CRÍTICA: GÂNGSTER / O segundo melhor filme de gângster de 2007
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CRÍTICA: GÂNGSTER / O segundo melhor filme de gângster de 2007


Desta vez eu concordo com a quase unanimidade dos críticos. O consenso é que “O Gângster” é legal, bom de ver, com atores magníficos e tal, mas não é um grande filme nem que a vaca tussa. Ele conta a história “baseada em fatos reais”, e põe aspas nisso, de um mafioso negro que, na década de 70, consegue vender heroína baratinha nas ruas de Nova York, agitando a concorrência e chamando a atenção de quem devia ser o único policial honesto da cidade. E, se tudo isso já não fosse suficientemente atraente, quem faz o gângster é o lindo e maravilhoso Denzel Washington, e o tira, o Russell Crowe, sob a direção do Ridley Scott, que deve ser o único que adora trabalhar com o Russell (“Gladiador”, “Um Bom Ano”).

Tudo que eu (e a maior parte do mundo) sei sobre gângsters eu aprendi no cinema. Ou seja, depois de tanto tempo, pensava que soubesse tudo sobre máfia, mas “Gângster” é diferente. Primeiro que o manda-chuva da vez é negro, e isso é novidade. Nos “Poderosos Chefões” da vida há várias menções sobre como as ruas são tomadas por traficantes negros (e cada “famiglia” é preconceituosa). Mas o que eu realmente não sabia é que o exército americano ajudou a popularizar a heroína nos EUA. Foi no final dos anos 60 que o consumo de drogas pesadas explodiu. Pra mim foi uma surpresa descobrir não apenas que um terço dos soldados ianques usava heroína, mas que aviões militares eram usados pra transportar a droga do Vietnã a NY.

Com a corrupção no exército e na polícia, o traficante fica menos mal na foto. Mas é o fim que a polícia seja tão desonesta. O personagem mais detestável do filme, sem sombra de dúvida, não é o detetive adúltero, o gângster durão, ou o carinha que atira numa moça pelas costas – não, isso tudo é fichinha perto do detetive-bandidão feito pelo Josh Brolin (que ano pro Josh! Ele tá perfeito em “Onde os Fracos Não Têm Vez”, mostra sua versatilidade no “Planet Terror”, a parte ruinzinha de “Grindhouse”, é a melhor coisa de “Gângster”, e de quebra é casado com a Diane Lane). Ladrão que rouba ladrão não tem cem anos de perdão. Ainda mais se o cara atira em cachorros e esbofeteia mulheres.

O protagonista de “Gângster” deveria ser o personagem-título, mas o detetive do Russell tem tanto espaço quanto ele. Isso pode ser um erro. Poucos iriam ao cinema pra ver um tira honesto. Mas, do jeito que o roteiro tá escrito, como o gângster é um enigma, ficar com o detetive talvez não seja tão ruim. E quer saber? É provável que não seja só por causa do roteiro que os personagens tenham igual importância. Pode ser pelo ego dos atores também. Ou será que o Russell, a essa altura da carreira, e com a fama de insuportável que tem, aceitaria ser coadjuvante do Denzel? Sem falar que o mafioso talvez seja menos monstruoso por ser interpretado pelo Denzel, que leva a sério sua reputação de bom moço. Compare o gângster dele com o detetive que fez em “Um Dia de Treinamento”, que lhe deu o Oscar. Em “Dia” ele era vilão. Aqui seu chefão é um homem de família, religioso e na sua, menos quando liquida um rival. O filme dá a entender que ele continuaria assim, discreto e oculto, sem que a polícia o notasse, se sua linda esposa porto-riquenha não tivesse lhe dado um casaco de pele que deve ter custado a vida de centenas de pobres chinchilas. É só o cara se vestir como um rapper pra toda a polícia cair em cima dele. É o que eu sempre digo: não use casaco de pele.

Acho, não tenho certeza, que o Cuba Gooding Jr. tá em “Gângster”, mas não dá pra entender direito o que ele representa. Todos os personagens coadjuvantes, tirando o do Josh, estão genéricos e desperdiçados. Num longa de duas horas e quarenta minutos, não dá pra alegar falta de tempo. E o que dizer dos personagens femininos? Todos mal-desenvolvidos. Por exemplo, a mulher do Denzel é boazinha demais. Não queria que ela fosse uma Michelle Pfeiffer em “Scarface”, mas nem um pouquinho mais de personalidade? Tipo, por que ela se casa com o gângster? Não fica claro se é pelo dinheiro. Tudo bem, eu também me casaria com o Denzel num piscar de olhos, mesmo que ele traficasse heroína. Aliás, na terceira cena de pessoas se injetando, com todos os detalhes de sangue saindo pelo braço, eu já queria deixar a sessão. Pra quê tanto? Eu entendi o que os viciados fazem. Até compreendo que o Ridley volta e meia coloque gente morrendo de overdose pra mostrar os efeitos do que o Denzel vende, mas chega de injeção na veia, please.

Outros pontinhos que não tenho a menor idéia onde incluir: uma hora tem uma montagem com uma canção que já foi usada em “Jackie Brown”, e isso distrái. Tá, sei que é complicado não poder botar todas as canções bacanas só porque o Taranta já as usou, mas deve haver outras, não? E talvez “Gângster” fosse superior se ilustrasse um confronto como “Fogo Contra Fogo” (no qual os dois astros, Al Pacino e Robert De Niro, só se encontram no final), mas é difícil, porque os dois protagonistas desconhecem a existência alheia até perto do fim. Quanto à veracidade da história, desconfio que o filme infle a importância do mafioso que o Denzel interpreta. Isso é feito eliminando a concorrência. Não eliminando no sentido “Chefão”, mas no sentido de deixar longe da tela.

Isso tudo só pra chegar à conclusão de que o título de melhor filme de gângster de 2007, sinto muito, pertence a “Senhores do Crime”. E não só o de melhor filme de gângster. Melhor filme, ponto.

P.S.: “Blade Runner, O Caçador de Andróides” foi relançado nos cinemas dos EUA no final do ano passado no que dizem ser a versão definitiva. Às vezes, com tanta coisa ruim que o Ridley Scott fez (“Hannibal”, “Até o Limite da Honra”, “Falcão Negro em Perigo”), é difícil se lembrar que ele é o autor de um dos grandes filmes dos anos 80, sempre na lista dos top cinco. Eu trabalhei numa locadora quando era jovem e a maior parte do acervo era pirata. Não passava um dia sem que algum cliente entrasse e perguntasse: “Tem Blade Runner?”. Agora acabou de ser lançado nos EUA um estojo de DVDs com cinco versões do filme. Sim, eu disse cinco. Ganha um doce quem descobrir a diferença entre a versão do diretor (de 1992) e essa última, a versão final. Deve ser brincadeira – um jogo dos sete erros, talvez.





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