Por Maurício Caleiro, no blog Cinema & Outras Artes:Tão logo Lula foi eleito presidente, ao final de 2002, a oposição capitaneada pelo PSDB e pelo PFL adotou o moralismo denunciativo como estratégia virtualmente única de atuação política. Para tanto, teve como parceira fundamental o grosso da mídia corporativa.
O cálculo a sustentar tal estratégia era simples: com a oposição valendo-se de denúncias de corrupção e do domínio dos meios de manipulação da opinião pública, bastaria minar o governo Lula até que ele caísse de podre – fosse via eleições ou, preferencialmente, através de um impeachment.
Antecedentes golpistasNão se tratava de vã projeção. Tal cálculo vinha reforçado por experiências bem-sucedidas anteriores – notadamente a crise que levou ao suicídio de Getúlio Vargas, mas também graves manipulações patrocinadas pela mídia e que ocorreram às vésperas de eleições mais recentes, como o caso Proconsult (tentativa co-patrocinada pela Globo de fraudar as eleições de Leonel Brizola a governador do Rio, em 1982); a edição tendenciosa do debate entre Lula e Collor e o esforço para implicar o PT no sequestro de Abílio Diniz (fazendo os sequestradores vestirem camisas do partido), às vésperas da eleição de 1989; e a suposta tentativa de compra de dossiê contra José Serra por petistas em 2002, episódio que carece de lógica e motivação.
Todos esses fatos têm um denominador comum: a ação da mídia - muitas vezes ilegal, sempre parcial - a favor das forças conservadoras e contrárias às forças populares de esquerda ou centro-esquerda. Vistos em conjunto, eles revelam a adoção de um padrão de atuação, padrão este que diz respeito, em primeiro lugar,, a partidos políticos que abdicaram de um projeto de país em nome de um samba de uma nota só moralista do tipo “faça o que eu digo mas não faça o que eu faço”.
Dois pesos...
Em segundo lugar, referem-se a um jornalismo despreocupado de uma deontologia mínima e que endossa e açula o comportamento anti-republicano de tais forças políticas ao, por um lado, exaltar-lhes uma sua duvidosa “capacidade de gestão” e negligenciar a denúncia de casos de corrupção ou de incompetência administrativa que as envolvam; e, por outro lado, ao superdimensionar ou mesmo fabricar racusações de corrupção contra seus opositores, de cujas administrações se recusa a reconhecer qualquer eventual mérito ou realização.
Diante de tais fatos, é insuficiente a resposta monocórdia com que os internautas amestrados pelos “blogueiros” de Veja reagem ante as denúncias contra a publicação, e que busca, invariavelmente afirmar a culpa dos petistas. A questão, aqui, não é esta. Em todo e qualquer caso, se, após examinar as provas, a Justiça se convencer de que houve, efetivamente, corrupção, que os transgressores sejam punidos, à revelia do partido a que pertençam. O que não se pode permitir é o pré-julgamento pela mídia e a assimetria de tratamentos que ela dispensa à corrupção quando praticada pelo conservadorismo ou pela aliança petista, escondendo e negligenciando o que vem dos primeiros enquanto superestima – ou mesmo cria - o qu ese refere aos segundos.
Golpe e contragolpe
A crônica política dos dois governos de Lula e da presidência de Dilma Rousseff se constrói em meio ao contexto político-midiático acima esboçado. Nele se inserem desde as denúncias, procedentes ou não, contra membros do segundo e terceiro escalões – incessantes desde 2002 - até a crise do “mensalão”, episódio durante o qual as forças conservadoras pareceram, por um momento, prestes a lograr seu objetivo, frustrado sobretudo graças ao misto de habilidade e destemor que Lula demonstrou ao lidar com o caso.
Para as forças golpistas, não se tratou de mera perda eventual de uma “janela de oportunidade”. Uma nova dinâmica comunicacional no país se intensifica justamente a partir desse momento, de forma intensa e em um movimento que é claramente de esvaziamento do poder de influência da grande mídia corporativa e de aumento da força das rádios interioranas, das publicações regionais e, sobretudo, da internet.
Fim de uma era
Assim, o conluio mídia-demotucanato, enquanto procurava desqualificar Lula como analfabeto e Dilma como “poste”, não se deu conta de que o país mudava e, em meio ao esvaziamento progressivo dos factoides - e a despeito das aparições frequentes de Demóstenes e Alvaro Dias no Jornal Nacional -, era a sua propalada força como formador de opinião que estava a se esvair. Tornara-se anacrônico. As denúncias contidas no livro de A Privataria Tucana, de Amaury Ribeiro Jr., povoaram de pesadelos seus sonhos de poder, mas o abrupto despertar só se deu efetivamente agora, com a CPI da Cachoeira, após desmascarar seu falso catão Demóstenes, prestes a botar a mídia no banco dos réus.
Eis porque as reações iradas da revista Veja e de O Globo contra a blogosfera e as redes sociais, que tiveram lugar nos últimos dias após longo tempo represadas, fornecem a evidência maior do fracasso do projeto golpista das forças conservadoras, ao qual o demotucanato e a mídia vêm se dedicando desde a primeira eleição de Lula.
Acting out
Alguém já disse que não basta ler os jornais nas entrelinhas, é preciso fazê-lo de forma psicoanalítica. Quando duas publicações da mídia gorda, as quais passaram anos fingindo desconhecer o papel transformador da blogosfera não corporativa, descem do salto alto e partem para a tentativa de desqualificação, isso é a expressão acabada de sua impotência e o reconhecido do poder da força comunicacional que se lhes opõem.
Quanto mais Veja e O Globo espernearem e partirem para a desqualificação agressiva, não só estarão confirmando, uma vez mais, que suas práticas não coadunam com um jornalismo profissional minimamente sério, mas ratificando a capacidade de comunicação da blogosfera e das redes socais, que hoje já oferecem, respectivamente e em relação à mídia convencional, as mais embasadas análises e uma capacidade de movimentação rápida e efetiva.
Como se pode constatar ao longo do texto, são efetivamente muitas as razões a justificar o medo que Veja afirma sentir.
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Wilson Dias/ABr
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