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No bambual - LUIS FERNANDO VERÍSSIMO
O GLOBO - 30/05
O Ibsen Pinheiro, grande frasista, diz que no futebol uma defesa se organiza e um ataque se inspira. Perfeito. O posicionamento e a mecânica de uma defesa ? quem cobre quem, quem dá combate e quem fica na sobra, etc ? podem ser sistematizados, diagramados e ensinados. Já um ataque vive de oportunidades fortuitas, de explorar as eventuais falhas de organização da defesa ? enfim, das brechas que aparecerem e da inspiração do momento. Você pode instruir o ataque a ir por um lado ou pelo outro e, quando não dá, levantar a bola na área (o último recurso tão repetido) e confiar no entrevero. No confronto entre a organização e a inspiração, o que faz a diferença é a habilidade do atacante e sua vitória pessoal sobre o defensor. E apesar de estar provado que a jogada mais letal de um ataque é a que vem pelas pontas, atacantes insistem em tramar pelo meio, onde o trânsito é mais difícil e onde a concentração de defensores parece uma floreta de bambus.
Imagine jogar bola num bambual. Impossível, ou só possível a quem tem habilidade fora do comum. O sucesso do Messi se deve em grande parte à sua capacidade de sobreviver no bambual. De proteger a bola enquanto se esquiva de bambu atrás de bambu até chegar numa clareira e chutar a gol. O Neymar tem a mesma capacidade, embora ela não tenha aparecido muito ultimamente, principalmente na seleção. Se o Neymar for para o Barcelona e possível que ele e o Messi recuperem uma arte perdida do futebol, a da tabelinha. Já houve tabelinhas famosas. No Internacional dos anos 50 Larri e Bodinho faziam uma mortal, tramando pelo meio até um dos dois fazer o gol. E o protótipo de tabelinha pelo meio, claro, foi a de Pelé e Coutinho, no Santos. Mas naquele tempo o bambual ainda não tinha crescido tanto.
A dificuldade em atacar pelo meio teve duas consequências. Uma foi a prevalência, hoje, da bola alçada na pequena área para que uma cabeça providencial consiga o que não se conseguiu pelo chão. A outra foi transformar quem acompanha o futebol há tempo em irrecuperáveis nostálgicos. Temos saudades dos ataques com passes que desconcertavam, ou desorganizavam, as defesas. Havia mais espaço para as tramas e a inspiração. E, acima de tudo, menos bambus na entrada da grande área.
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