'Folha' devia lembrar-se do golpe de 1964
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'Folha' devia lembrar-se do golpe de 1964



Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:


Em 1964, dois editoriais do Correio da Manhã - “Fora!” e “Basta!” - foram as clarinadas da mídia para o golpe militar que depôs João Goulart.

Como agora, o massacre dos jornais era incessante e generalizado - embora houvesse, então, a Última Hora dissonante deste coro.

O Correio, como a Folha, era o jornal da classe média e, como ela, tinha em suas páginas vários dos mais prestigiosos intelectuais – Carlos Drummond de Andrade. Carlos Heitor Cony, Otto Maria Carpeaux, entre outros.

Arrastado para o “conto do golpe democrático”, o jornal abriu fogo pesado contra o governo legítimo (legitimidade que fora confirmada um ano antes, no plebiscito que devolveu poderes presidenciais a Jango).

E parido o filho troncho do autoritarismo, não tardou a sentir que o menino não só usava a farda como, também, os dentes e as garras.

Perdeu o que seu “inimigo” não lhe negava – a publicidade governamental – e o aliado usou sem pejo, ameaçando, inclusive, os empresários privados que anunciavam por lá.

Sua dona, Niomar Muniz, viúva de Paulo Bittencourt, deixou o jornal ir para a oposição, com episódios que ficaram na história, como o que narra o fotógrafo Amicucci Gallo :

“[…] e tinha uma escola, o Castelo Branco ia visitar a escola meio… inaugurar a escola. […]. Quando eu passei numa sala, por onde ele tinha que entrar, tinha o quadro negro, estava escrito assim, “animais úteis” […] letras garrafais, bem vistas. E eu fiquei dentro da sala. O repórter, desesperado […] “anda, vai chegar o presidente!”, e eu “Daqui eu não saio!”. Ele não entendeu nada, porque eu não queria falar porque eu não saía dali. Até que ele entrou na sala… e quando ele passou pelo quadro eu , eu pá-pá-pá [barulho da máquina fotográfica]. No dia seguinte, quando ele abriu aquela foto dele, “animais úteis”…

A ditadura que, a pretexto da “democracia” o Correio ajudara a implantar, explodiu-lhe uma bomba em 1968, prendeu D. Niomar em janeiro de 1969 e, meses depois, tomou-lhe o próprio jornal, obrigada a vender para Maurício Alencar, irmão do ex-governador Marcelo Alencar e representante de uma empreiteira, a Companhia Metropolitana de Construções, por sua vez ligada às pretensões presidenciais de Mário Andreazza, como seria, nos seus estertores, outro título usurpado da imprensa brasileira: a Última Hora, tirada de Samuel Wainer e, como o Correio, objeto de uma longa agonia.

Que durou, ao menos, para que eu tenha o orgulho, mesmo assim, de ter na minha carteira profissional aquele nome que pertence tanto à História que nenhum arranjo pôde retirar sua mística.

A Folha, que na época se serviu do golpe para comprar a Última Hora paulista na bacia das almas, deveria se lembrar do que acabou acontecendo com este tipo de ultimato.

A praga, não é raro, tem a mania de voltar-se contra o praguejador.




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