Geral
O povo quer mudança. Mesmo?
Rodrigo Constantino
Poucos articulistas contrários ao governo têm adotado postura mais cética diante das manifestações que tomaram as ruas brasileiras. Guilherme Fiúza é um deles, e tem utilizado seu espaço no GLOBO e na Época para jogar duchas de água fria naqueles mais encantados com os protestos que derrubaram a aprovação de Dilma. Esquecem-se de que Lula pode voltar com isso.
Em sua coluna dessa semana na Época, Fiúza faz troça com essa esquizofrenia popular, que critica "tudo isso que está aí", mas na hora de responder em quem votaria, dá Lula no primeiro turno. Lula, o nome da "mudança". É para rir ou chorar? Escreve Fiúza:
A revolta das ruas produziu um milagre. Não as votações espasmódicas do Congresso Nacional, nem a revogação de aumentos das tarifas de ônibus. Esses foram atos oportunistas, que logo sumirão na poeira da história, embora tenham sido celebrados como vitórias revolucionárias. O milagre também não foi a reação do governo Dilma Rousseff, que propôs ao país um plebiscito para reformar a política. Outros governantes já usaram alegorias para embaçar o debate. Como a alegoria de Dilma é especialmente fajuta, não será comentada neste espaço. O milagre da onda de passeatas foi a reabilitação dele - o filho do Brasil, o homem e o mito, Luiz Inácio Lula da Silva.
Como compreender isso? Não faz o menor sentido! E isso, justamente, deveria ser um alerta importante aos que celebram de forma muito precipitada o "despertar" do povo brasileiro, que passou a ter consciência política da noite para o dia. O escritor continua:
A maioria do eleitorado deve estar escondendo alguma informação bombástica. Devem ter algum segredo, guardado a sete chaves, sobre o novo Lula. Diferentemente do velho, esse aí não deve ter nada a ver com Dilma, Guido Mantega, Gilberto Carvalho, José Dirceu, enfim, a turma que estourou as contas nacionais para bancar o populismo perdulário.
Não, nada disso. O novo Lula - esse que a voz do povo descobriu e não quer nos contar - é um administrador moderno, implacável com o fisiologismo. Um Lula que jamais daria agências reguladoras de presente a Rosemary Noronha, para ela brincar de polícia e ladrão com os companheiros (é bem verdade que a polícia só chegou ao final da brincadeira). Esse Lula, que hoje seria eleito para desenguiçar a economia brasileira, sabe que politizar e vampirizar uma Anac compromete o serviço da aviação. O povo foi às ruas por melhores serviços de transportes, e o novo Lula não faria como o velho Lula - aquele que transformou as agências do setor num anexo do PT e seus comparsas. Jamais.
Quando Dilma era candidata, Lula foi bem claro perante os eleitores: Dilma é ele, ele é Dilma. A presidente escuta ele antes de decisões importantes, despacha com seu mentor, uma espécie de governante de facto. Como que a impopularidade de Dilma não gruda em Lula? São mistérios do Brasil. Algo realmente espantoso. O povo fala em mudanças nas ruas. E depois diz que votaria... nele, no Lula, o responsável maior por "tudo isso que está aí". Piada? Só se for de mau gosto...
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