Por Lia Ribeiro Dias, no Observatório do Direito à Comunicação:O orçamento de 2012 encaminhado ao Congresso Nacional contraria a promessa da presidente Dilma Rousseff, que disse ao ministro Paulo Bernardo que pretendia destinar à Telebras R$ 1 bilhão ao ano, nos próximos quatro anos. E é um golpe no Plano Nacional de Banda Larga (PNBL), em relação à oferta de infraestrutura de rede no atacado para aumentar a competição na ponta, com participação dos pequenos provedores.
Os R$ 1 bilhão imaginados foram reduzidos a R$ 353,3 milhões, distribuídos entre três projetos estratégicos: cabos submarinos, satélite geoestacionário e infraestrutura de banda larga (redes ópticas e acesso de rádio). O mais atingido pelo drástico corte de 65% foi justamente o PNBL. A justificativa técnica é que os cabos submarinos e o satélite precisam de garantia de recursos para serem iniciados, enquanto a infraestrutura de banda larga pode ser desenvolvida à medida em que os recursos contingenciados vão sendo liberados.
O certo é que a Telebras volta ao mesmo drama de quando o sistema de telecomunicações era estatal: contingenciamento e limite de investimentos. Os prejuízos ao desenvolvimento do setor certamente não têm, nem de longe, o impacto do passado, tendo em vista a importância e o peso dos investimentos privados no PNBL. Calcula-se que 30% a 40% dos investimentos programados pelas operadoras para este ano – ao redor de R$ 18 bilhões – serão aplicados em banda larga. E o mesmo ritmo deverá se manter nos próximos anos. As concessionárias locais têm compromisso de ofertar a banda larga de 1 Mbps a R$ 35 (com impostos) a todas as sedes de municípios, até 2014. E as celulares, não vinculadas a concessionárias locais, casos da TIM e da Claro, também aderiram ao plano.
O corte no orçamento da Telebras não prejudica o atendimento massivo à população na oferta da banda larga popular. Mas atrasa um elemento muito importante – a regulação do mercado no atacado –, que influi na redução dos preços dos links e na configuração do modelo do setor de telecomunicações. Esse modelo, apesar da intensa competição na telefonia móvel – e, em parte, na banda larga móvel –, é monopolista na telefonia fixa, na maioria dos municípios brasileiros, que são cidades pequenas e de baixa atratividade econômica ao investimento de novas operadoras.
Esse é exatamente o nicho de mercado onde os pequenos provedores podem fazer diferença, criando a competição que não existe na banda larga fixa e estimulando a melhoria da qualidade do serviço, com velocidades superiores, a preços mais acessíveis. Mas, para isso, precisam comprar links a preços que viabilizem seu negócio – e é aí que entra a Telebras.
Para a infraestrutura necessária ao PNBL – conectar todas as cidades com mais de 100 mil habitantes, na primeira fase, e com mais de 50 mil habitantes, na segunda –, a Telebras precisaria investir, de acordo com seu plano quadrienal (20112-2015), R$ 1,7 bilhão ao ano. Parte importante dos recursos viria do Orçamento da União, parte das empresas elétricas donas das fibras do backbone óptico (que, portanto, deverão vir a ser sócias do empreendimento), e parte viria da própria empresa, com a venda da capacidade de rede.
Bom projeto
O corte no orçamento, que pode atrasar o papel da Telebras no PNBL e na sua principal função, de regular o mercado de telecomunicações no atacado, remete a outro debate. A inviabilidade, por falta de recursos da União e não apenas de vontade política, de querer transformar a Telebras em operadora de última milha para oferecer banda larga de qualidade e a preços baixos, num contraponto aos serviços das operadoras privadas.
O governo federal acertou ao atribuir à Telebras, na sua reativação, o papel de se transformar em infraestrutura estratégica do país, com poder de regular o mercado de atacado, mas não de competir com as operadoras privadas na prestação do serviço ao usuário final. O papel estratégico da Telebras ficou mais claro na aprovação de seu plano quadrienal de investimentos, que envolve a construção de dois cabos submarinos internacionais – com participação da iniciativa privada – e do satélite geoestacionário (agora para atender prioritariamente a Amazônia, além das comunicações militares), um projeto que começou ainda no segundo governo FHC e até hoje literalmente não saiu do papel.
É pena que um projeto tão relevante já comece com limitações orçamentárias que podem comprometer o seu futuro. A expectativa é de que a Presidência da República entenda que não se constrói um plano de banda larga, como infraestrutura essencial para o desenvolvimento econômico do país e para a inclusão dos cidadãos brasileiros, apenas costurando ofertas populares com operadoras privadas. É preciso mais: garantia de aumento contínuo das velocidades oferecidas, o que demanda regulação do mercado, política diferenciada de conteúdos e serviços de governo e política de fomento à inovação. A Telebras é um ativo essencial para chegar a esses objetivos.
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