Geral
O gigante acordou. E o sono acabou - GUILHERME ABDALLA
BRASIL ECONÔMICO - 21/06
A estratégia do PT já está evidente. De um lado, Dilma se dirá mais uma manifestante indignada nas ruas.
Pasmem os leitores, mas a presidente encerrou seu primeiro discurso após a tomada do Congresso com a seguinte frase: ?meu governo também quer mais'. De outro lado, os petistas isolarão Haddad para minimizar os anseios ao aumento do transporte, ao âmbito municipal.
Não queira mais, Dilma, faça mais. O sociólogo Manuel Castells, que recentemente esteve no Brasil, foi um jovem resistente espanhol e é hoje o maior estudioso da revolução social digital.
O conjunto da obra de Castells foca, inicialmente, no porquê e a partir de quem as relações de poder são construídas e exercidas por meio da administração de processos de comunicação.
Num segundo passo, ele analisa como essas relações de poder são impactadas pela influência de atores ou fatos sociais nas mentes daqueles que já estão ansiosos - ainda que atrás de seus ipads - por uma mudança social. Para Castells, a forma mais fundamental de poder repousa na habilidade de alimentar a mente humana, quer dizer, na comunicação.
Com razão. A forma como sentimos e pensamos determina a maneira que agimos, seja individual ou coletivamente. E o meio pelo qual formamos nosso sentir e pensar é a comunicação. É por meio dela que a mente humana interage com o meio ambiente à sua volta.
Por essa razão não me refiro aqui somente à comunicação via rádio, jornais, revistas, televisores ou internet. Ao contrário, refiro-me aqui também ao principal poder de comunicação da prática política: as normas ou, mais coloquialmente, as regras do jogo.
Essas regras, sejam elas de natureza jurídica (leis), de natureza ética, religiosa ou mesmo consuetudinária (baseada nos usos e costumes tradicionais), deixaram de ser uma comunicação de cima para baixo, isto é, do Estado ao cidadão, da Igreja ao crente, de patrão a empregado, transmudando-se, na democracia do século XXI, num debate interativo de massa.
É nesse sentido que a rede digital deve ser encarada: como o símbolo da comunicação horizontal de nosso tempo, uma comunicação de cidadão a cidadão, de trabalhador a trabalhador, de ser humano a ser humano.
Não há, portanto, tantas perguntas sem respostas como declara a classe política. Não há perplexidade e todas as reivindicações esparsas nos diversos núcleos convergem numa assertiva: a multidão brasileira quer ser agora a remetente e a destinatária das regras do jogo.
De onde surgiu então o afã de sair dos computadores/televisores e passar às ruas? Muitos - principalmente os pensadores ligados ao PT - entendem que os pobres de outrora ascenderam à classe média e se conscientizaram de que podem e devem querer mais em contrapartida dos impostos pagos. Dizem que o filho somente pode ser rebelde quando seus pais não lhe deixaram faltar nada. Não concordo, é uma linha de raciocínio casuísta.
Sai às ruas e comprovei na pele que o perfil da multidão vai muito além da suposta nova classe média. Pude ver resistentes sessentões da ditadura, pude ver caras-pintada da minha geração, pude ver herdeiros milionários, pude ver empresários de sucesso, pude ver jovens saindo de carros importados, pude ver crianças já cientes do mensalão.
Não se trata de nova classe média, trata-se de um novo poder de comunicação. Dilma, não seja uma manifestante como quer seu marqueteiro, seja presidente.
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