"NÃO SOU BONITA, ENTÃO A MORTE É A ÚNICA SOLUÇÃO"
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"NÃO SOU BONITA, ENTÃO A MORTE É A ÚNICA SOLUÇÃO"


A C. me enviou este email desolador:

Encontrei seu blog por acaso, e li uma história de uma garota que queria se suicidar, por isso resolvi mandar esse email. Eu estava na mesma situação, queria me matar, comprei até formicida, mas não consegui tomar e aí entrei na net e pesquisei sobre suicídio e caí no relato dessa garota e no seu conselho e acabei desistindo.
Vou contar minha história. Se você ler meu email e resolver postar pode ser que ajude outras garotas assim como me ajudou. 
Eu tenho 22 anos, moro numa capital, sou do Nordeste. Morava com meus avôs em um interior que não tinha nem energia elétrica. Minha mãe se casou novamente quando eu era pequena e veio morar na capital, e como ela trabalhava e estudava não tinha como cuidar de mim. Depois que cresci não quis morar com ela por ressentimento, achava que ela tinha me abandonado. Quando fiz 15 anos minha mãe foi me buscar, pois ela tinha me matriculado em uma escola particular onde ganhei uma bolsa. Imagine, Lola, uma garota do interior que estudou até o nono ano em escola publica na zona rural indo morar na capital e estudando com os riquinhos brancos. 
Eu sou parda com traços indígenas, e só fui me ligar nessas questões de discriminação quando alguns meninos da minha nova escola comeram a me zoar por causa dos meus olhos pequenos e puxados. Todos me chamavam de cabocla. Eu não sei como consegui concluir o ensino médio naquela escola. Por incrível que pareça nunca fiquei em nenhuma disciplina, acho que por sorte, porque não sou inteligente e meu ensino fundamental foi muito deficiente.
Por ser nordestina e ainda por cima parda e viver numa outra região sofri muito naquela escola, não fiz amigos, não namorei, alguns professores não gostavam de mim, e ridicularizavam a cultura do meu estado. Mas apesar de tudo consegui e ganhei uma bolsa integral na universidade. 
No primeiro ano de faculdade sofri um acidente e fiquei com duas cicatrizes no rosto e me tornei mais retraída. Todos na faculdade me chamavam de estranha e quando olhavam para meu rosto eu me sentia muito mal por causa das cicatrizes. Com o tempo elas foram ficando menores e com maquiagem disfarço um pouco. 
Apesar de todas as dificuldades que enfrentei nunca pensei em desistir até o início do ano passado, quando conheci um homem que dizia me amar e fez de tudo para me conquistar e conseguiu e depois de algum tempo ele mudou. Percebi que ele tinha vergonha de mim, ele sempre me perguntava se alguém já tinha achando que eu tinha descendência chinesa. Eu respondia que não, que meus traços eram indígenas pois minha bisavó era índia.
Ele dizia gostar de mim, mas não queria assumir e eu me sentia um lixo. Ele tinha muitas amigas lindas e loiras que sempre postavam fotos no face com ele. Entrei em depressão. Estava no sétimo período na faculdade e reprovei em todas as disciplinas. Conversei com a diretora e com meus professores e não perdi minha bolsa, mas no segundo semestre de 2014 eu piorei, só chorava. 
Comecei a me comparar com minha irmã mais nova, que é branca de olhos claros, comecei a comer para preencher o vazio e engordei 5 quilos e minha mãe passou a falar que eu estava gorda, que eu já era feia e agora gorda, que nunca ia conseguir um namorado.
Eu parei de ir pra faculdade nos últimos três meses, só fico trancada no meu quarto chorando. E novamente reprovei em todas as disciplinas e vou perder a bolsa.
Eu percebi que a única coisa que importa é beleza e status e eu não tenho nenhum dos dois e por isso a morte é a solução.
Sabe Lola, é muito difícil viver fora dos padrões, quando se é gorda pode-se emagrecer, mas quando se é baixa, com olhos pequenos, puxados, morena com cicatrizes no rosto e não se tem recursos para recorrer a cirurgias e tratamentos... a morte é a única solução.
Eu estou em depressão, meu cabelo está caindo, aqui não tem médicos na rede pública. Minha mãe acha que isso tudo é frescura, e cada vez que ela fala que sou feia minha vontade cresce de dar basta nisso tudo.

Minha resposta: Querida C., depressão é uma doença séria, e precisa ser tratada. Não sei se é possível, no estágio em que você está, sair dela sozinha. Converse com sua mãe. Tente não brigar nem acusá-la de nada (porque você tem sentimentos de abandono de vários anos guardados, muita mágoa), mas explique que você está com depressão e que você precisa de tratamento psiquiátrico. Explique também que você precisa de apoio, e que você se sente péssima quando ela te chama de feia.
Buscar terapia é o principal neste momento. 
Você tem que melhorar sua autoestima. Não sei de onde você tirou (ok, eu sei, a gente sabe, a ditadura da beleza é uma tragédia) que você não é bonita, que só loiras e brancas são lindas. Sem dúvida que aquele é o padrão que a mídia cultiva, mas lembre-se que a enorme maioria das brasileiras não são loiras de olhos claros, e só alguém muito tapado e racista poderia considerá-las feias. 
Tenho certeza que suas duas cicatrizes no rosto são bem menos perceptíveis do que você pensa. Você até disse que consegue disfarçá-las. 
Mas acredite, C., vai aparecer gente que vai gostar de você com cicatrizes, com olhinhos puxados (que são lindos), do jeito que você é. Só que não vai ser já, você precisa ser paciente, sair da depressão, aprender a se gostar, e parar de se comparar com outras mulheres. Você está baseando toda a sua vida na aceitação dos outros, e sinceramente, dane-se a opinião alheia. Você não tem que ser julgada. E você é a sua principal avaliadora. 
A morte só é a única solução quando se tem uma doença terminal e se está sofrendo muito. Não é o seu caso. É clichê e tal, mas você tem a vida toda pela frente, e você pode fazer o que quiser dessa vida que, segundo meu entender, é a única que você tem. 
Você quer mesmo jogá-la fora porque a sociedade te ensinou que beleza e status são apenas o que importa? Você acredita mesmo nisso? 
Porque tá cheio de pessoas, mulheres e homens, que estão fora do padrão de beleza e não têm status (nem sei o que você quer dizer com isso) e vivem bem, são felizes, são importantes para quem as ama. Eu sou uma dessas mulheres. 
Não desista, C. Reformule todos os seus pensamentos. Comece de novo. Se dê uma chance. 




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