REAÇAS ACORDAM PRA VIDA
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REAÇAS ACORDAM PRA VIDA


Gostaria de dizer que não me surpreendo mais com a direita brasileira, mas estaria mentindo. E eu não minto.
Antes de continuar, peço encarecidamente que me poupem de comentários como "direita e esquerda não existem mais", frase célebre que é sempre dita por alguém de direita. Dica para quem realmente acredita nessa besteira de "conceitos ultrapassados": acompanhe a discussão sobre o massacre dos professores no Paraná. 
A esquerda condenou a ação criminosa da PM e se solidarizou com os manifestantes. A direita, essa que faz marcha pra tirar selfie com policial, chamou todos os professores lá presentes de black blocs, comunistas e petistas, e concluiu: "apanharam foi pouco". 
Ainda que houvesse esquerdistas e sindicalistas entre os manifestantes, esse seria um bom motivo pra polícia bater neles? Dãã, claro. Como me disse uma leitora no Twitter outro dia, parece que de repente criminalizaram a esquerda.
Se dependesse dos reaças, todos os partidos de esquerda, a começar pelo PT, mas seguindo pelo PSOL, PSTU e PCdoB, entre outros, seriam imediatamente extintos. Aliás, partidos livres pra quê, né? Passamos décadas tendo apenas dois partidos durante a ditadura militar (aquela que muitos reaças ainda chamam de "revolução" e pedem para que volte), e funcionou tão bem...
A cara de pau dos reaças não tem limites. Um caso emblemático foi o que ficou conhecido como Merenguegate, A Folha publicou que Gravataí Merengue, vulgo Fernando Gouveia, dono do site anti-PT Implicante e colaborador de outros sites reaças, como o Reaçonaria, tem uma empresa, a Appendix Consultoria, que recebe 70 mil reais por mês da agência Propeg, uma das três agências contratadas pelo governo do Estado de SP.
O governador Alckmin defendeu a contratação depois que a notícia saiu: "A empresa está prestando bons serviços, corretamente feitos" (ha ha, bons não, excelentes!). O secretário da Casa Civil teve a pachorra de declarar: "Se ele [Gravataí] tem um blog com as opiniões dele, não cabe ao governo policiar". Pois é, é apenas coincidência que um blogueiro que se dedica a atacar o governo federal durante anos ganhe um belo contrato de um governo estadual que é seu principal opositor.

Ah, se fosse um blogueiro de esquerda ganhando uma fortuna do governo federal para falar mal de opositores políticos! Seria um escândalo! Mas, como é um reaça espalhando mentiras sobre o PT, todos os outros reaças saíram em seu apoio. Ninguém sequer questionou o valor (70 mil reais!), e olha que esses caras dizem ser defensores do Estado Mínimo.
Ninguém questionou a total falta de transparência. Pelo contrário, reaças celebraram o governo de SP por ter enviado 88 caixas de documentos para a Folha. Para eles, mandar 88 caixas de papelada para alguém que te faz algumas perguntas é transparência, não velha tática de esconder evidências (as séries The Good Wife e House of Cards têm episódios em que essa estratégia de escamoteamento é usada). Ah, e todos acharam perfeitamente normal que a sócia de Gravataí na Appendix tenha sido assessora de José Serra e esposa do número dois da Subsecretaria de Comunicação do governo.
A Folha ainda publicou outros textos sobre o Merenguegate, incluindo um editorial em que exige transparência ("cabe perguntar que parcela das verbas públicas alimenta, por baixo do pano, grupos de militância a favor dos interesses das autoridades -- tucanas, petistas, peemedebistas, pouco importa"). Dos reaças, a única resposta foi que a Folha é um jornal de esquerda e petista (o quê, você nunca tinha notado?).
Por enquanto, nada aconteceu. O que significa que, além de não sabermos quanto a Appendix recebeu da Propeg, paga pelo governo do Estado (terceirização é uma coisa linda!), entre junho de 2013 e setembro de 2014, Gravataí e sua sócia seguem ganhando R$ 70 mil por mês para servir ao governo. Uma deputada estadual, Beth Sahão (PT), protocolou requerimento na Assembleia Legislativa de SP pedindo informações ao governo do Estado sobre esses pagamentos e os contratos assinados (aliás, a Appendix também teve como cliente a Copel, do governo tucano do Paraná).
Depois de um tempinho, chegou a hora de blogueiros reaças profissionais (mas que certamente não ganham tão bem quanto Gravataí) defenderem seu colega. Tio Rei, que deve entender muito do assunto de ser patrocinado por governos tucanos (afinal, quando dirigia a revista Primeira Leitura, recebeu 50 mil reais do operador financeiro do PSDB) lançou uma "campanha" dizendo que tudo bem investigar o contrato entre Appendix e governo de SP -- desde que se investiguem todos os blogs de esquerda. Para ele, ter um banner de alguma estatal no blog é igualzinho a receber 70 mil reais do governo para atacar opositores, sem que ninguém além da patotinha saiba do pagamento. (Mas eu tô dentro! Quero que todos que durante anos me acusaram de receber grana do PT provem que sou patrocinada pelo governo).
Outro blogueiro da Veja, mais jovem, que ganhou sua coluna como recompensa por ter editado um bestseller do Olavo de Carvalho, fez uma comparação ainda mais inacreditável: Gravataí receber 70 mil por mês é o mesmo que Jô Soares, notório petista, segundo ele, pedir patrocínio ao Ministério da Cultura para traduzir, adaptar, montar e dirigir uma peça de Shakespeare. Para exemplificar como Jô é praticamente filiado ao PT, o blogueiro pôs o link pra um vídeo em que Jô se opõe às manifestações pelo impeachment (o quê, você não sabia que Jô era petista?).

