Em defesa da chatice
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Em defesa da chatice


JOÃO PEREIRA COUTINHO, Folha de SP

A SUÍÇA é chata. Diz a sabedoria popular. E acrescenta, com horror: um país que só produz relógios e chocolates não pode ser excitante.
Podemos sempre replicar: depende dos relógios e depende dos chocolates. Sem falar dos queijos. Já provou, leitor?
Mas não contesto. Chata, sim, chatíssima, sobretudo se a compararmos com lugares mais animados -a Somália, por exemplo.
Talvez por isso eu goste tanto dela. É um princípio pessoal: só viveria em países onde ninguém se intromete na vida de ninguém. Esse vício tem nome: liberdade. E muitos procuraram liberdade na chatíssima Suíça, lugar de exílio, labor e inspiração para incontáveis fantasmas.
Jorge Luis Borges morreu há 25 anos nesta mesma cidade de Genebra, onde estou. Ignazio Silone passou por cá. Charles Chaplin também viveu por estas bandas.
O norte da Europa, globalmente considerado, sempre foi isso: a última paragem dos renegados. Enquanto o sul perseguia ou queimava judeus, heréticos vários, livres pensadores políticos, o norte recebia-os. E tolerava-os. Sem os condenar.
Por isso que acompanhei com interesse o julgamento do parlamentar holandês Geert Wilders, aqui ao lado, em Amsterdã. Não por causa de Wilders, personagem que me é indiferente e um pouco repulsivo.
O que me interessava saber era se, em 2011, o norte da Europa continuava a ser esse espaço bem chato de liberdade e tolerância, onde é possível dizer as maiores barbaridades sem sentir o chicote da censura. Questão pessoal: eu posso um dia precisar desse espaço.
Mas relembremos o filme: Geert Wilders não é figura "consensual", como se diz. "Populista", "provocador", "fascista", "boçal" -os adjetivos e polêmicas abundam.
Tudo porque Wilders, em filmes ou discursos, gosta de descer o pau no Islã.
Diz ele: "O Islã é uma religião de violência e guerra". Diz mais: "O Alcorão é comparável ao "Mein Kampf", a autobiografia programática de Hitler e do nazismo". Diz ainda: "A Europa deve proteger o seu espaço público, evitando a "islamização" que é imposta por uma imigração muçulmana sem controle".
Pergunta sacramental: Geert Wilders tem razão no que diz?
Responder a essa questão é começar pelo lado errado.
Sim, aqui entre nós, que ninguém nos ouça, é possível desmontar cada um dos argumentos radicais do homem.
Reduzir a religião islâmica a sua dimensão bélica é um erro grosseiro e tão fundamentalista como as leituras fundamentalistas dos mais fundamentalistas. Comparar o Alcorão ao "Mein Kampf" é não entender a natureza histórica, filosófica e rácica do nazismo.
E, sobre os perigos da imigração muçulmana, não é possível misturar a vasta maioria de muçulmanos que procura na Europa um porto de abrigo com as franjas mais perigosas e radicais -que existem e persistem, e que são um perigo verdadeiro para o Ocidente.
Mas tudo isso é secundário. Porque o problema principal é saber se Geert Wilders tem o direito de expressar opiniões fortes, desagradáveis e até equivocadas.
Aliás, não apenas a Wilders; a dúvida é extensível a todos aqueles que, antes dele e seguramente depois dele, navegaram e continuarão a navegar as mesmas águas: as águas da blasfêmia e da heresia.
O tribunal de Amsterdã não teve dúvidas: as palavras de Wilders podem ser fortes. Mas uma sociedade que não tolera palavras fortes será uma comunidade de cidadãos fracos: de gente que acabará por impor uma mordaça mental, em nome de sensibilidades particulares políticas, religiosas, morais.
A absolvição de Geert Wilders não é apenas uma vitória para ele ou para a "liberdade de expressão".
É uma vitória para a Europa ou para uma certa Europa que, depois de guerras longas motivadas por diferentes concepções religiosas, entendeu que a única forma de garantir um "modo de vida" comum passava por não perseguir as diferentes "paixões" em confronto.
Wilders não gosta do Islã. Muitos muçulmanos não gostam de Wilders. Não é grave. Grave seria se o impasse só pudesse ser quebrado pela morte de uma das partes.
Chamem-me antiquado, mas eu prefiro a chatice do impasse a qualquer excitação sanguinária.




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