Rostos da RBS despertam polêmica no RS
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Rostos da RBS despertam polêmica no RS


Por Igor Natusch, na Rede Brasil Atual:

Polarizada como de hábito, a eleição no Rio Grande do Sul traz uma oposição de ideários políticos que acaba encontrando reflexo no maior grupo de comunicação do estado. Acusada repetidas vezes por integrantes da esquerda de atuar como um partido político, a RBS foi à casa de vários jornalistas que agora concorrem a cargos eletivos na votação de 5 de outubro.

Ana Amélia Lemos (PP), que concorre a governadora, e Lasier Martins (PDT), que busca o Senado, são os dois nomes mais fortes ligados a essa realidade. Ambos foram funcionários do grupo durante décadas e chegaram a ser colegas no Jornal do Almoço, programa da RBS TV líder de audiência no estado. Além disso, os dois adotam um discurso semelhante, que se pretende acima das diferenças ideológicas, e investem em conceitos como enxugamento da máquina pública e combate ao desperdício – sem muito interesse em temas mais próximos da realidade jornalística, como a democratização da mídia.

Em entrevista publicada na Carta Capital no final de agosto, o candidato à reeleição Tarso Genro (PT) afirmou que os grupos de mídia são os novos partidos políticos do conservadorismo. "Ali se condensa um grupo de relações políticas, de pautas, de interesses econômicos, de visão da globalização e de distribuição dos interesses do capital financeiro que fazem a pauta da nação. Isso se reflete aqui no estado", disse Tarso. Para o petista, há "uma marcada sensação política no estado de que agora, com esses dois candidatos, eles querem ocupar o estado diretamente, e não mais por terceiros", defendendo uma agenda favorável ao Estado mínimo e de amplos benefícios a grupos empresariais.

Lasier Martins, em entrevista publicada no site Sul21, nega as insinuações e se diz "chateado" com quem o acusa de ser "candidato da RBS". "Decidi deixar a comunicação por indignação, por vontade de atuar na política e porque não via grandes resultados apenas na crítica", aponta Lasier. "Não tem nada a ver com meu histórico de ter sido um profissional de imprensa. Uma vez rompido o meu contrato, eu não tenho obrigação nenhuma, eu não devo nada para a RBS."

Também falando à Carta Capital, Ana Amélia Lemos posicionou-se de forma semelhante. "Os eleitores gaúchos não votaram na RBS, votaram na Ana Amélia (para o Senado). O Tarso sabe disso, mas ele não quer aceitar", afirma. "É uma empresa que pagou meus salários sempre, sempre em dia. Pagou o que me devia, me indenizou quando eu sai depois de 33 anos. Uma grande empresa, mas eu não tenho nada a ver com a RBS."
"Não têm trajetória política", diz presidente da Fenaj

A presença de candidatos ligados ao grupo RBS não é nova. O ex-governador gaúcho Antônio Britto é jornalista e atuou durante anos nas mídias impressas do grupo antes de seguir carreira política, enquanto o ex-senador Sergio Zambiasi ganhou fama como locutor na Rádio Farroupilha, também pertencente à RBS. Nas eleições deste ano, outros concorrentes são oriundos diretamente do grupo de comunicação, como os ex-Rádio Gaúcha André Machado (PCdoB, candidato à Câmara Federal) e Mauro Saraiva Júnior (que tenta a Assembleia pelo PMDB), além de Paulo Borges, ex-"homem do tempo" da RBS TV e que busca reeleger-se deputado estadual pelo DEM.

O cientista político Rafael Madeira, coordenador do Centro Brasileiro de Pesquisas em Democracia da PUC-RS, pondera que a candidatura de jornalistas, comunicadores e demais figuras midiáticas é comum a todas as democracias ocidentais. "A ideia básica é de que, quanto mais conhecido um candidato, mais competitivo ele é. E pessoas já conhecidas potencializam os votos de um partido, ao ponto de tais candidatos virarem uma estratégia eleitoral." Ainda assim, ele acentua que o fato de os jornalistas candidatos no Rio Grande do Sul serem em sua maioria da RBS não é obra do acaso. "É o grupo de mídia com maior influência no Rio Grande do Sul. A projeção obtida em um espaço como esse se transforma num grande capital político."

Contudo, Rafael Madeira opina que as semelhanças entre nomes como Lasier Martins e Ana Amélia Lemos encerram-se em sua mídia de origem. A senadora, argumenta ele, tem uma relação histórica e familiar com o PP, ainda que não tenha uma trajetória política tão extensa. Além disso, é identificada com um setor específico, o agronegócio. "Lasier encarna um pouco melhor o papel de celebridade, já que nunca identificou-se realmente com o trabalhismo. A decisão de concorrer pelo PDT causou até surpresa." Rafael Madeira vê nisso algo que dificulta uma análise do potencial eleitoral de Lasier, já que – ao contrário de opositores na corrida pelo Senado, como Olívio Dutra (PT) e Pedro Simon (PMDB) – não há como falar em eleitorado cativo ou identificação política em seu caso.

O presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schröder, ressalta que tanto Lasier quanto Ana Amélia eram responsáveis por espaços de opinião no noticiário televisivo da RBS, reproduzindo o ponto de vista da empresa em vários temas importantes – "quase uma extensão da direção", acentua. "Os dois não têm nenhuma trajetória política. Nunca foram nem síndicos de prédio, nunca passaram uma noite sequer em um diretório acadêmico. Foram alçados à carreira política somente pela projeção que conseguiram a partir de seus espaços na mídia."

A mídia, explica Celso Schröder, foi o setor econômico que mais se fortaleceu durante os dias de ditadura. Em sua atuação, continua, os grandes veículos de comunicação atuariam no sentido de usurpar a política partidária, postando-se de forma quase contrária a ela e apresentando-se como substitutos em vários aspectos fundamentais. "Ao invés de cumprirem seu papel fiscalizador, apresentam-se como guardiões da verdade e da honra do país, usando a prerrogativa da liberdade irrestrita de imprensa para se manterem intocáveis. E isso cria um ambiente propício para autoritarismos e messianismos de todo tipo", lamenta.

Em e-mail enviado à Carta Capital, o diretor-executivo de Jornalismo do Grupo RBS, Marcelo Rech, acentuou que "a posição do grupo em relação a estes dois ex-comunicadores (Lasier e Ana Amélia) é de absoluto distanciamento. A empresa não estimula de forma alguma candidaturas, mas não tem poder legal de impedir que comunicadores decidam se candidatar".
Democratizar a mídia não está na pauta

Um aspecto chamativo envolvendo os candidatos oriundos da RBS é a baixa problematização de questões relacionadas com o funcionamento das grandes mídias e a necessidade de um marco regulatório para o setor. André Machado, que tenta eleger-se deputado federal pelo PCdoB, é uma exceção: em sua campanha, o ex-repórter e apresentador da Rádio Gaúcha vem abordando a necessidade de uma reforma da mídia, combatendo a concentração e defendendo a pluralidade de veículos de comunicação.

Outros candidatos, porém, tratam pouco ou quase nada da temática. Ana Amélia Lemos, por exemplo, considera "inaceitável" a proposta da executiva do PT de uma regulação econômica da mídia, que a presidenta e candidata à reeleição Dilma Rousseff voltou a discutir em maio deste ano. "Por mais que se diga que não é, é interferir sobre o conteúdo da comunicação", disse Ana Amélia em entrevista à revista Época. A pressão de veículos de imprensa fez com que a iniciativa fosse removida do programa de governo de Dilma.

"Ser comunicador não define a priori um discurso homogêneo", acrescenta Rafael Madeira, da PUC-RS. "André Machado é de um partido da base tanto de Tarso Genro quanto de Dilma Rousseff, ou seja, tem uma vinculação de esquerda. E o marco regulatório da mídia é uma bandeira de esquerda. Outros candidatos, mesmo que também jornalistas, estão do outro lado do espectro político e não problematizam essa questão. No caso, o partido acaba sendo um indicativo até mais importante do que a proximidade profissional", pondera.
Candidatos vindos da RBS lideram disputa no RS

A verdade é que os ex-funcionários da RBS são figuras de forte aceitação junto ao eleitorado. Ana Amélia Lemos lidera as pesquisas eleitorais no Rio Grande do Sul, com até dez pontos de vantagem sobre o governador. Lasier Martins também lidera a corrida ao Senado, ainda que em empate técnico com o candidato petista, Olívio Dutra.

A forte viabilidade eleitoral desses candidatos influencia as campanhas políticas, opina Celso Schröder, da Fenaj. "Surgem os candidatos com nariz vermelho, com frases chamativas... Tentam constituir em um tempo pequeno o que esses candidatos (vindos de veículos de imprensa) fizeram a vida inteira. Até os representantes de movimentos sociais acabam incorporando essa tendência", diz.

Rafael Madeira, da PUC-RS, complementa. "Um político tradicional leva décadas para construir um eleitorado, para consolidar-se no conhecimento do eleitor. Quem está na mídia - seja como jornalista, como um artista ou ex-jogador de futebol - já começa conhecido, e muitas vezes em postos já avançados. Mas essa ausência de histórico orgânico com a sigla muitas vezes acaba gerando instabilidade na relação partidária."




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