Quem são os muçulmanos? - JOÃO PEREIRA COUTINHO
Geral

Quem são os muçulmanos? - JOÃO PEREIRA COUTINHO


FOLHA DE SP - 28/05

Não existe uma relação imediata entre o Islã e o terrorismo, exceto na cabeça dos terroristas


Dois criminosos mataram barbaramente um soldado inglês em Londres. Em nome do Islã, disseram eles. Em nome dos irmãos muçulmanos que sofrem.

A sociedade inglesa ficou em choque. A extrema-direita prometeu vingança em várias cidades do país. Na imprensa, a pergunta habitual: que relação existe entre o Islã e o terrorismo?

Não vou fugir à pergunta. Mas, olhando e escutando os dois criminosos, é preciso saber primeiro que relações existem entre o distúrbio mental e atos desta natureza.

Um psiquiatra talvez seja mais útil do que um politólogo. Depois, e só depois, podemos discutir as relações entre uma religião e crimes praticados em seu nome. E a melhor forma de o fazer passa por escutar os próprios muçulmanos. O que pensam eles sobre os temas que normalmente são notícia?

Felizmente, ainda há quem trabalhe neste mundo: o Pew Research Center, durante quatro anos, realizou a maior enquete mundial a respeito. Entrevistou presencialmente 38 mil muçulmanos, em 39 países e em mais de 80 línguas e dialetos.

O estudo, recentemente publicado, intitula-se "The World's Muslims: Religion, Politics and Society". Qualquer interessado na matéria é obrigado a olhar para ele.

Eu olhei: durante dois dias, encontrei surpresas (muitas) e confirmações (algumas).

Sim, a relação entre a crença em Deus e a existência de uma vida moral, que no Ocidente foi praticamente enterrada com o iluminismo, permanece forte no Islã. Do sudeste asiático (94%) ao Oriente Médio e ao norte de África (91%), os muçulmanos entendem que uma vida moral está intimamente ligada a uma vida religiosa.

De igual forma, a esmagadora maioria acredita que a sharia (a lei islâmica que regula todos os aspectos do cotidiano) é a palavra revelada de Deus.

Só que as coisas começam a complicar-se quando olhamos para os detalhes. Deve haver uma única interpretação da sharia ou várias? No Oriente Médio, apenas metade defende interpretações uniformes.

No mesmo espírito, a maioria dos muçulmanos defende que a sharia deve ser a lei fundamental dos respectivos países.

Mas, surpreendentemente, metade defende que ela só deve ser aplicada aos próprios muçulmanos, não às restantes religiões.

E que aspectos da sharia são importantes para levar em consideração? A maioria é favorável à aplicação da lei islâmica em assuntos familiares e disputas patrimoniais.

São poucos os que defendem castigos corporais, embora existam exceções relevantes: 88% no Paquistão, 81% no Afeganistão e 70% no Egito não se importam com chicotadas ou amputação de membros.

E sobre o apedrejamento de mulheres adúlteras, metade diz que sim. Sobretudo nos países atrás referidos (os mesmos que também apoiam maciçamente a pena de morte para crimes de apostasia, ou seja, de renúncia da fé islâmica).

É inegável que a violência é intrínseca ao quadro legal de muitos países muçulmanos. Mas quando as perguntas lidam com o extremismo terrorista, a maioria rejeita-o enfaticamente. Só nos territórios palestinos (40% a favor) os números remam contra a maré.

Aliás, não deixa de ser inquietante olhar para os números dos territórios palestinos: sem surpresas, a maioria concorda que a sharia é a palavra revelada de Deus (75%), que deve ser a base legal de um futuro país (89%) e que deve estar sujeita a uma única interpretação (51%).

Mas os números ficam sobretudo pesados quando falamos de castigos corporais (76% a favor), apedrejamento de mulheres adúlteras (84%, idem) e morte por apostasia (66%, ibidem).

Aborto, sexo fora do casamento e homossexualidade são aberrações (como, aliás, para a esmagadora maioria dos muçulmanos de outras regiões). E 87% dos palestinos, seguindo a tendência mundial, defendem que as mulheres devem sempre obedecer aos seus maridos.

Conclusões? Não, não existe uma relação imediata entre o Islã e o terrorismo, exceto na cabeça dos terroristas (fato a que somos alheios).

Mas, por outro lado, este magistral estudo mostra como as vagas de modernidade que permitiram as liberdades do Ocidente --da reforma religiosa ao iluminismo secular-- ainda não chegaram ao Islã.

E, sem elas, será difícil resgatar essas sociedades do autoritarismo, da pobreza, da intolerância --e, em certos casos, dos extremistas que matam em nome da fé.




- Inferno Muçulmano
INGLATERRA ? Nottingham. Onze homens foram presos durante violento confronto em uma manifestação promovida pela Liga de Defesa da Inglaterra [English Defence League]. Cerca de 500 membros da EDL participaram do protesto. A English Defence League...

- Islamofobia Uma Ova! - Reinaldo Azevedo
FOLHA DE SP - 20/11 É preciso pôr as coisas na balança, atribuindo ao horror o peso que ele tem. Se existe o Islã pacífico, que se manifeste então com mais do que condolências retóricas O melhor marketing do mundo é o das comunidades islâmicas...

- Ocidentalismo - DemÉtrio Magnoli
FOLHA DE SP - 17/01 Após os atentados em Paris, os ocidentalistas limparam a cena do crime, apagando as digitais do terror jihadista Edward Said definiu o "orientalismo" como o empreendimento de construção de um Oriente (árabe-muçulmano) imaginário...

- A Morte Da Europa Que Amo
Janer Cristaldo, Folha de SP Ao não cortar relações diplomáticas com o Irã, em 1989, quando o aiatolá Khomeini decretou uma fatwa condenando Salman Rushdie à morte pela publicação de "Versos Satânicos", os países europeus perderam uma oportunidade...

- Em Defesa Da Chatice
JOÃO PEREIRA COUTINHO, Folha de SP A SUÍÇA é chata. Diz a sabedoria popular. E acrescenta, com horror: um país que só produz relógios e chocolates não pode ser excitante. Podemos sempre replicar: depende dos relógios e depende dos chocolates....



Geral








.