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NÃO EXISTE AUTONOMIA NA PROSTITUIÇÃO INFANTIL
Quando várias pessoas me enviaram o link para a notícia “Presunção de violência contra menor de 14 anos em estupro é relativa”, minha reação, como a de quase todo mundo, foi visceral. Fiquei revoltada que um homem foi inocentado da acusação de ter estuprado três meninas de 12 anos (não havia presunção de violência porque elas já eram prostitutas), e tuitei minha interpretação da notícia: “Liberaram a prostituição infantil”. Mas logo apareceu a Renata, que tentou me explicar algumas coisas no limitado espaço de 140 caracteres. Eu não entendi muito bem, primeiro porque esta semana anda hiper corrida (estou escrevendo este post às 4 da manhã, minha primeira das três aulas de amanhã começa às 9, e ainda não preparei todas as aulas –- pelo jeito, não vou dormir), e também porque é informação demais numa linguagem (juridiquês) que é meio que grego pra mim. Mas ontem a Renata, que é delegada de polícia e entende tudo de leis, publicou um longo, detalhado e paciente post no Blogueiras Feministas. Ela explica que a decisão da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) se refere a uma acusação ocorrida antes da mudança da lei, em 2009. Apesar dessa decisão poder criar uma perigosíssima jurisprudência, a lei não retroage. O ponto principal é que, segundo Renata, “Prostituição infantil é crime. Para o explorador, desde quase sempre. Para o cliente, desde 2000. Sexo com menor de 14 anos é crime, independente da condição, da aparência física, da vontade, da aprovação dos pais. Pagar por sexo com menor de 14 anos, é ESTUPRO”. Em outras palavras, embora esta decisão tenha sido absurda (e o governo -– o poder executivo, digo, que é independente do judiciário -– percebeu isso, e logo a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República lançou uma nota pública pedindo que a decisão fosse revogada), ela não muda nada pra agora. Ainda bem. Mas continuei me sentindo incomodada com a decisão, e o post do Sakamoto (“Por aqui, a pedofilia encontra terreno fértil para crescer”) me deixou bastante aliviada. Em outras palavras, a gente pode ficar revoltada com a decisão, mesmo que as explicações técnicas sejam convincentes. Isso porque as leis, assim como as palavras, estão carregadas de simbolismo. Elas representam ideias, ideologias, passam valores e juízos. E o que tanta gente sentiu ao ver a (única) notícia sobre a decisão foi mesmo indignação.Não vou entrar na questão da prostituição (adulta) neste post (pra quem quer saber, sou contra a prostituição, acho que num mundo igualitário não haveria prostituição, mas não tenho como ser contra as prostitutas, e defendo que elas tenham todos os direitos legais). E a questão da sexualidade d@s menores de 14 anos também é uma questão muito complexa. Acredito que exista bom senso. Se uma menina de 12 anos transa consensualmente com alguém mais ou menos da sua idade, não é crime. Mas, sinto muito, não quero adultos transando com menin@s de 12 anos. E muito menos se esses adultos pagarem ess@s pré-adolescentes para transar.As pessoas enchem a boca pra falar de liberdade individual, como se essa liberdade estivesse acima de todas as outras. Liberdade individual é uma beleza, mas serve pra justificar muitas atrocidades. Por exemplo: no começo do mês, circulou a notícia de que um casal voltou do feriadão de carnaval e encontrou sua filha de 15 anos numa orgia com 17 homens adultos. Parece (e provavelmente essa história muito mal contada é falsa) que a garota havia se leiloado pela internet, e arrecadado, com isso, R$ 63 mil naquele final de semana. Parece que ela se prostituía desde os 12 anos e já tinha em sua caderneta de poupança (sem que os pais soubessem) mais de 234 mil reais. Sei. Vou fingir que acredito. Então, se for verdade, foi sexo consentido. A menina sabia o que estava fazendo. Mas e daí? Desde quando uma menor de idade pode ter autonomia pra vender seu corpo? Mais do que ter sido sexo consentido, foi prostituição. Prostituição adolescente (e infantil quando ela tinha menos de 14 anos). E vou ser sempre contra a prostituição de menores de idade. E quero, sim, que patrocinadores da prostituição infantil (trocando em miúdos: os clientes) sejam criminalizados pelo mal que causam à sociedade. Quero que sejam presos. E que, se a menina que eles pagaram tiver menos de 14 anos, que o crime seja considerado também estupro de vulnerável.Porque senão complica, né? Se afrouxarmos os limites, cada vez iremos baixar mais a idade. E daqui a pouco teremos uma menina de cinco anos, precoce no mundo do capitalismo, se prostituindo pra adultos. E aí, se ela jurar que ela que quis, que a ideia foi dela, a gente vai pensar que em nome da liberdade individual pode tudo e dizer “Ahhh bom, então beleza!”? Não. Não dá. Desse jeito fica fácil demais pra quem se beneficia da prostituição infantil. E que obviamente não são as prostitutas.
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