O gigante adormecido
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O gigante adormecido


Rodrigo Constantino

Eu tenho adotado uma postura cética e crítica não só em relação as manifestações, como principalmente em relação ao clima que elas geraram nas ruas e nas redes sociais. Há quem até ontem só queria saber de novela e futebol, e de repente pensa que tudo será diferente pois o povo "acordou", e só quem está nas ruas está realmente fazendo algo para mudar "tudo isso que está aí".

Por isso me conforta quando vejo aqueles outros que, assim como eu, eram os mais críticos ao governo petista nos últimos anos, adotando a mesma postura cética, desconfiada, crítica. É o caso de Reinaldo Azevedo, Marco Antonio Villa e Guilherme Fiuza. Este, em sua coluna do GLOBO de hoje, toca em pontos muito importantes para justificar esse nosso ceticismo. Merece uma reflexão. Ele já começa assim:

O Brasil deu para dizer a si mesmo que mudou. Que nada mais será como antes das manifestações de rua, que agora vai. Que se os governantes e os políticos em geral não entenderem o recado das ruas, estão fritos. É um fanfarrão, esse Brasil.


Claro que algumas mudanças positivas podem ocorrer após essas manifestações. Mas não resta dúvida de que quem sonha com enormes mudanças, com fundamentais mudanças, irá se decepcionar. Eu caso grana nessa aposta! E digo isso pois o clima de cautela é crucial para impedir que essa esperança toda, mal-calibrada e pouco racional, volte-se contra o próprio povo, dificultando reformas necessárias, que serão lentas e graduais. Fiuza continua:

Qual é mesmo o recado das ruas? Vamos falar a verdade: ninguém sabe. Nem as ruas sabem. Ou melhor: não há recado. O gigante continua adormecido em berço esplêndido — o que se ouviu foi um ronco barulhento, misturado com palavras desconexas. Esse gigante fala dormindo.

Como eu tenho apontado, há uma tremenda cacofonia nas ruas, e as demandas são muito díspares. Alguns pedem mais gastos públicos, outros menos impostos, e outros ainda apelam para medidas populistas como "passe livre". O recado das ruas tem alvo: os políticos. Mas é muito vago, sem foco. 

O fator econômico como catalisador das manifestações também é abordado por Fiuza:

Há alguns anos, a imprensa vem contando aos gritos o que está acontecendo com o gigante, sem que ele mova um músculo. E o que está acontecendo é devastadoramente simples: em uma década, o ciclo virtuoso do país foi jogado fora pela indústria do populismo. A crise das tarifas de ônibus (estopim dos revoltosos) é só uma unha do monstro: o descontrole inflacionário causado pelo derrame de dinheiro público. País rico é país com 40 ministérios.


O meu principal receio com tudo isso tem sido acerca da reação do governo. O que vai sair de concreto disso? Congelamento de preços? Mais gastos públicos? Plebiscito? Enfim, o clima criado pelas manifestações podem também servir como pretexto para uma agenda nefasta do governo. Fiuza toca no ponto:

Enquanto isso, a maquiagem das contas públicas vai bem, obrigado — com mais um truque contábil no incesto entre o BNDES e o Tesouro, para forjar superávit e legalizar a gastança. É pedra na vidraça do contribuinte, que nada ouve e nada vê. Deve estar na passeata, exigindo cidadania.
Pensando bem, foi o governo popular quem melhor entendeu o recado das ruas: os cães ladram e a caravana passa. Ou talvez: os revoltados passam e a quadrilha ladra.
Para checar se o gigante estava dormindo mesmo, o estado-maior petista chamou um dos seus para ir até o ouvido dele e chamá-lo de otário, bem alto. Assim foi feito. Como primeira reação oficial às passeatas, Dilma escalou Aloizio Mercadante para dizer ao povo que ele ia ganhar um plebiscito. E que com esse plebiscito, ele, o povo, ia fazer a “reforma política” (o Santo Graal dos demagogos). Claro que o governo sabia que isso era uma troça, uma piada estilo “Porta dos fundos”. Tanto que caprichou nos ingredientes.


Fora isso, há outro risco que já mencionei também: a volta de Lula. Não acho trivial, não sei se ele desfruta dessa popularidade toda, e há boatos de que sua saúde não permitiria uma volta ao poder. Mas se Dilma for triturada antes do tempo, pode ocorrer isso sim, pois sabemos que o PT fará de tudo para se manter no poder. Fiuza conclui:

O país se zangou, foi para as ruas, tuitou, gritou, quebrou e voltou para casa sem nem arranhar quem lhe faz mal. O projeto de privatização política do Estado, que corrói a sociedade e seu poder de compra, está incólume. A prova disso? A popularidade de Dilma caiu, mas quem surgiu nas pesquisas para 2014 vencendo a eleição no primeiro turno, e escolhido “o mais preparado para cuidar da economia nacional”? Ele mesmo: Luiz Inácio, a nova esperança brasileira.
Ora, senhor gigante: durma bem! Mas, por favor, ronque baixo. E pare de bloquear as ruas com seus espasmos inconscientes.




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