Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:Manchete na Folha de S. Paulo e destaque nas primeiras páginas do Globo e do Estado de S. Paulo nas edições de sexta-feira (31/1), o nível de desemprego caiu para 5,4% na média anual em 2013. Em dezembro, o número de desempregados foi de 4,3% do total de pessoas que buscam uma colocação no mercado de trabalho.
Trata-se do melhor desempenho em onze anos, mas os jornais tratam de minimizar o efeito positivo desse indicador, com a informação de que a renda do trabalho cresceu com menos vigor no ano passado.
Especialistas ainda se empenham em uma discussão sobre a hipótese de o Brasil ter alcançado a situação de pleno emprego, após a divulgação de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado em outubro do ano passado, mas esse aspecto da realidade brasileira perde complexidade quando chega à imprensa.
A rigor, trata-se de uma tarefa que o jornalismo dificilmente poderá cumprir, não apenas porque a economia brasileira se caracteriza por intensa mobilidade, mas principalmente porque a imprensa, como entidade corporativa, rejeita o modelo voltado para o fortalecimento do mercado interno e repudia a ação do Estado no sentido de uma economia com interesse social.
No estudo do Ipea ficou claro que, ao contrário do que vinha sendo divulgado, o Brasil não sofre um “apagão” de mão de obra qualificada. Na verdade, há carência de trabalhadores em atividades como agricultura, construção civil e trabalho doméstico, que formam a base da chamada pirâmide educacional. Esses e outros setores podem ser afetados por eventos sazonais, como o aumento da demanda por funcionários em regiões turísticas durante o verão, que tanto pode estimular a busca de empregos temporários como produzir o abandono do emprego pela oportunidade de ganhar mais com atividades informais de curto prazo. Ainda assim, a formalização do mercado de trabalho continuou aumentando em 2013, como acontece ininterruptamente desde 2003.
Esses elementos dificultam a construção de teorias sólidas num campo do conhecimento tão volátil, inconsistente e ideologicamente comprometido como o da imprensa.
A renda do trabalhoA conjunção adversativa agregada aos títulos de todos os principais jornais na sexta-feira se refere ao ritmo de aumento da renda do trabalho. Praticamente todas as análises selecionadas pelos editores afirmam que os salários continuaram crescendo em 2013, mas em ritmo menor do que em anos anteriores.
Esse é o aspecto que cabe destacar aqui: os jornais não conseguem ou não querem, em nenhuma hipótese, apresentar uma boa notícia sem agregar um elemento negativo, ainda que para isso seja necessário dar uma forçadinha nos fatos.
Ora, certamente o ritmo de aumento da renda média do trabalho desacelerou em 2013. Os números dos anos anteriores, principalmente os de 2012, vinham registrando uma situação absolutamente insustentável, no sentido positivo: em 2012, por exemplo, a renda média por pessoa em idade ativa aumentou 6,5%, muito acima do crescimento do Produto Interno Bruto e quase dois pontos porcentuais acima da inflação. Objetivamente, não houve redução da renda média, mas uma acomodação a patamares mais realistas, dadas as circunstâncias gerais da economia.
Para poder oferecer um retrato mais fiel da realidade aos seus leitores, os jornais precisariam levar em conta outros elementos, como a menor participação da indústria na composição das ofertas de emprego, o maior número de jovens que preferem apenas estudar, e o aumento real da renda familiar. Também devem ser incluídos nesse quadro a queda na inadimplência e a desaceleração da inflação no final do período observado.
O que pode ser realmente um tema preocupante passa longe dos textos jornalísticos sobre o assunto: o território nebuloso que se cria entre a ação do Estado e a dinâmica do mercado, que pode ser afetada pelo pessimismo da mídia tradicional. Assim, se o Estado estimula a formalização do emprego pela combinação das políticas de benefícios com mais fiscalização, o próprio mercado produz a informalidade, com surtos de oportunidades mais tentadoras em atividades informais – tendência que pode se manifestar ainda mais com eventos como a Copa do Mundo.
Mas essa complexidade não cabe nos jornais.
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