Sheherazade provoca Silvio Santos
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Sheherazade provoca Silvio Santos


Por Altamiro Borges

Rachel Sheherazade, a nova musa da direita nativa, não está disposta a recuar diante das críticas e garante que seguirá utilizando uma concessão pública de televisão para incitar diariamente o ódio na bancada do SBT. Em entrevista ao portal Imprensa, ela foi taxativa: “Não me arrependo de nenhum comentário que fiz”. Já no artigo publicado nesta terça-feira (11) na Folha, ela reafirmou as suas posições preconceituosas. Nesta queda-de-braço, porém, a agressiva apresentadora pode dançar. Ela virou alvo de entidades de jornalistas, não agrada seus “colegas” de trabalho e foi criticada até no Congresso Nacional. O pior: o dono do SBT, Silvio Santos, parece preocupado com o desgaste causado por sua fanática direitista.

Nesta semana, o Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro divulgou nota de repúdio à âncora do SBT, classificando seus comentários como “grave violação aos direitos humanos e ao Código de Ética” da categoria. Já o deputado federal Ivan Valente, líder o PSOL, apresentou representação no Ministério Público Federal e Estadual (SP) contra a apresentadora e a emissora. Nas redes sociais, Rachel Sheherazade já é motivo de galhofa – inclusive com repugnantes postagens machistas. O que deve incomodar mais a apresentadora, porém, é a rejeição à sua postura no próprio SBT. Segundo uma notinha da Folha, a equipe de jornalismo da emissora e vários dirigentes da empresa já pediram a sua retratação pública.

Um fato deve preocupá-la ainda mais. O SBT anunciou nesta semana a demissão de três comentaristas dos seus telejornais – entre eles, de José Nêumanne Pinto, também famoso por suas opiniões direitistas e hidrófobas. Segundo o portal Imprensa, as demissões visaram “reduzir o espaço opinativo” na emissora, que tem sido duramente criticada pela guinada à direita dos últimos anos. “A saída destes profissionais está ligada aos planos do canal de dar menos espaço para opinião em seus jornalísticos”. Rachel Sheherazade, que se jacta de “falar o que pensa”, não dançou desta vez, mas pode estar na mira do implacável chefão Silvio Santos, conhecido por seu faro político e seu senso de oportunidade.

Apesar dos riscos, a âncora não recua. Ela parece que gostou dos holofotes e de ser paparicada pela direita nativa – o deputado Marco Feliciano inclusive já virou seu “advogado de defesa”. Na entrevista ao portal Imprensa, a jornalista até tentou posar de vítima, dizendo ser perseguida por partidos e sindicatos. “É óbvio que querem cercear o meu direito à livre expressão... Não me arrependo de nenhum comentário que fiz”. Já no artigo à Folha, Rachel Sheherazade justificou seu comentário preconceituoso contra um jovem negro acorrentado e humilhado no Rio de Janeiro. “O menor infrator é sempre protegido por legiões de ONGs piedosas. O bandido é sempre vítima e nós somos cruéis algozes desses infelizes”.

A réplica ao seu pensamento tacanho e reacionário foi feita pelo deputado Ivan Valente, também em artigo na Folha, que reproduzo abaixo:

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A volta do Pelourinho

Nosso país não precisa de milícias ou grupos de extermínio, mas de educação, segurança, distribuição de renda e igualdade de direitos

A foto de um adolescente negro, deixado nu, sangrando após golpes de capacete e amarrado a um poste por uma trava de bicicleta correu o mundo. Ressuscitou-se o Pelourinho 125 anos após "o fim da escravidão", para regozijo de quem sempre está pronto para empinar o chicote e fazer justiça com as próprias mãos. Como se essa violência não gerasse mais violência e insegurança, em nome da segurança. Querem substituir o Estado pela barbárie.

Diante da gravidade do fato, em vez de negar a barbárie, a jornalista Rachel Sheherazade, no jornal do SBT, em horário nobre, não só achou justificável a ação dos 30 justiceiros, como estimulou a atitude do que ela chamou de "vingadores". Ou seja, milícias, gangues e bandos que operam à margem da lei.

O que é isso senão apologia ao crime, à tortura, ao linchamento, ao justiçamento? Em seu editorial, em busca de audiência e navegando no senso comum e no desespero da população com a violência, a âncora conseguiu violar a Constituição, o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), todas as convenções de defesa dos direitos humanos, o código de ética dos jornalistas brasileiros, o Código Penal e o Código Brasileiro de Telecomunicações e ainda debochou: quem se apiedou do "marginalzinho" que adote um "bandido".

Por isso representamos a jornalista e o SBT junto ao Ministério Público Federal e Estadual (SP). O SBT afirmou que não se responsabiliza pelas declarações de seus âncoras, já de olho nas consequências legais. A jornalista afirmou que as críticas representavam censura. Refugiam-se covardemente na liberdade de imprensa e de opinião, mas sabem que as leis não amparam apologia ao crime, à tortura e ao linchamento.

Por outro lado, o SBT sabe que rádio e TV operam por meio de outorgas concedidas pelo Ministério das Comunicações e aval do Congresso Nacional. Não é mera propriedade privada, como querem que acreditemos. A emissora tem sim responsabilidade sobre o que apresenta e o Ministério das Comunicações e o Congresso Nacional não podem se omitir em exercer sua prerrogativa de fiscalizar as concessionárias.

Na Alemanha de Hitler, muito antes da guerra, os nazistas formaram grupos paramilitares, milícias aterrorizadoras (os Freikorps) que massacravam "inimigos" (judeus, comunistas, minorias), detonaram o monopólio da força pelo Estado e levaram o ditador ao poder. E deu no que deu. Aqui, o inimigo dos Freikorps do bairro do Flamengo são os jovens, negros e pobres, infratores ou não. Negam o Estado democrático de Direito e pretendem, com a criação de força paralela, com tortura e eliminação física, enfrentar a delinquência esquecendo o sistema que a gera. As históricas desigualdades e injustiças não podem ser resolvidas pela barbárie, mas pelo acolhimento do Estado.

Defendemos a total liberdade de opinião. Mas, é um retrocesso entender que incitação ao crime está resguardada pela liberdade de expressão. O compromisso constitucional brasileiro é com a construção de uma sociedade fraterna, justa e solidária. Nosso país não precisa de milícias ou grupos de extermínio. O que precisamos é de mais educação, política social, segurança pública, distribuição de renda e igualdade de direitos. Única maneira de se conseguir a paz.


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