Por Eduardo Maretti, na Rede Brasil Atual:
“Impeachment e golpe” foi o tema do quinto e último dos seminários promovidos pelo Fórum 21 na Assembleia Legislativa de São Paulo. O debate trouxe polêmicas e divergências em torno da conjuntura política desencadeada desde a eleição de Dilma Rousseff, em 2014. Para o cientista político Sebastião Velasco e Cruz, do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é inquestionável que há um “golpe em curso” no país.
“O processo de golpe começou um minuto depois de confirmada a eleição de Dilma. Quatro dias depois, o PSDB já entrava com recurso para tentar impedir a posse”, lembra. “A crise econômica no fim de 2014 já existia, era mais administrável (do que hoje), e se agravou por causa do ajuste fiscal. Mas é um equívoco atribuir o que acontece no país ao governo. Boa parte do ajuste foi bombardeado no Congresso. O ambiente econômico é determinante para o ambiente golpista e depois se estendeu para a Petrobras. Vivemos um ambiente de golpe desde a eleição”, disse Velasco.
Com a fala, ele manifestou discordância da opinião de Gilberto Maringoni, historiador e ex-candidato ao governo de São Paulo pelo Psol. Antes, Maringoni afirmara que o clima político no país é consequência de um “estelionato eleitoral” da presidenta Dilma. “Imediatamente após as eleições, ela faz o ajuste fiscal, que vai contra a jornada (o apoio de setores da esquerda) no segundo turno de 2014, que foi um dos mais politizados desde 1989”, afirmou Maringoni. Para ele, Dilma rompeu com a base do PT ao fazer um governo em oposição à própria campanha.
Em consequência da insatisfação e do “desalento” provocados na sociedade pelo governo, a oposição encontrou a brecha política para “criar a solução mágica golpista, facilitada por essa situação”. Na opinião de Maringoni, apesar das ameaças, o país não corre risco de golpe, já que, segundo ele, o governo implementa uma agenda econômica que interessa às elites. O membro do Psol disse também que a Operação Lava Jato é positiva, por ter atingido representantes “do capital”.
Em resposta a Maringoni, Velasco defendeu a união das forças progressistas contra o movimento “golpista”. “Se este golpe estiver em curso – e está –, é contra ele que devemos nos colocar, contra a liquidação nacional e dos direitos. Precisa haver unidade em torno dessa bandeira, independentemente das diferenças políticas e partidárias.”
Lava Jato
Para Martonio Mont'Alverne Lima, professor titular da Universidade de Fortaleza (Unifor) e doutor em Direito pela Universidade de Frankfurt, a Lava Jato é política e não atingiu o capital. “A Lava Jato tocou nos bancos, pelos quais passa todo tipo de movimentação financeira como as investigadas na Lava Jato? Não. Então não pegou o capital”, disse.
Segundo ele, “há possibilidade, sim, de golpe”, e isso principalmente pelo poder intervencionista cada vez mais intenso do Judiciário na cena política brasileira. O professor acredita que, em relação aos interesses nacionais, a Lava Jato é mais grave do que se divulga, e nesse sentido é emblemática a prisão do vice-almirante da Marinha Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, acusado de recebimento de propina. “Quando o almirante Othon foi preso, o New York Times comemorou.” Silva é considerado detentor de segredos estratégicos do país na área de energia nuclear.
Lima se diz preocupado com o que chama de “inação” do governo diante da ofensiva do sistema judiciário do país. Para ele, o governo demorou muito tempo a reagir diante das ameaças do Tribunal de Contas da União de recomendar a recusa das contas do Executivo de 2014. O advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, protocolou apenas em 5 de outubro o pedido de suspeição do relator do Tribunal de Contas da União (Augusto Nardes) que analisou as contas do governo Dilma em 2014. Nardes havia, em diversas ocasiões, declarado antecipadamente seu voto a favor da reprovação das contas.
O professor também disse que, quando os governos petistas tinham enorme popularidade, poderiam ter atuado na ofensiva para requerer o impedimento de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, o que na atual conjuntura não é mais possível. “A inação do governo me preocupa. Esse governo foi o que mais fez concursos e fortaleceu o Ministério Público, mas hoje é atacado por todo o sistema judiciário do país. Juristas também alertaram o governo sobre o risco de certas nomeações que eram feitas para o STF, mas não foram ouvidos”, disse, sem citar nomes.
“No TSE (Tribunal Superior Eleitoral), e com o posicionamento do TCU, abrem-se duas portas que podem resultar em golpe”, avalia Lima. Ele estranha a reabertura, em 6 de outubro, do processo no TSE para investigar as contas da campanha de Dilma, depois de o processo ser arquivado, em fevereiro, pela juíza Maria Thereza de Assis Moura, por falta de provas. A reabertura se deu como resposta a um pedido do PSDB.
Sobre as avaliações de alguns especialistas de que a atual composição do STF poderia ser favorável ao governo numa eventual necessidade de julgamento pela Suprema Corte, Lima disse que, "aparentemente, hoje parece haver menos hostilidade ao governo, mas não sei".
Para Sebastião Velasco, “há um ataque brutal da direita, da Polícia Federal e do sistema Judiciário, que visa a cassar o registro do PT e levar Lula, seu expoente maior, o mais importante líder político que o Brasil teve pelo menos desde a segunda metade do século 20, às masmorras”. Quanto ao impeachment, ele acredita que, aparentemente, saiu da "ordem do dia". "As contas da Suíça que implicam Eduardo Cunha desfizeram o script que estava sendo montado para viabilizar o impeachment, mas pode voltar à pauta."
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