CRÍTICA: AVATAR / Feminismo e outras subversões na veia
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CRÍTICA: AVATAR / Feminismo e outras subversões na veia


Os espíritos puros da floresta acreditam num mundo melhor.

Todo mundo que leu minha cri-crítica do trailer (na realidade, era um teaser) sabe que eu não dava um tostão furado por Avatar. Fui ao cinema meio arrastada, sem vontade de assistir ao mega arrasa-quarteirão, só pra poder ver algum filme no final de semana. E me rendi completamente. Desde os cinco minutos iniciais, fiquei hipnotizada. Entrei sem querer naquele universo todo, mas entrei legal, como se estivesse num daqueles caixões do filme onde os personagens assumem seus avatares e não têm olhos pra mais nada. Amei. E vou lamentar sempre não ter visto essa joia em 3D, que deve ser sensacional.
Também é de se lamentar que James Cameron não filme com mais frequência. Foram doze anos desde que ele se declarou no topo do mundo ao levar o Oscar por Titanic. Neste meio tempo ele, que é canadense e estava no processo de se naturalizar americano, desistiu da cidadania após a reeleição do Bush, em 2004. E a sua ideologia pode ser vista em todos os seus filmes, que sempre têm grupos de idealistas lutando contra corporações gananciosas (Aliens, Exterminador do Futuro 1 e 2, O Segredo do Abismo). São grupos que pertencem ao sistema mas que se rebelam contra ele. Outro ponto em comum na obra de Cameron são as personagens femininas fortes, inclusive fisicamente. True Lies e sua estreia na direção, Piranhas 2, sejam talvez as duas únicas exceções. Não por coincidência, são também seu ponto baixo. Mas Titanic não esconde que os ricos são os vilões da história. E Avatar mais parece um panfleto contra a exploração. Não é que eu adorei o troço só porque ele defende tudo que eu defendo. Eu posso amar filmes que não têm nada a ver com a minha linha ideológica (Bastardos Inglórios, por exemplo; aliás, todos do Taranta). Mas sim, é muito mais prazeroso admirar uma obra que vai contra a corrente que uma que reforça o status quo.
O filme se passa 150 anos no futuro, num planeta chamado Pandora. Como a Terra é descrita como um planeta moribundo, os homens brancos que falam inglês americano vão sugar recursos de outros lugares. Pandora possui um mineral raro vendido por 20 milhões o quilo. O problema é que também tem gente que mora lá, os Na'vi, nativos grandões que vivem em harmonia com seu habitat. Pra poder explorá-los melhor, uma grande corporação manda cientistas para pesquisá-los e fuzileiros navais para coagi-los a "colaborar". Os cientistas, liderados pela chefa Sigourney Weaver, até são boa gente, e criam alguns avatares (que misturam características nativas com o DNA da pessoa que vai assumi-lo) para poder se infiltrar entre os Na'vi. O lindão Sam Worthington (que causou sensação com Exterminador do Futuro 4, mas eu vi primeiro num Macbeth australiano) é um fuzileiro paraplégico que aceita fazer o trabalho em troca de pernas novas. Sim, no futuro ninguém que tenha muito dinheiro será paraplégico. Acontece que Sam rapidamente gosta mais do seu avatar que da sua vidinha militar. Além do mais, ele se apaixona por uma Na'vi, interpretada por Zoe Saldana, a mesma que faz Uhura na nova geração de Star Trek. E aí começa um conflito de interesses: Sam serve a uma corporação que vai tirar de qualquer jeito o que os Na'vi têm, queiram eles ou não, mas ele sente-se mais alienígena que terráqueo ― o que não é incomum. Já vimos o herói branco se identificar mais com o “inimigo” e lutar ao lado dele em Lawrence da Arábia, Dança com Lobos, O Último Samurai etc. O chato é que ele é sempre o salvador da lavoura.
Mas Avatar complica um pouco a situação. Primeiro que, sozinho, Sam não é nada. Aliás, até que ponto ele é um homem branco, se seu avatar é o de um nativo? Ele passa por um intenso treinamento de três meses até se tornar um deles, e não quer voltar atrás. Segundo que não é bem ele que salva a pátria Na'vi. Não posso falar aqui quem ou o que é porque seria um spoiler. Você vai ter que ir ao cinema.
