonding (união entre homens), e deixa claro que essa união só pode acontecer se as mulheres forem 100% excluídas e se eles se reconstruírem como homens através da violência. Edward vira homem quando bate (mesmo que precise bater em si próprio). É a violência que os une e os define. Até mesmo o comportamento esquizofrênico de Brad/Edward diminui quando estão lutando. Eles não têm tanta coisa em comum além desse apetite pela violência. Os outros homens do clube da luta geralmente se abraçam e se cumprimentam após se arrebentarem. São amigos, e vivem pra lutar. O filme não faz qualquer crítica a esse tipo de mentalidade. Pelo contrário, a aplaude.
Eu nem teria grandes problemas com essa ideologia, se o espancamento entre homens fizesse com que eles se tornassem menos violentos com as mulheres. Se clubinhos de porrada fizessem com que as guerras diminuíssem, se extravasar a energia e a agressividade se dessem através de surras apenas entre eles, acho que eu até seria a favor. Eu empresto o meu porão: fiquem à vontade. Só limpem o sangue e os cacos de garrafa ao saírem, por favor. Porém, como é um tipo de união que só pode ser atingido excluindo as mulheres, como qualquer intimidade com mulheres é proibida, como se exclui qualquer característica “feminina” (como solidariedade, empatia, carinho), a gente sabe que uma sociedade alternativa dessas não pararia aí. Esses machos precisariam gastar sua energia sexual em algum objeto, e o que melhor que as mulheres pra isso? Sem tempo ou disposição pra conquista, pra sedução, pras preliminares, eles tomariam as mulheres à força mesmo.
O filme é tão centrado no falo que não é à toa que sua última imagem seja a de um pênis. É até irônico que só o vejamos por um milésimo de segundo. Ué, pensei que tivesse passado as últimas duas horas vendo só isso.Mulheres são um empecilho à masculinidade plena.




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