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Recessão "técnica" e mental - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 03/08
No meio da campanha, resultados do PIB podem levar debate eleitoral para picuinhas numéricas
NO MEIO DA campanha eleitoral sai o resultado do crescimento da economia na primeira metade do ano. No próximo dia 29, vamos saber do andar da carroça do PIB no segundo trimestre, o que deve dar pano para a manga oposicionista ou, com muita sorte, para o governo, caso não venha o resultado previsto pelos "pessimistas".
Pode ser que se ouça a conversa da "recessão técnica". E daí? Daí, nada. "Recessão técnica" é um apelido dado a dois trimestres de crescimento abaixo de zero, de encolhimento da renda nacional por um semestre. Pode ser que o PIB do tumultuado segundo trimestre decresça algo em torno de 0,2% e, nada improvável, se revise o crescimento do primeiro trimestre para algo abaixo de zero também.
"Técnico" é um adjetivo que parece conferir seriedade a um substantivo. A reportagem sobre governos, por exemplo, costuma dizer que a nomeação de fulana ou sicrano para um cargo foi "técnica" quando a pessoa estudou alguma coisa, em tese não tem inclinação para negócios público-privados ou não é francamente ladra. Pode ser uma besta, mas é "técnica".
Por que a recessão é "técnica"? Porque, talvez, um trimestre apenas de encolhimento do PIB seja acidental. Com dois trimestres de crescimento abaixo de zero, a coisa fica com mais cheiro de queimado, mas vai pouco além a tecnicidade da definição. Qual a dife- rença de um ritmo de crescime- nto de -0,2% seguido de 0,2% de outro, digamos, de -0,1% e -0,1%? Neres de nada, picuinhas, políticas em especial. Em si mesmo, o número assim diz pouco sobre o andamento e a qualidade do estado da economia.
Muita gente que se dedica ao assunto não define recessões apenas pelo andar do PIB, nem há definição incontroversa do conceito. Além do mais, em termos práticos e eleitorais, o PIB é uma abstração real, digamos, de modo irônico.
Pode acontecer, como no Brasil recente, de o crescimento ir de mal a pior e o estado geral da economia prenunciar dias ainda piores, mas a população ainda não sentir na carne os problemas.
Por exemplo, é provável que o PIB da segunda metade do ano seja melhorzinho que o do primeiro semestre, mas, no dia a dia, a sensação térmica vai ser pior, com o mercado de trabalho esfriando mais.
Recessão "técnica", espiritual, mental, estagnação, ou seja lá o que aparecer na roleta de agosto, o fato é que o Brasil cresce muito pouco enquanto apresenta sintomas de uma economia que cresce excessivamente (inflação e deficit ex- terno relativamente altos, para ser breve).
Trata-se do pior de dois mundos. Sem dar conta disso, de desarranjos econômicos elementares, não se pode passar a discutir coisa mais séria, alternativas de desenvolvimento econômico, que se prestam a muita controvérsia (coisas como inflação e gasto público se prestam a pouca controvérsia).
Se todos os candidatos relevantes a presidente disserem coi- sas sensatas a respeito, em vez de bobagens, picuinhas e sujida- des eleitorais, pode ser que a recuperação econômica comece até um tico antes.
É o que o colunista tem a esperança de ver quando voltar de férias, em setembro.
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