Avatar é o tipo de filme que os conservadores odeiam com todas as forças, feito por e para “liberais” (no sentido americano da palavra). Eu já assisti a uma palestra de um guru direitista (brasileiro) dizendo que a história que narra que os colonizadores exterminaram os índios é só mito, que no fundo os índios se mataram a si mesmos, e afinal, mesmo que algum selvagem tenha porventura morrido pelo bem de uma causa maior (a nossa!), quem estava aqui pra contar quantos índios morreram? Pode apostar que esses carinhas vão detestar Avatar. E sabe o pessoal que acha que aquecimento global é balela? Esses também. E aqueles que creem que os americanos fazem muito bem em empregar seu poder bélico para usurpar os recursos de outros povos (e lamentam que o Brasil não empregue os mesmos métodos com a Bolívia)? Mais uns que vão falar mal do filme. A boa notícia é que essas pessoas são da mesma patotinha. Não são grupos diferentes. Eles podem se dar as mãos e sair por aí cantando hinos de fuzileiros navais.
Dá pra interpretar Avatar como uma mensagem ludita, que ensina que o que é puro e harmonioso é o que é feito sem tecnologia, porque tecnologia equivale a armamentos pesados. Eu não preciso nem mencionar a ironia (e a hipocrisia) dessa mensagem vir de um filme que custou entre 300 milhões e meio bilhão de dólares, dependendo da fonte, e feito com efeitos de ponta por um dos cineastas mais tecnologicamente antenados de todos os tempos. Mas, francamente, tô me lixando pros efeitos especiais. É, eles são maravilhosos, claro. Mas já eram bárbaros em Exterminador do Futuro 2, e isso já tem quase vinte anos. Não sei se foram realmente melhorados de lá pra cá. Só sei que mentiram. Disseram (o James Cameron especialmente) que os efeitos gerados por computador barateariam o cinema. E aí o cara faz um filme caréssimo (não creio nem que vá se pagar).
E, se eu já n
ão tivesse adorado Avatar por vários motivos, ele ainda deve ser a aventura de ação mais feminista de todos os tempos. Não há apenas uma personagem feminina marcante, mas três. Quem lidera a equipe de cientistas é a Sigourney, durona e competente. O único piloto que se rebela e diz “Eu não vim aqui fazer isso” (cometer genocídio, suponho) é mulher (a Michelle Rodriguez, de Resident Evil). E Zoe, a heroína na'vi, é tudo que uma heroína pode ser. É ela que ensina ao herói tudo que ele sabe e, de quebra, ainda salva sua vida uma penca de vezes (e, quando ela vai à luta, faz aqueles barulhinhos que as mulheres árabes fazem com a língua. Mais um recadinho subversivo do Cameron). O único porém é que o guerreiro na'vi, quando pronto, logo depois de escolher o seu, hum, bichão voador (que será só dele a vida toda, e vice versa), também pode escolher sua mulher. Mas Sam quer que ela o escolha também. E, além disso, as duas “candidatas” sugeridas não são indicadas pela beleza, mas por serem boas caçadoras. Em nenhum momento menciona-se a aparência de Zoe. Seu momento “mulherzinha” é quando ela se pinta ― pra guerra! O herói certamente não se apaixona por ela pela beleza, mas por tudo que ela faz. Nisso também Avatar é subversivo: subverte os padrões de beleza. No começo, a gente acha os Na'vi (homens e mulheres) feiosos, desngonçados, “macacos azuis”, como os chamam os militares. Mas depois de um tempinho já os consideramos lindos e felinos. Não que isso importe. Nenhuma mulher do filme se preocupa com roupa ou maquiagem. Em nenhum momento alguma delas é avaliada pela aparência. Nenhuma mulher é julgada bonita... ou feia. Elas são julgadas por outras qualidades: inteligência, liderança, bravura. Coisa de homem, sabe?
Sem falar que há várias menções a “mamas” como algo bom, da natureza, e a “papas”, como algo bélico (o maior vilão, o coronel Stephen Lang, refere-se a ele mesmo como papa), que vira um conflito entre the mamas and the papas. E as mamas ganham! Isso fica explícito numa cena em que Zoe nina Sam (não seu avatar, mas o terráqueo): ela é grande, ele pequeno, como se ela fosse sua mãe. Olha, o roteiro é tão feminista que até deus é uma figura feminina.
Avatar me fisgou, e pra mim está fácil entre os melhores do ano. E aí, é preferível um filme anti-imperialista ou um pró-imperialista, como Guerra nas Estrelas? Fábula por fábula, eu fico com a fantasia de um mundo melhor.
Homofobia em Avatar? Leia aqui.




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