Mas a cara de pau e a defesa dos reaças pelo indefensável não parou por aí.
No dia 24 de abril a PUC Goiás realizou um seminário chamado "A reforma política que o Brasil precisa", que juntou gente da CUT, MST e CNBB para falar de... ahn, reformas, parece que está no título. Um dos palestrantes até defendeu a "distribuição da riqueza que o trabalhador produz neste país". Coisa de comuna, lógico! Onde já se viu achar minimamente injusto um sistema em que as 85 pessoas mais ricas do mundo (entre elas, 12 bilionários brasileiros) têm a mesma riqueza que metade da população mundial?
Pois é, 85 pessoas, gente que cabia naquele auditório universitário, têm o equivalente a 3,5 bilhões de pessoas. Reaças não gostam muito de tocar nesses números que são meio melancólicos. Vão dizer o quê? Que esses 85 bilionários merecem ter tanto? E que metade da população mundial é preguiçosa, não gosta de trabalhar, e portanto merece viver na miséria?
Um rapaz de 17 anos que não é estudante da PUC (ainda está no ensino médio) compareceu ao seminário para cumprir sua missão de trollar. Antes, rezou um terço, meditou nos mistérios do rosário, pediu a Virgem Maria que o iluminasse, e "foi pro combate". Invocou também Olavão, guru da extrema direita brasileira. Reuniu alguns amigos para filmar o que iria fazer, porque se não há imagens, é porque não aconteceu.
Interrompeu a fala de um dirigente para perguntar "Como é que uma instituição católica [a PUC] permite uma bancada formada só de excomungados?". O menino citou um papa que, em 1949, condenou todos os católicos comunistas. Para ele, "excomungado" é um grande insulto. Mas ele continuou, dizendo que o pessoal ali presente "quer matar fazendeiro, quer matar empresário".
Uma professora -- que o rapaz depois chamou de vagabunda -- pediu para que ele deixasse que o dirigente acabasse de falar, e que em seguida ele falaria, porque aquilo é uma democracia. Isso irritou um amigo do guri, que passou a gritar que "não há democracia no socialismo".
Chamar palestrantes de "excomungados", chamar uma professora de "vagabunda", gritar por cima da fala dos outros, repetir mantras da extrema direita -- isso foi muito aplaudido por todos os reaças na internet, principalmente os blogueiros da Veja. Um deles contou que o rapaz, "aluno dedicado de Olavo de Carvalho, desmascarou moral, intelectual, política e religiosamente os palestrantes, do jeito que a gente adora e recomenda". Não só adoram, como este é o único meio que os reaças têm para "desmascarar" alguém. Eles se baseiam no ídolo Olavão, que "desmascara" falando palavrões.

Um fascista no seu momento mais humano
A grande frustração dos reaças foi que o guri não foi atacado por ninguém. 
Porque era isso que ele queria, foi pra isso que foi lá. No máximo, levou um "tapa" (que nem se vê no vídeo) de uma mulher pra quem ele levantou o dedo, amiga da professora que ele chamou de vagabunda (e que o vídeo, editado por reaças, não mostra). A professora o chamou de moleque e exigiu respeito. 
O primeiro a entrevistar o "herói" reaça foi um estudante mais velhinho que, não por coincidência, foi membro de uma chapa de direita (que obviamente se intitulou "apartidária") da UFSCar, chapa esta que foi impugnada após ter praticado transfobia. 
O rapaz de 17 anos explicou: "O que a gente podia fazer era interromper o evento, e esperar uma reação histérica, gravar, né, e espalhar, para que as pessoas vissem que é possível enfrentar esses sujeitos sem grandes consequências. Você veja, tirando uma, ah, agressão, né, que uma moça lá me deu um tapa, que mais parecia um alisamento, porque não deixou marca, não doeu nem nada, e, mas tinha lá um monte de sujeito forte, um monte de sindicalista não sei o quê, mas quando você foi ver era só as mulheres que estavam brigando, né".
No minuto 12:45 da entrevista, o rapaz mostra preocupação com a "ideologia de gênero" que estaria ganhando espaço na educação, mas ele se interrompe para citar uma ameaça ainda mais premente à moral e aos bons costumes: uma exposição sobre a Coreia do Norte na Assembleia Legislativa, em Goiânia (ele e seu grupo foram depois protestar lá; detalhe: a Assembleia de Goiás tem apenas cinco deputados de esquerda -- quatro do PT e um do PCdoB -- e nenhum deles teve qualquer relação com a exposição, que foi organizada por um deputado do PPL - Partido Pátria Livre, seja lá o que for isso, mas, pelo nome, posso jurar que é de direita). 
E óbvio ululante que sobrou até pro Paulo Freire, que já havia sido lembrado nas marchas dos golpistas. 
A direita gostou, e como eles podem fazer o que quiserem sem que sejam responsabilizados (veja o Merenguegate), prepare-se para ter suas palestras invadidas e interrompidas por reaças, que vão te provocar até que você não aguente mais e tenha que elevar o tom de voz. Olha, quem sabe é até bom, porque desse jeito feministas podem parar de brigar entre si em conferências e ver que nossos inimigos são bem outros.
Quem sabe assim a esquerda inteira possa parar de brigar entre si. 




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