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Por Tereza Cruvinel, em seu blog:Na segunda-feira o governo tinha uma avaliação realista: se não fechasse um acordo com o PMDB, os vetos de Dilma cairiam no Congresso e isso alargaria o caminho para o impeachment. A cúpula do partido esnobou os convites de Dilma para negociar a reforma ministerial mas o acordo fechado com a bancada da Câmara mostrou a emergência de outro cacique, o líder Leonardo Picciani. A bancada aprovou a permanência do governo por 42 votos a nove e na noite de ontem (3ª. feira, 22/09) garantiu a manutenção de 24 dos 32 vetos que estavam em pauta. Foi uma primeira vitória, que não autoriza o governo a relaxar nem cantar vitória mas ela sugere que o governo ainda tem condições de rearticular sua base para barrar o processo de impeachment.
A apreciação dos vetos era tida como uma bomba atômica por seu potencial fiscal demolidor (R$ 127 bilhões na soma de novas despesas com renúncias fiscais) e pela forte sinalização política que decorreria de uma derrota do governo, a de que o campo estava aberto para a tentativa de impeachment. O mercado já fez a leitura correta do que se passou na madrugada desta quarta-feira. O que move o dólar e a bolsa na manhã desta quarta-feira são problemas com a China, não com a política ou a economia brasileiras.
Dilma e o governo trabalharam intensamente nas últimas horas para obter a aliança com a bancada da Câmara. Trabalhando para evitar a votação dos vetos, o governo só pagou para ver depois que se acertou com os peemedebistas liderados por Picciani. Na segunda-feira o vice-presidente recusou-se a discutir indicações do PMDB para a recomposição do ministério reduzido em dez pastas. E olhe que há meses o partido vem sugerindo isso, tendo até apresentado proposta até emenda constitucional neste sentido. Renan Calheiros também se recusou, alegando que o presidente do Senado deve abster-se de tais negociações. O principal auxiliar de Temer, ministro Eliseu Padilha, endossou a recusa.
Com a recusa dos caciques, restava a negociação direta com a bancada da Câmara. Dilma já havia se aproximado do líder Leonardo Picciani com a ajuda do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, com quem ela sempre teve uma boa relação. Lançado o novo pacote do ajuste fiscal, Pezão passou a articular-se com outros governadores para que a CPMF seja aprovada, garantida uma fração do imposto para os estados. Picciani, que chegou à liderança da bancada numa aliança com o antecessor no cargo, o hoje presidente da Câmara Eduardo Cunha, há algumas semanas tem linha direta com Dilma. Vem se afastando de Cunha sem confrontá-lo mas afirmando-se cada vez mais como um novo cacique no jogo interno do PMDB. Na retarguarda, ele conta com a influência de seu pai, deputado estadual Jorge Picciani, dentro do PMDB do estado do Rio de Janeiro, o mais forte do pais.
Um político vira cacique quando derrota outros caciques. Foi o que Picciani fez esta semana ao garantir a decisão da bancada, de manter-se no governo Dilma e de apoiar a manutenção dos vetos, por 42 votos a 9. Em decorrência, a bancada indicará os ministros da Saúde e da Infraestrutura, conforme já anunciado.
Seja quais forem os ministros, o “PMDB da Câmara” contará com dois instrumentos poderosos para fazer políticas públicas e se cacifar para a disputa de 2018, quando pretende ter candidato próprio à presidência da República. Os que ficaram contra estarão excluídos? Nem por isso. Entender o PMDB não é tarefa para iniciantes. Os que se recusaram a indicar nomes podem ter discutido as indicações por debaixo do pano, evitando se comprometer com o governo. Mas Picciani colocou a cara e o nome no acordo, e ontem mesmo começou a honrá-lo, na votação dos vetos.
Com os votos do PMDB, e se não cometer erros com outros aliados, como PR, PP e PSD, o governo estará armado para evitar que a oposição consiga 2/3 dos votos (342) para aprovar a abertura de processo de impeachment contra Dilma. Talvez não consiga evitar que a oposição aprove o recurso ao plenário para que tal pedido de abertura de processo seja submetido à deliberação. Para isso, a oposição precisará apenas da maioria simples (metade mais um) dos presentes. Qualquer descuido do governo poderá ensejar uma derrota nesta votação que precederá a decisiva, a que exige os 2/3 de votos.
Mas mesmo nesta questão do impeachment deve-se observar uma inflexão na conduta do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que nas ultimas semanas já ouviu apelos até de Lula para que socorra o governo com seu poder sobre a matéria. Ele deve anunciar hoje os ritos para a tramitação dos pedidos de impeachment. Eles preverão que, se o presidente mandar arquivar os pedidos de impeachment (o que Cunha sempre deixou claro que fará, alegando que se referem a fatos do mandato anterior de Dilma), qualquer partido ou deputado terá cinco sessões de prazo para recorrer ao plenário. Mas, dirá o roteiro ritual, o presidente não terá prazo para marcar a votação de tal recurso. Ou seja, poderá sentar em cima por quanto tempo quiser.
Isso é muito importante para o governo. Quando mais Cunha demorar-se a colocar o recurso em votação, mais tempo terá o Planalto para recompor sua base e consolidar a maioria perdida no curso da crise para enfrentar a votação do recurso, bem como para enfrentar as votações, não menos importantes, de matérias do ajuste fiscal.
Depois de ter visto a situação chegar ao limite, Dilma poderá relaxar um pouco amanhã no avião presidencial que a levará a Nova York, onde deve falar duas vezes na tribuna da ONU, encontrar o Papa e vários outros chefes de Estado. Depois, é claro, a luta continua, e para sair do sufoco e debelar a tentativa de impeachment, ela e os seus ainda terão que trabalhar bastante.
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