Tá, mas é só mencionar essa palavrinha, cartola, pra gente constatar como mágica é uma arte ligada ao passado. Por isso é deveras estranho que Hollywood produza dois filmes sobre o assunto no mesmo ano, este “Truque” e “O Ilusionista”, que ainda não estreou aqui, e desde já duvido que seja melhor. Ambos tratam de mágicos no final do século retrasado. (Infelizmente “O Ilusionista” recebeu o mesmo nome de uma comédia holandesa sem diálogos dos anos 80. Nem me lembro do troço, embora a capa do vídeo com um carinha andando de bicicleta tenha sido meio traumática pra mim).
Bom, eu gosto de ir ao cinema sem saber nada sobre o que vou assistir, e sugiro que você faça igual. Tinha visto o trailer de “Truque” uma vez só, então nem me recordava que era do Nolan, com o Hugh Jackman. Olhei pra ele e nem pensei no Wolverine. O Christian Bale, lógico, não dá pra deixar passar batido desde “Psicopata Americano”. Os dois estão excelentes como mágicos rivais, e isso é tudo que você vai ouvir de mim sobre a história. O Michael Caine, digno como sempre, mas ele empresta dignidade até a “Miss Simpatia” e “Tubarão IV”, faz o tutor de um deles. Agora, quem me chamou a atenção mesmo foi o David Bowie, de cabelo preto e bigode. Eu não iria acertar em quarenta chutes! Há também três atrizes loiras e bonitinhas que mais ou menos se confundem entre si. A Scarlett Johansson é a dos lábios mais carnudos.
Fora uma parte no meio em que alguém seqüestra o assistente do outro e o enterra (não sei se faltou algum fotograma ou se tava confuso mesmo), e tirando algumas reviravoltas a mais, “Truque”, no geral, é ótimo. Envolveu o público, que tava quase tão eletrizado quanto uma cerca elétrica que aparece e faz o Hugh não parecer muito inteligente. Por exemplo, ouvi um cochicho quando surge o sósia do Hugh. Todo mundo queria saber se era ele mesmo ou um ator igualzinho. “Truque” é o tipo de filme cheio de ação, mas os tiros e explosões têm razão de ser. Posso desde já dizer que prefiro este “Truque” despretensioso a qualquer coisa que o Eastwood arme em “A Conquista da Honra”. Adivinha qual será indicado ao Oscar? Honra contra truque, e o pessoal da Academia nem pisca.
Isso de achar que qualquer honra é superior à trucagem é um erro, ainda mais quando se fala de cinema. Mágicos enganam as pessoas. Essa é a arte deles, iludi-las para que elas acreditem que viram algo que não viram, ou atrair a atenção delas pra uma outra coisa enquanto o truque principal acontece lá bem diante dos olhos. Cinema é igual, ué. Ouso dizer que o cinema surgiu basicamente na mesma época em que a mágica entrou em declínio, perdeu sua aura. Uma magia substituiu a outra, mas o que está por trás das duas é a enganação. E não é “enganar” no mau sentido. A gente paga pra ser iludida. Quando a edição despreza um personagem pra que ele apareça bem pouquinho, quando a câmera enfoca algo não tão relevante, tudo isso é enganação. Há inúmeros truques em “O Grande Truque”, e dá a maior vontade de ver o filme de novo só pra acompanhar o passo a passo da trucagem. Cá pra mim, nunca me preocupei muito em saber como uma mágica é feita. Claro que tenho curiosidade, mas aceito ser iludida. O mesmo com o cinema: eu sei que não é real, e não me importo. Mas que negócio é esse de matar pombas durante uma mágica? Que horror!