Foco no passe livre - MARCELO MITERHOF
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Foco no passe livre - MARCELO MITERHOF


FOLHA DE SP - 20/06

Educação e a saúde pública são gratuitas. Pelos mesmos motivos, o transporte deve ser universal e subsidiado


Uma eternidade se passou desde a coluna passada, quando os protestos iniciados em São Paulo contra o aumento do ônibus ainda eram relativamente incipientes.

Na quinta passada, o Movimento Passe Livre (MPL) era tido na grande imprensa como um grupelho extremista, algo injusto e simplificador.

A ação violenta da PM paulista na noite do mesmo dia virou a opinião pública a favor dos manifestantes. Nesta semana, os protestos tiveram atos de vandalismo, algo que costuma ocorrer quando multidões se juntam seguidamente.

Deixo de lado a difícil tarefa de avaliar os significados dessa movimentação avassaladora, que se tornou "viral" e ganhou objetivos difusos. Certo é que o MPL conseguiu trazer os transportes públicos ao centro dos debates nacionais.

Muitos não apoiam a gratuidade e os subsídios operacionais. Como os recursos fiscais são finitos, reduzir a tarifa tiraria dinheiro de outras prioridades, como educação e saúde, e do próprio transporte, reduzindo os investimentos necessários para melhorar sua qualidade.

Discordo em parte. Em 21 e 28/02/2013, escrevi duas colunas sobre transportes coletivos. Na segunda ("Ônibus gratuito"), defendi que com a prática mais comum no país --não ter subsídios operacionais, que baixem a tarifa-- é difícil otimizar o sistema de transporte. Ter uma moto pode sair mais barato que andar de ônibus. Não é à toa que, nos lugares do mundo onde ele é eficiente, há pesados subsídios.

Os subsídios em peso inibem o transporte individual, beneficiando a todos, inclusive quem não usa ônibus ou metrô. Eliminam também outras ineficiências, como os efeitos perversos das gratuidades parciais (idosos, estudantes etc.), que são custeadas pelos demais usuários.

Quanto à gratuidade universal, sua avaliação precisa ser feita de maneira menos estática. Afinal, exceto no curto prazo, as receitas fiscais não são dadas.

Se os usuários do transporte público, que em sua maioria são pobres, pagam pelo sistema do jeito que é hoje, o financiamento pelos contribuintes (a tarifa zero), usando impostos progressivos, permitiria não só mantê-lo como melhorá-lo, ampliando o investimento. O pedágio urbano pode ser uma fonte complementar.

É fato que no mundo a gratuidade é incomum, especialmente em metrópoles. Mas, no Brasil, a ainda alta desigualdade fala a favor de cobrar do contribuinte, em vez do usuário.

Ademais, a gratuidade não é inexistente, como muitas vezes se afirma. É o que mostra Lúcio Gregori, ex-secretário paulistano de Transportes que propôs a tarifa zero na gestão petista de Luiza Erundina, em ótima entrevista ao portal Mobilize.

Há ainda a questão de por que priorizar o transporte. E a educação e a saúde públicas? Não custa lembrar que elas são gratuitas. O transporte tem um impacto cotidiano e imediato na qualidade de vida da população. Faz sentido considerá-lo um serviço público que deve ser universal e subsidiado.

Claro, a saúde e a educação têm graves deficiências. No entanto, o MPL também chama a atenção para a possibilidade de subsídios parciais à tarifa. O subsídio total (a gratuidade) é apenas uma das opções. Por exemplo, uma tarifa (mais baixa) poderia se destinar exclusivamente a financiar os investimentos.

Além disso, na discussão está em jogo mais que a disputa por recursos públicos entre os serviços. Há uma questão macroeconômica.

Após anos de avanços na inclusão social, os seus principais instrumentos, o Bolsa Família e a valorização do salário mínimo, mostram limites para manter o ritmo de distribuição de renda e ampliação dos salários reais. Recuperar tal capacidade é crucial para a economia brasileira retomar o crescimento sustentado.

Uma forma indireta, mas eficaz, de fazê-lo é elevar o gasto público para melhorar a qualidade do Estado de bem-estar social brasileiro e reduzir as despesas da maioria da população com serviços essenciais.

A introdução da gratuidade nos transportes coletivos seria particularmente poderosa, gerando ganhos reais expressivos nos salários menores: ao menos 6%, o limite de desconto do vale-transporte no rendimento do trabalhador formalizado. Entre os informais, o ganho tende a ser maior.

Muitos discordam desse entendimento. Porém não há dúvida de que é saudável que mobilização iniciada na Paulista levante discussões como essa. O passe livre é um bom começo para o debate.




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