Mas então, agora que viramos especialistas em transponder, caixa-preta, altitude e rotas aéreas, observar o funcionamento de salas de controle de vôo ficou mais relevante. Ainda assim, algumas cenas no começo de “Vôo” são meio chatinhas, longas demais. Só quando os controladores descobrem que há aviões seqüestrados é que a gente nota o nervosismo. Mas o filme do britânico Paul Greengrass (do ótimo “A Supremacia Bourne”) não perde tempo apresentando personagens. Ao contrário do cinema-catástrofe, em que conhecemos um pouquinho da vida de cada vítima, aqui a gente vê os terroristas rezando, um piloto conversando com outro sobre sua filhinha, a aeromoça dizendo que sente falta de seus bebês, e é só. A tragédia pessoal pesa menos que a coletiva, e isso confere certa sobriedade à história. Pelo menos “Vôo” não transforma os terroristas em vilões sanguinários, ou passageiros e tripulação em heróis automáticos. Tem muito pouco de “Vamos derrubar o avião pra não demolir um prédio público”. O pessoal ataca os terroristas na vã tentativa de se salvar mesmo. Bom, tá certo que, num dos pôsteres, o avião se dirige rumo aos céus, mas essa deve ser a versão local, pro público interno.
Não sei se foi porque o cinema trocou os rolos e vi toda uma seqüência em ordem inversa, mas achei anti-climático quando os terroristas invadem a cabine. Nunca pensei que seria tão fácil render dois pilotos. Por causa disso, hoje em dia não podemos mais viajar com tesourinha de unha, e os talheres são de plástico. Mas o maridão lembra que, querendo, dá pra matar alguém usando as hastes dos óculos, como ficou provado em “O Poderoso Chefão”. E existe em “Vôo” algo universal, pelo menos universal entre a classe média, bem familiarizada com vôos aéreos e celulares. Se você sabe que seu avião vai cair, o que diz pros seus entes queridos? Todos dizem eu te amo.
Pro filme não resta dúvida que o avião caiu—não que ele foi derrubado, seja pelos passageiros, seja pelos militares. Aliás, muito menos pelos militares. Isso contradiz o que muitos ainda acreditam, que o exército teria atirado contra o avião.
Mas a apresentação dessa tese é menos propagandista do que se pode imaginar. Por exemplo, uma legenda no final explica que os militares só souberam que o avião tinha caído minutos depois, ou seja, eles não podiam tê-lo derrubado. Mas notou a falha? Não é que o exército não quis, é que foi tão incompetente que nem sabia onde o avião estava. Como também desconhecia o mandatário do presidente, e só ele podia autorizar a derrubada de aviões. Será que ele ainda estava ouvindo historinhas infantis na escola, como mostrou o Michael Moore? Lembrei no ato de “Todo Mundo em Pânico 4”: um assessor informa o presidente sobre os ataques, mas o mandatário-mor da nação não quer deixar a escolinha antes de saber o que acontece com o pato.
De repente pareceu mais interessante ver um filme sobre o que aconteceu dentro dos aviões que se chocaram contra o World Trade Center. Mas enquanto os críticos americanos discutem se “Vôo” foi feito cedo demais, apenas cinco anos após os ataques, e os EUA proíbem que o ator iraquiano que faz um dos muçulmanos entre no país para prestigiar a première, eu me concentrei mais na melhor frase do drama. É quando o diretor de controle de vôo, responsável por fechar o tráfego aéreo nos EUA naquele dia fatídico, justifica: “Estamos em guerra com alguém”. So what else is new (qual a novidade)?