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Fatos e versões - JOSÉ PAULO KUPFER
O ESTADÃO - 05/08
Mais de uma semana e meia depois, a recomendação do Santander para clientes adequarem seus investimentos ao ciclo político, continua produzindo reações dos mais variados teores. Abriu-se um leque que vai da crítica ao banco pela recomendação, como fez o governo, à condenação do governo pela "censura" ao banco, como fizeram analistas de mercado.
Na profusão de argumentos utilizados para a defesa desta ou daquela atitude, emergem evidências de quanto as recomendações de compra ou venda de ativos nem sempre conseguem evitar confusões entre fatos perfeitamente observáveis e expectativas, mesmo formadas a partir desses fatos, ainda por se confirmar no futuro. Quando não é possível delimitar bem essa fronteira e a confusão passa a influenciar as tendências de preço dos ativos, seria mais proveitoso tentar definir se uma instituição financeira deve ou não divulgar recomendações de compra ou venda, em vez de embarcar no Fla-Flu de quem pode ou não pode fazê-lo.
Não parece tão difícil estabelecer critérios para uma decisão desse tipo. Uma ideia para evitar recomendações indesejavelmente especulativas é combinar o nível de risco envolvido na recomendação, a quantidade de potenciais investidores alcançados por ela e o seu grau de sofisticação na avaliação de aplicações financeiras. Quanto maiores forem os dois primeiros e menor o último, mais alta deveria ser a cautela nas indicações.
Esse cuidado pode ser necessário, caso o objetivo da recomendação não seja meramente especulativo, justamente porque, nos ciclos políticos presididos por eleições presidenciais, os fatos da economia nem sempre determinam o resultado das urnas e este nem sempre garante que o eleito adote a política econômica dele supostamente esperada. Nas quase três décadas depois da volta da democracia no País, essa verdade já se apresentou com tantas faces que ficou impossível antecipar qualquer padrão de funcionamento.
Era fato, por exemplo, nas eleições de 1998, que o regime de câmbio fixo vigente se tornara insustentável, mas o fato não deu a vitória à oposição e a mudança, para o regime de câmbio flutuante, veio com o presidente reeleito. Na eleição seguinte, o desejo de mudança prevaleceu, impulsionado pelo fato de a economia se encontrar extremamente frágil, necessitada inclusive de mais um socorro do FMI. Porém, ao ganhar, a oposição manteve, em aspectos importantes, a política econômica vigente.
Os fatos, no ciclo atual, mostram uma economia frágil, namorando a estagflação. Não adianta o governo Dilma desqualificar, como tem feito sistematicamente, as análises que apontam para o baixo crescimento, a inflação alta e pressões no setor externo como fatores a exigir mudanças na política econômica. Mas, se mudanças parecem se apresentar como incontornáveis, não é fato que só poderão ser levadas a cabo pela oposição ou mesmo que a oposição as promova ou, ainda, que, ao promovê-las, alcance os bons resultados esperados
Já são suficientes as indicações de que da cartola do governo que pleiteia a reeleição não sairá, durante a campanha eleitoral, nenhum coelho que indique autocritica ou caminhos alternativos para um segundo mandato. O que se vê da oposição, do mesmo modo, não tem sido diferente do que já se conhece de outros carnavais eleitorais. As propostas vão perdendo nitidez à medida em que crescem para algum candidato oposicionista as chances de uma disputa mais competitiva.
Sem muitas bases concretas de avaliação, exceto suposições de políticas econômicas a serem adotadas por candidatos, as apostas com base nos vaivéns das pesquisas eleitorais são, portanto, bastante arriscadas. O fato de que a economia está frágil não sustenta sozinho as versões, apoiadas nas instáveis nuvens da política, que estão levando o mercado de ações à formação de bolhas perigosas.
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