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UMA RESPOSTA AOS FEMINICÍDIOS
A R. me enviou este relato:
Sou leitora do seu blog há alguns anos, talvez desde o começo, eu acho... Tenho 28 anos. Trabalho num shopping em São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba. Em setembro do ano passado aconteceu algo tão triste aqui. Uma moça e um rapaz de 18 anos terminaram um relacionamento. Poucos dias depois, marcaram um encontro no shopping para conversar. Ele atirou nela, e depois nele próprio. Ela morreu na hora. Ele foi levado ao hospital, mas teve morte cerebral. Eu me lembro como se fosse ontem: às 18h30, vimos uma correria no shopping. Logo depois a notícia de que um rapaz inconformado com o fim do namoro (mais um!), havia matado a moça, num dos corredores do estabelecimento.
Além do ficarmos estarrecidos com a notícia, o que se seguiu deixou todos os lojistas ainda mais incrédulos: o shopping continuou aberto e funcionando normalmente. Triste, muito triste! A família da jovem, aos prantos, a mãe principalmente, vários policiais e uma multidão de curiosos. Falta de respeito pela vítima. Falta de respeito com a família. Dinheiro acima de tudo. Triste, muito triste.
Sabe, fiquei pensando sobre quanto vale a vida. As pessoas passeavam normalmente, havia música na praça de alimentação, e o corpo lá. O corredor interditado, mas o corpo estava lá. A dor da família, da mãe, os parentes chegando, a polícia... meu Deus! Lola, terminei há alguns meses (em grande parte com a ajuda do seu blog) um relacionamento muito ruim. MUITO. Eu tive chance de mudar, de cair fora, de mudar de vida. E ainda penso em tudo o que eu evitei, e em quantas mulheres não tiveram a mesma sorte. Por isso, essas coisas me deixam tão mal, tão triste. A moça aqui do shopping não teve chance. Ainda estou juntando os cacos, me reconstruindo. Acho que tão difícil quanto sair desse relacionamento, é voltar à vida depois. Voltar a ter amigos, a ter autoestima, a ter vontade própria. Não está sendo fácil, mas sei que vou conseguir. Aguentei humilhação, agressões, tanta coisa... até ter força pra cair fora de vez. E recomeçar do zero.
Eu me pergunto, Lola, se não haveria um modo de grupos feministas se organizarem e palestrarem em escolas de nível médio, para alertarem as meninas, para que elas saibam reconhecer um relacionamento abusivo, para que elas não tenham vergonha, para que não se culpem, e que saibam onde procurar ajuda. Acho que a grande maioria das mulheres começa a passar por este tipo de situação na adolescência, e não sabe como se livrar disso. E também para ajudarem os garotos a serem homens de verdade, que respeitem as mulheres.
Minha resposta: É realmente terrível, R. Feminicídio é uma epidemia. Os dados alarmantes são da ONU: metade de todas as mulheres mortas no mundo são assassinadas pelo parceiro ou ex-parceiro. Uma em cada duas mulheres é morta por alguém tão próximo, que dizia amá-la! No Brasil, quinze mulheres são mortas todos os dias, a maior parte pelo namorado, marido, ou ex. É uma praga social. O homem se sente dono da mulher e não aceita a separação. É enorme a pressão social para que ele "faça alguma coisa", para que ele volte a ter o controle da relação, para que ele não aceite a autonomia dela. Camila, a jovem assassinada, fez tudo certo. Marcou uma conversa num espaço público, que teoricamente é mais seguro que num lugar privado. Mas não adianta: quando alguém acha que é dono de outra pessoa, ele prefere matar e morrer a ver a pessoa livre e, de repente, com outro. É por isso que discussões sobre gênero seriam tão bem vindas nas escolas. Aulas assim, sobre violência de gênero, combate a preconceitos, poder, relacionamentos, violência doméstica, direitos das minorias, tolerância, opressões, privilégios, e inclusive educação sexual, poderiam permitir que jovens falassem e refletissem sobre assuntos do dia. Essas aulas já existem nas escolas estaduais e particulares de Sergipe e no Distrito Federal, por exemplo. |
Estudantes em escola particular de Sergipe têm aulas de gênero |
Lógico que os conservadores tremem nas bases e já elegeram a palavrinha gênero como uma arqui-inimiga a ser combatida. Eles veem (acertadamente) o feminismo como um movimento de esquerda. Discussões sobre direitos e luta contra opressões não costumam ser bem vistas por reaças.Mas seria uma maravilha trazer esse debate para as pessoas mais jovens. Isso ainda vai demorar um pouco, principalmente por causa da resistência conservadora. Enquanto isso, recomendo que as escolas convidem feministas para ministrar palestras sobre temas variados. E que as alunas (e, por que não, os alunos também) organizem coletivos feministas dentro das escolas. Esses coletivos já são uma realidade em praticamente todas as universidades brasileiras. A tendência é que as garotas passem a se organizar cada vez mais cedo. A verdade é uma só: está cada dia mais difícil ser misógino.
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