ESTUPRO, PROBLEMA COLETIVO. NA ÍNDIA E AQUI
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ESTUPRO, PROBLEMA COLETIVO. NA ÍNDIA E AQUI


Aconteceu na segunda-feira retrasada na cidade de Guwahati, no estado de Assam, na Índia. Uma estudante procurava um carro com uma amiga numa rua movimentada à noite. Elas tinham ido a uma festa num bar. De repente, uma multidão de cerca de 20 a 40 homens (depende da fonte) ataca as jovens. A amiga consegue fugir (veja vídeo com reportagem de 3 minutos).
Durante meia hora de terror, a estudante é espancada, despida, e abusada sexualmente (o que, pela lei brasileira, desde 2009 já configura estupro). Ela grita, pede ajuda, e ninguém faz nada. Dois repórteres da TV local filmam a cena, o que leva à polêmica de por que ficam só filmando, sem tentar ajudar a menina. A polícia demora pra intervir (é meia hora de violência), mas, se não tivesse intervido, a jovem teria sido estuprada. Um dos repórteres descreve: parecia um gang rape.
Por incrível que pareça, quando a polícia finalmente se intromete (repito: a violência dura meia hora numa rua movimentada), ela não faz nenhuma prisão. Apenas recolhe a moça e a leva para sua família. Na realidade, a polícia só começa a procurar suspeitos 48 horas depois da violência. E isso depois que as imagens do vídeo gravado se espalham.
A notícia ganha repercussão em toda a Índia, e também no mundo. Um jornalista está sendo acusado (não pela polícia) de instigar o ataque. Ele pede demissão do seu cargo. Até agora, oito homens foram presos. Mulheres fazem protestos exigindo que a multidão de estupradores seja punida, e que a violência de gênero tenha fim.
O cineasta Shekhar Kapur (diretor de Elizabeth) declara: “Como sociedade, precisamos assumir responsabilidade coletiva por tornar incidentes como este aceitáveis e recorrentes. O bombardeio constante de imagens femininas como meros objetos sexuais altera a percepção do homem imaturo. O abuso físico de mulheres e até o estupro não é um ato sexual, mas um ato de humilhação e poder de um homem sem autoestima”.
Brinda Karat, líder do partido comunista da Índia, clama para que as pessoas saiam às ruas para protestar, porque o caso passa duas mensagens para as mulheres: que as indianas não estão seguras, e que a polícia não se responsabiliza pelo que acontece com elas. É uma democracia estranha, segundo Karat, se o que rege esta democracia são valores patriarcais que claramente priorizam um gênero sobre o outro.
O número de casos de abuso em Assam dobraram em 2010, em comparação com 2007. A criminalidade contra mulheres naquele estado é o dobro que a média nacional da índia. E olha que a média indiana já é altíssima. De todos os países G-20 (as maiores economias do mundo), a Índia é o pior lugar para as mulheres viverem (o Brasil ocupa a 11a posição).
Quase paralelamente ao ataque em Assam, uma vila de outro distrito bane casamentos não arranjados, e proíbe mulheres com menos de 40 anos de saírem sozinhas, e moças de usarem celular na rua. Tais atos aumentam a criminalidade, juram as autoridades.
Pois é. Mesmo com toda a violência contra as mulheres, tanto os políticos quanto a polícia indiana continuam insistindo que a culpa é delas, das mulheres. Cabe a elas se vestir discretamente e não sair sem a companhia de um homem à noite. Isso é muito parecido com o que uma delegada aqui no Brasil disse esses dias: que as mulheres devem “evitar andar na rua falando no celular ou ouvindo música no MP3 Player, porque os estupradores normalmente abordam mulheres desatentas”.
Foi isso mesmo que você ouviu. Aqui, como na Índia, mulheres não só não têm garantido o seu direito de ir e vir, como a culpa é sua, se algo acontecer. Era você deveria estar prestando atenção. Simultaneamente, vivemos afirmando que estupro é ato de meia dúzia de psicopatas. Às vezes também exigimos mais policiamento. Discutir um conceito de masculinidade falido que incita a violência? Avaliar o que é cultura de estupro? Não, isso é paranoia de feministas.
Uma congressista na Índia se indigna: “É ridículo que nós nos sentemos e digamos que deve haver polícia para cuidar disso. O que aconteceu com a nossa sociedade? Há uma fratura social. Parece haver uma aceitação para este tipo de comportamento. Eles irão quase se gabar, como se tivessem feito algo heróico”.
Quando insistimos que deve-se ensinar os homens a não estuprar, em vez de ensinar as mulheres a não serem estupradas (até porque sabemos de todos esses perigos desde que somos crianças; faz parte do controle social sobre nós), o pessoal que se recusa a discutir o assunto diz que isso é besteira, que é como pedir a um assaltante para não assaltar. Mas não estamos falando de criminosos profissionais. Estamos falando de homens comuns, que acham aceitável atacar uma menina por ela não estar acompanhada por um homem. De homens que veem estupro como forma de socialização entre eles. De homens que confundem mulher sozinha com mulher disponível. De homens que não entendem porque nos revoltamos tanto contra situações assim -– afinal, é só sexo!
Aqui no Brasil, na Índia, em todo lugar, ainda temos muito que combater. Mas a violência sexual contra a mulher só vai diminuir quando a sociedade entender que estupro não é um problema restrito à vítima e seu estuprador. Ou, no caso de Guwahati, a seus estupradores.




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