Queda de Raios...Brasil é Campeão
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Queda de Raios...Brasil é Campeão


Os raios e os trovões já apareciam nos mitos das civilizações do passado, que chegaram a interpretá-los como manifestações divinas. O imaginário popular também originou crenças, muitas delas já esclarecidas pela ciência. Em entrevista, o coordenador do Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe/MCTI), Osmar Pinto Júnior, falou sobre esse fenômeno natural, que também intriga os cientistas.

O Brasil é campeão mundial em incidência de raios e ocorre em seu território pelo menos uma a cada 50 mortes causadas por descargas elétricas no planeta. São cerca de 100 vítimas fatais, mais de 200 feridos por ano e prejuízos anuais da ordem de R$ 1 bilhão.

Doutor em ciências espaciais e autor de quatro livros e de mais de 100 artigos em revistas nacionais e internacionais, o especialista falou um pouco sobre os mitos e dá as dicas para evitar acidentes. E esclarece: sim, um raio pode cair duas – ou mais – vezes no mesmo lugar.


Segundo o site do Elat, dos 57 milhões de raios registrados por ano no Brasil, a maior incidência ocorre no Norte e no Centro-Oeste, mas ao se considerar a densidade, ou seja, proporcionalmente ao território, os estados do Sul ficam à frente. No entanto, o maior número de mortes ocorre no Sudeste. E, segundo o próprio Elat, Recife, na região Nordeste, é a capital do país onde um raio tem maior chance de causar uma morte, seguida de Salvador, de São Luís e do Rio de Janeiro. Como explicar esse cenário diferenciado nas diversas regiões e cidades brasileiras?

O Brasil é um país continental, com enormes dimensões. São cerca de 8,5 milhões de quilômetros quadrados e as condições meteorológicas mudam muito de uma região para outra. Nós temos a região praticamente equatorial, na Amazônia e parte do Nordeste, temos uma parte tropical e temos uma parte até subtropical, no Sul. Em função disso, as tempestades e os tipos de tempestades e a incidência de raios são diferentes. Nós temos, por exemplo, regiões com incidência de raios pouco acima de zero raio por quilômetro quadrado por ano, ou seja, quase não ocorrem raios ou então o fenômeno acontece a cada dois ou três anos. Por outro lado, temos regiões onde caem 20 raios por quilômetro quadrado por ano.

Quanto a mortes, não se pode analisar somente a incidência de raios, é preciso levar em conta a quantidade de pessoas que vivem no lugar e o hábito delas. Quem tem o costume de estar mais ao ar livre, no campo, está mais exposto a ser atingido pelos raios. Em compensação numa grande cidade, num centro urbano, dentro de um carro ou dentro de um prédio, está mais seguro. Mas numa grande cidade também temos mais pessoas, então há mais alvos a serem atingidos.

Considerando a incidência de raios, a quantidade e a disposição das pessoas, chegamos a números interessantes. A cidade com maior número de ocorrência de mortes por raios é Manaus, uma cidade com quase 2 milhões de habitantes, uma população grande, numa região com alta incidência de raios e onde um número elevado de pessoas exercem atividades a céu aberto. O segundo lugar no ranking das cidades no Brasil está São Paulo, onde as pessoas não têm tantas atividades a céu aberto, em compensação a população ultrapassa 10 milhões de habitantes, numa região também com grande incidência de raios. Já Recife é a cidade onde o menor número de raio já causa morte, mas em Recife, na última década, só morreu uma pessoa, e o número de raios é fraco em comparação com outras cidades.

Diante dessa incidência diferenciada por região, podemos destacar localidades onde o fenômeno tem maior impacto?
A região de maior incidência se encontra ao longo do rio Amazonas, a cerca de 100 quilômetros de Manaus, mas em outras áreas brasileiras também existe grande incidência. No Sudeste, temos a grande São Paulo, o vale do Paraíba e o Sul do Rio de Janeiro. No Centro-Oeste, os registros são, no Sul do Mato Grosso do Sul e na própria capital Campo Grande.  No Sul, o oeste do Rio Grande do Sul, próximo a Uruguaiana. No Nordeste, principalmente o estado do Piauí, próximo a Teresina. São todas regiões com grande incidência de raios.

Então a questão populacional já explica um pouco as últimas estatísticas do Elat, que mostram que do total de 1.488 mortes, entre 2000 e 2011, 414 casos aconteceram na região Sudeste – número bem superior aos de outras regiões brasileiras.

Exatamente, porque nós temos mais de um terço da população brasileira vivendo na região Sudeste. Então é a região onde tem o maior número de pessoas, o que acaba levando ao maior número de mortes.

Ainda segundo o Elat, a cada 50 mortes por raios no mundo, uma é no Brasil. O que faz do país campeão em descargas elétricas e em fatalidades?
O Brasil é o maior país da região tropical do planeta – região mais próxima ao centro e mais quente. Por ser mais quente, favorece a formação de tempestades e de raios. Apesar de o número de mortes no Brasil ser relativamente alto, média de 130 por ano, o nosso país é campeão de raios, mas não de mortes. A China é o país campeão de mortes e, de novo, porque a população ultrapassa 1 bilhão de pessoas. Embora lá as estatísticas não sejam tão precisas como as nossas, estima-se que morram 700 pessoas atingidas por raios por ano no território chinês.

