Geral
Como abrir uma cidade para todos
Por Renata Mielli, no blog Janela sobre a palavra:
Pode parecer maluquice, mas as cidades estão cheias de portas, muitas delas fechadas por sete chaves e muitos reais. Principalmente as grandes, megalópoles como São Paulo, que tem uma área de 1530 km2 e mais de 18 milhões de habitantes que vivem em um território marcado por profundas diferenças econômicas, sociais e geográficas que acabam determinando quem pode ir, fazer o que e como.
Por isso, faz sim muito sentido a iniciativa da prefeitura em lançar o projeto São Paulo Aberta para articular, integrar e fomentar as ações na cidade com participação social. E uma das premissas para a população poder participar, opinar e fiscalizar qualquer iniciativa de um governo é a transparência e o diálogo.
Este foi um dentro os vários temas tratados na entrevista promovida pelo São Paulo Aberta com o Secretário Municipal de Cultura, Juca Ferreira, a blogueiros nesta segunda-feira, 04 de agosto. Participaram os blogs da Cidadania, SpressoSP, Blog do Miro, e o Janela.
Cultura para uns
Ao chegar em São Paulo para assumir a secretaria, Juca Ferreira disse que se espantou com as poucas iniciativas públicas para a Cultura numa cidade do tamanho de São Paulo. “O público é precário para que o privado atue”, disse Ferreira. A frase resume bem como o poder econômico foi moldando uma cidade que, em suas palavras,“foi feita para o trabalho”. Questionado sobre como ele percebia o paulistano, respondeu que “não existe um paulistano médio”, porque o que há aqui é uma grande diversidade de nacionalidades e regionalidades. Mas um traço marcante no comportamento do paulistano o incomodou: “assusta o conservadorismo sistêmico, que dificulta a pessoa de estar próxima da alegria”. Para exemplificar, ele falou das inúmeras cartas e reclamações de cidadãos com queixas sobre festas, atividades culturais de rua, eventos.
A classe média paulistana prefere os espetáculos privativos, em casas de shows hermeticamente fechadas, não é à toa que os espaços públicos, as ruas, foram se esvaziando e deixadas ao abandono. “São Paulo teve a ilusão de que cabia num shopping”, disparou o secretário de Cultura.
Mas essa sensação foi um engano, que ficou mais evidente a partir da inclusão econômica e social promovida pelo país nos últimos anos. Reflexo disso, é que crescem as demandas de políticas, principalmente as voltadas para as camadas sociais mais baixas. “A periferia quer tudo o que nunca teve e que tem direito a ter”, disse. "Há uma demanda reprimida e São Paulo tem muito pouco a oferecer”, avaliou.
Iniciativas se multiplicam para aumentar o acesso e produção
Um vetor importante para as políticas da prefeitura é o da reocupação do espaço público. Daí a importante iniciativa de reabrir cinemas e teatros de rua, iniciativa que pode ser bem ilustrada pela reinauguração do Cine Belas Artes. E um dos entraves para ações como esta é a especulação imobiliária. “Temos atualmente 12 teatros com ameaça de serem expulsos pela especulação imobiliária. A atividade cultural valoriza e revitaliza uma área”, destacou. Mas lamentou que a prefeitura sozinha não tem como enfrentar essa questão e disse que é preciso recuperar a vocação cultural do centro de São Paulo.
Ainda como parte desta estratégia de reocupação do espaço, Juca Ferreira se referiu à Virada Cultural. Quando assumiu a secretaria, foi se informar sobre o projeto e avaliar se deveria ou não dar continuidade. Mas ele percebeu que a avaliação positiva da Virada não era principalmente pelos shows e atividades culturais que ela oferece, mas sim pela possibilidade de convivência entre as pessoas e de recuperação do espaço da cidade como centro de vivência.
Nesse sentido, vieram a descriminalização do Hip Hop e do Funk, que estavam proibidos na cidade, e também a legalizou das manifestações carnavalescas.
Juca Ferreira deu um panorama do que está sendo construído no âmbito da Secretaria de Cultura para que se possa enfrentar este déficit de políticas culturais para a cidade. Referiu-se a equipamentos culturais que já são consagrados e que referências, como o Centro Cultural São Paulo – local em que ocorreu a entrevista – e o teatro municipal.
O primeiro, na avaliação de Juca talvez seja o equipamento cultural mais bem sucedido de São Paulo. “Quando eu cheguei já havia uma boa programação e ocupação deste espaço. A sociedade se sente proprietária deste espaço”, e por isso, ele manteve a equipe e a vocação do Centro Cultural.
Com relação ao Teatro Municipal, houve uma ampliação das apresentações próprias e se expandiu a estrutura de formação para outros pontos da cidade, com o objetivo de facilitar o acesso às camadas mais populares para a formação artística.
Na periferia há programas para ampliar o acesso à recursos e estrutura para a produção cultural local, um deles é o Cidadania Cultural. Também informou que está em discussão o retorno das Casas de Cultura para a gestão da secretaria, e que sua intenção é dar maior dinamismo à ocupação destes equipamentos de forma criativa com o que já é produzido pela cidade.
Outra iniciativa importante da Secretaria de Cultura, lançada algumas horas depois da entrevista, é o projeto Mapas Culturais/SP Cultura, uma plataforma colaborativa e georeferenciada para reunir informações sobre projetos culturais na cidade.
Com tanto a mostrar, então porque a administração do prefeito Fernando Haddad apresenta índices baixos de avaliação? A esta pergunta, Juca Ferreira referiu-se ao papel da mídia, que teme que o prefeito se firme como uma liderança na cidade e tenha projeção nacional, e também faz uma avaliação crítica da própria postura da gestão. “Acho que a gente errou na comunicação, a gente comunica muito pouco o que faz. É preciso reconstituir o diálogo com a população. É ilusão pensar que é suficiente sermos bons na gestão, nós temos que ter a capacidade de dialogar mais com a cidade. A transparência fortalece as políticas públicas que devem ser construídas com a participação social”.
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