HOMEXPLICANISMO, MERECIMENTO, E PEDESTAIS DESMORONANDO
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HOMEXPLICANISMO, MERECIMENTO, E PEDESTAIS DESMORONANDO


Esse conceito de Mansplaining é bastante novo pra mim, embora seja uma expressão que tem se popularizado em inglês. Como ainda não vi versão em português, vou traduzi-lo como Homexplicanismo. Um excelente post de uma feminista chamada Sady num blog americano conta tudo (minha tradução): “Homexplicanismo não é apenas o ato de um macho se explicar; muitos homens conseguem explicar coisas todos os dias sem serem minimamente ofensivos a suas interlocutoras. Homexplicanismo é quando um cara explica a você, mulher, como fazer algo que você já sabe fazer, ou como você está errada a respeito de algo que você de fato está certa, ou apresentar 'fatos' variados e incorretos sobre algo que você conhece muito melhor que ele. Pontos extras se ele te explicar como você está errada sobre algo ser sexista!”
(Num outro blog, a autora dá uma dica ao homexplicador: “Ignore tudo que todas digam [na caixa de comentários], e aí acuse todo mundo de ser sexista com você! Prossiga com uma explicação intensa. As muié são lerdinhas, mas elas um dia vão te entender! Porque você é um HOMEM! E você está EXPLICANDO!” )
Continua Sady: “Há muitas variedades de homexplicanismo. Mas talvez nenhuma seja tão ridícula e ofensiva como esta: o Homexplicador Pseudo-Feminista. É uma forma particularmente ilógica que acontece em todo lugar, principalmente quando mulheres feministas entram em contato com caras liberais [de esquerda; progressistas]. Não é só um carinha à toa dizendo 'Isso não é sexista', como eles dizem toda vez que uma mulher pronuncia a palavra 'sexismo' em relação a qualquer coisa. É um cara se apropriando do feminismo para poder silenciar mulheres que identificam algo como sexista.”
A autora diz que, em epidemias de homexplicanismo, rapidamente a caixa de comentários de um blog feminista é inundada por homens raivosos que recorrem à palavra “vadia” e demais ofensas que toda feminista (eu diria toda mulher) conhece. Ela afirma que é por isso que a maioria dos blogs feministas modera cuidadosamente a seção de comentários, “para que pessoas que tenham vontade de discutir sexismo sem experimentá-lo possam falar sobre isso sem serem soterradas ou assustadas por toda a Ira Masculina”. Ela tem razão. Mas geralmente o troll se revolta por ser deletado e chora suas pitangas reclamando que, se ele não pode criticar o feminismo, qual o motivo de ler feministas, ou de tentar entender feministas? (Esses trolls têm uma lógica engraçada, vamos concordar).
E aqui a blogueira responde à pergunta e desenha o ponto que incomoda tantos homens (e muitas mulheres que acham que o amor conquista tudo e que devemos ser boazinhas e compreensivas com os homens, para que assim eles gostem da gente): “Se você ouvir mulheres e feministas, você poderá começar a entender alguns pontos básicos, tais como: as mulheres não têm que automaticamente te aceitar como um expert, principalmente quando o assunto em discussão (sexismo!) é algo que você nunca experimentou em primeira mão. As mulheres não têm que te fazer sentir 'confortável' ou 'bem-vindo' em toda conversa. As mulheres não têm que automaticamente permitir um espaço pra você nas discussões delas, nos blogs delas, ou na vida delas. As mulheres não têm que permitir que você entre nos movimentos políticos delas, nos espaços delas, no corpo delas, ou em qualquer outra coisa que pertença a elas; você, como homem, não é merecedor de atenção, admiração, afeição, respeito, ou companhia das mulheres, só porque você quer. E se uma mulher disser 'não', você deve respeitar que aquela mulher disse não, e você deve parar.”
E Sady compara com perfeição o comportamento dos trolls machos na internet com o que acontece na rua quando um homem chega pra uma mulher e ela não está interessada. Primeiro a blogueira aponta que nós nunca dizemos não. Geralmente damos uma desculpa, como “Não, eu tenho um namorado”. O cara nos ignora e continua falando. E quando dizemos “não” com firmeza, “O cara simplesmente passa a gritar. Ele diz que você não é nem tão gostosa. Ele diz que você é uma vadia (Minha favorita é 'Sua vadia, eu tenho um Rolls Royce'). Às vezes ele te segue pela rua, gritando com você; às vezes, ele te segue com o carro. Esses caras sempre têm tanta certeza que eles merecem seu tempo e sua atenção que eles vão te incomodar até que você dê isso a eles, ou que você tenha medo e se arrependa por não ter dedicado esse tempo e atenção a eles”.
E a blogueira não para aí: “É assim que as mulheres são condicionadas a viver numa cultura sexista e de estupro. Assim como a maioria das mulheres, vivo numa sociedade em que violência, assédio e coisas assustadoras podem acontecer a qualquer momento, só porque eu disse 'não' pra um babaca qualquer sem ser boazinha. Fazer isso é tão perigoso que a maior parte das mulheres não se atreve; depois de alguns incidentes tenebrosos, elas aprendem a inventar desculpas, a sorrir, a ser doces e receptivas, a agir como se todo babaca na rua fosse um novo amigo precioso com quem elas adorariam conversar durante horas, se um destino cruel não tivesse atrapalhado. É assim que é ser uma mulher: ser legal com todo babaca, porque esse babaca qualquer pode ser aquele que vai te machucar. E, se ele te machucar de qualquer jeito, dirão que você lhe deu falsas esperanças”.
Bom, eu acho brilhante tudo isso que ela diz, se bem que nesta última parte ela exagera um tiquinho: “Tudo -– homexplicanismo, assédio sexual, cultura do estupro, e tudo o mais que não gostamos sobre como homens tratam as mulheres, da violação menor à mais violenta, tudo nasce da ideia que as mulheres devem ser ignoradas ou punidas quando dizemos 'não'”.
Pois é, não sei se é tudo, mas esse é o conceito do entitlement, do merecimento que grande parte dos homens sente em relação às mulheres. É preciso combater esse conceito de merecimento. Porque desculpe estragar sua festa, mas você não merece nada só por ser homem. Você pode merecer alguma coisa por ser um cara bacana. Isso quando e se a mulher quiser, lógico. Aceite essa ideia tão radical.




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