Dados do Inpe também revelam a evolução das ocorrências desde o início do século, em que os números apontam para uma redução de mortes nos últimos três anos em relação à média do período. Como o senhor avalia essa queda?
Realmente, as estatísticas mostram que o número de mortes está abaixo de 100 óbitos. Nós tínhamos uma média que chegou a 150, depois caiu para 130, mas nessa segunda década do século 21 o número de mortes tem caído. Ainda é cedo para dizer se esse número de mortes se deve a uma maior preocupação e educação das pessoas no que se refere aos riscos dos raios. Mas a quantidade de raios não está diminuindo, então, num primeiro momento, somos levados a concluir que o trabalho de divulgação está surtindo efeito. Hoje também, com a internet, as informações estão mais disponíveis para as pessoas. Nos Estados Unidos, o número de mortes caiu, na última década, em função do aumento da informação.

E, aparentemente, isso que não estava acontecendo no Brasil, na década passada, começou a acontecer nesta década. O trabalho que o governo, particularmente o Inpe e o MCTI, junto com a imprensa, tem feito de divulgar os riscos que os raios oferecem à população parece que já está surtindo os primeiros efeitos em termos da diminuição dos número de mortes.

Quais são as diferenças entre raio, relâmpago e trovão e que perigo esses fenômenos oferecem ao ser humano?
O trovão é o som, é o barulho causado pelo raio ou pelo relâmpago.  O trovão em si, apesar de causar medo, não causa nenhum dano às pessoas. É claro que se a pessoa estiver muito próxima, 10 a 20 metros, do local de queda do raio, a onda de ar que se propaga e causa o trovão pode arremessar a vítima contra a um objeto, como uma árvore ou uma parede.  O perigo está na descarga elétrica do raio. Essa sim é extremamente intensa, cuja média é de 20 mil amperes, mil vezes a corrente de um chuveiro elétrico, por exemplo, e que pode atingir a 200 mil amperes.

É uma descarga que, obviamente, atingindo diretamente a pessoa mata instantaneamente, mas, em geral, o raio cai próximo à pessoa. É por isso que as vítimas sobrevivem em muitas circunstâncias. Relâmpago é um nome genérico para todas as descargas. Os raios são parte dos relâmpagos, são aqueles relâmpagos que atingem o solo.  Os relâmpagos incluem aquelas descargas dentro das nuvens que não causam danos.

Recentemente o Elat divulgou as primeiras imagens dos chamados raios ascendentes no Brasil. Como esse fenômeno é possível?
Em 99% dos casos os raios começam nas nuvens e se propagam das nuvens para baixo na atmosfera atingindo o solo. Em 1% dos casos acontece o contrário, o raio começa no solo e se propaga para cima em direção às nuvens. Então esses raios são muito raros e acontecem principalmente em torres instaladas em locais elevados. A proximidade com a nuvem facilita que uma descarga comece no chão em direção à nuvem. Foi assim que nós filmamos, há pouco mais de um ano, os primeiros raios ascendentes no Brasil, numa torre de pouco mais de 100 metros de altura em cima de uma colina na cidade de São Paulo.

Uma situação que preocupa são as torres de transmissão que estão sendo construídas na Amazônia, também com mais de 100 metros de altura. Essas torres altas num local com grande incidência de tempestades como a Amazônia vai favorecer muito a incidência de raios ascendentes.

Tem confirmação científica a ideia de que algumas árvores atraem mais os raios que outras?

As pessoas, como os animais, acabam buscando abrigo embaixo de árvores para fugir da chuva, mas se esquecem que aumentam a chance de ser atingidas por um raio. Algumas árvores atraem mais os raios de acordo com as suas características. Quanto mais seiva dentro do caule e mais profundas as raízes, mais chance existe de a árvore ser atingida. Não é mito dizer que algumas árvores são mais atingidas do que outras, mas como é difícil para o leigo identificar e como não há estatísticas em relação a isso, a melhor coisa a fazer é se afastar de qualquer árvore diante de uma tempestade.

Uma crença popular antiga está baseada na ideia de que um local não pode ser atingido duas vezes pelo mesmo raio. Isso já foi desmentido pela ciência?

Esse é o maior mito do povo brasileiro. Os índios que habitavam a região do Brasil, em 1500, quando os portugueses chegaram aqui, acreditavam nisso e até hoje muitas pessoas acreditam. Mas é um mito. O raio cai muitas vezes no mesmo lugar e, em lugares de grande incidência, a chance aumenta.

Existe também a superstição de que os espelhos atraem os raios e que, por isso, durante uma tempestade precisam ser cobertos com um pano. Esse receio tem fundamento?
É apenas um mito muito antigo, não tem por quê as pessoas se preocuparem com os espelhos.

> Em que situações as pessoas estão mais vulneráveis a se tornar vítimas de raios e como é possível evitar?

Fundamentalmente, a pessoa está mais vulnerável a ser atingida por um raio quando está a céu aberto. Dentro de um automóvel fechado, ela está 100% segura. Dentro de uma residência, bastante segura – neste caso, não 100% porque ela pode ser atingida através da rede elétrica ao, por exemplo, falar por um telefone com fio, tomar banho num chuveiro elétrico ou ficar encostada numa geladeira. Ao ar livre a situação se complica e a pessoa corre risco na beira da praia, no campo, num trator ou numa estrada andando de moto.

Como evitar? É importante sempre procurar um abrigo e é importante também ter algumas informações básicas. São muitas as situações. Numa cartilha do Inpe, disponível no portal do Elat/Inpe, o usuário pode conferir essas recomendações no sentido de como agir ao ouvir um trovão ou perceber a proximidade de uma tempestade. (FONTE: Ministério de Ciência & Tecnologia)




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