DANÇA COM AVATAR
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DANÇA COM AVATAR


Dança e Avatar, dois filmes que rasgam a bandeira americana.

Comprei o dvd de Dança com Lobos faz um tempão. Era daqueles que vinham com uma revista e deve ter custado R$ 9,90. Mas estava fechado, nunca o abri. Eu só havia visto o filme de 1990 uma vez, quase vinte anos atrás, e nem foi no cinema. Este é um dos filmes que lembro bem de ter visto na casa do maridão, quando ele era apenas meu namoradinho e morava em Osasco. Lembro porque chorei muito, muito (o outro que lembro bem foi O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante. Acho que naquela época eu era mais aventureira com o cinema). Bom, decidi rever Dança por conta das comparações que andam fazendo entre o vencedor de sete Oscars e Avatar (vencedor do Globo de Ouro e favorito ao Oscar 2010). E, sinceramente, acho essas comparações um tanto forçadas.
Dança tem seu próprio ritmo, e é um ritmo, digamos, poético (que alguns preferem chamar de lento e arrastado). Você consegue imaginar Avatar com uma carroça sendo vagarosamente puxada por mulas com um por de sol por trás? Ok, esqueça a carroça. Mas um Na'vi voando num daqueles bichos alados com longas cenas de por de sol, tudo bem devagarinho? Dança tá cheio de cenas assim. Sem nunca ser chato.
Dança começa com John Dunbar, um soldado na Guerra da Secessão em 1865, prestes a perder sua perna gangrenada. É uma cena terrível: enquanto passam os créditos, a gente vê o Kevin Costner colocando a bota sangrenta de volta na sua perna, para poder sair dali (como Jake Sully fica paralítico em Avatar? Eles contam?). Tudo que ele vê são homens desesperados, sem esperança, perdidos, que não têm a menor ideia de por que estão lutando. John pega um cavalo e cavalga pro lado inimigo. Todos atiram nele, ninguém acerta. Ele abre os braços, pronto para o suicídio (eu sempre fico pensando: o que o pobre cavalinho tem a ver com isso? Até parece que ele quer estar lá!). Mas seus aliados atacam os soldados distraídos, e John se salva, salva a perna, e é promovido a tenente. Ele pode escolher o posto que quiser... e escolhe um lugar bem no oeste, na última fronteira. E aí começa um dos grandes faroestes americanos, o melhor dos anos 90 junto com Imperdoáveis.
O personagem de John Dunbar é fascinante por ser um carinha curioso e observador. Ele mantem um diário e, quando vê um índio pela primeira vez, escreve “O homem tinha uma aparência fabulosa”. E é compreensível que ele diga isso do Graham Greene, que rouba todas as cenas. Quando John vê um lobo nas redondezas do seu “posto”, seu primeiro instinto é atirar nele. Mas aí abaixa a arma e, pouco a pouco, vai criando amizade com o lobinho. John não é um herói. Até a primeira metade do filme, ele cai por qualquer motivo, não sabe pelo que está aguardando, não tem a menor ideia do que espera da vida. Só sabe que gostou daquele lugar. E que quer tentar fazer contato com os Sioux.
A primeira cena em que eu chorei muito é uma que até pode ser cômica, mas eu não quis nem saber. John começa a receber a visita de índios. A comunicação é péssima, pois ele não fala uma palavra de Sioux e os índios, nem uma palavra de inglês. O primeiro vocábulo que ambos aprendem é búfalo, tatanka (eu adoro o som da palavra e passei a chamar o maridão de tatankudo). É emblemático que a primeira palavra seja logo pra descrever algo em extinção. Os índios aparecem mais vezes, ele lhes dá açúcar e café, eles trazem uma pele de búfalo. E, desde o começo, ficam uns cinco índios pra trás, montados em seus cavalos, observando a conversa frustrada de longe. E John sempre faz um sinal de “Olá” pra eles. Até que, numa das visitas mais adiante, ele faz seu sinal de “Olá”, e um índio faz o sinal de volta. Os outros índios olham pra ele com cara de “what the duck?”, sabe? Mas eu achei comovente.
Se não fosse uma mulher branca que teve sua família massacrada por índios quando era criança e cresceu com eles, a comunicação entre John e os índios nunca avançaria. Mas ela serve de intérprete e de professora. Ela é viúva. Depois de algum tempo se apaixona por John (e o Kevin tá bonitão em Dança. Por que o pessoal o odeia tanto? É por causa da Madonna? Lembro de Na Cama com Madonna, em que ela cruza com o Kevin e, assim que lhe dá as costas, faz um gesto que está vomitando. Nunca entendi essa agressão gratuita. Mas até parece que Madonna é um modelo de comportamento naquele documentário).
Um monte de coisa acontece, e o clímax da choradeira é sem dúvida quando soldados malvados matam o lobinho do John. Acho impossível alguém não chorar nesse momento. É como se fosse o assassinato da mãe do Bambi pra nossa geração. Só sei que o maridão intuiu que a cena tava chegando e foi embora, porque sabia que não iria resistir (e não pensem que eu gosto de ficar com a visão turva pelas próximas cinco horas). Eu fico pensando como os facínoras que gostam de caçar reagem à essa cena.
Mas, tirando a mensagem altamente ecológica de Dança, e o fato de um homem branco querer tornar-se um nativo, não vejo tantas conexões com Avatar. John Dunbar não é herói. Ele até ajuda a defender os Sioux de uma outra tribo que os atacam, e fala pra eles sobre uma trilha de búfalos, mas são os índios que precisam salvá-lo dos homens brancos. Ele definitivamente não salva ninguém: treze anos depois do final da história, sem terra e sem búfalos, os índios se renderam aos brancos. Já não tinham como sobreviver. E a transformação de John em índio é lenta e gradual. Leva quase o filme inteiro, e não é que ele aprende a caçar ou a usar arco e flexa. Ele não vira um guerreiro, vira um índio pacífico, que abandona o inglês e seus costumes de homem branco. É diferente de Avatar, em que Jake só consegue entrar naquele mundo com seu avatar de homem azul de 3 metros de altura. E é uma fêmea que o salva (em Dança é o contrário, ele é que salva uma mulher).
A mulher que faz par romântico com o protagonista em Dança não lhe ensina nada além da língua. Bom, esse é um item de primeira necessidade no filme, mas compare com tudo que a guerreira Na'vi ensina pro Jake em Avatar: não só a língua, mas, bem, tudo. Dança não tem absolutamente nada de feminista. Mostra o mundo bem patriarcal dos Sioux, em que só homens participam dos conselhos pra determinar o destino da tribo, e onde “mulheres e crianças” aparecem sempre na mesma frase.
Tanto Avatar quanto Dança são belos filmes, sem dúvida. Ambos são filmes de esquerda feitos por liberais americanos, e ambos contem uma grande dose de white guilt (a culpa do homem branco por cometer as barbaridades que comete). Mas enquanto um é uma fantasia futurista em que os nativos vencem, o outro é um faroeste épico em que os nativos nunca tiveram chance. Com ou sem um homem branco pra ajudá-los.




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