7) VIAGEM AO SUL DO SUL: COMIDA E ARGENTINO
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7) VIAGEM AO SUL DO SUL: COMIDA E ARGENTINO


A alface que me perdoe (e odeio dizer a alface).

Eis a penúltima parte da minha saga ao sul do Sul, em 2003. Leia antes as partes 1, 2, 3, 4, 5, e 6. E vamulá, gente, comente! Nem que seja pra falar mal de argentino ou pra defender a honra brasileira. Porque eu falo maaaal de vocês aqui.

TURISMO GASTRONÔMICO

Gastronomicamente falando, os pontos altos da nossa viagem ao sul do Sul foram três: a seqüência de fondue em Gramado e Canela, o churrasco em São Lourenço do Sul e os sorvetes em Montevidéu. Permita-me discorrer sobre eles, salivante leitor, com exceção do fondue, já descrito em uma crônica. Você já se esqueceu do garçom em Canela que corrigiu meu glorioso francês, né? Então, em São Lourenço tem um restaurante excelente chamado Casa Nostra. Ou seria Cosa Nostra? Certo, talvez o nome não seja um bom indicador, mas o lugar é ótimo mesmo e serve comida farta por preços acessíveis. Se algum dia você for pra Lagoa dos Patos, aceite a dica da Lolinha Guia Turística.
Terceiro item: sorvetes uruguaios. Estou babando só de pensar neles. Olha, por mais que eu adore vocês brasileiros, tenho de admitir que seu gosto pra doces é de baixo nível. Sem querer ofender, vocês gostam das coisas doces demais. Eu e o resto do mundo temos um gosto mais refinado. Ao invés de brigadeiro, a gente prefere chocolate amargo. Não deixe que o nome te confunda. Só porque é amargo não quer dizer que seja amargo mesmo, só não é tão doce. Eu já vi vocês colocando açúcar no café, e, sinceramente, é ridículo. Vocês tomam açúcar com café, não café com açúcar. Pronto, agora falei. Torço pra não perder mais da metade dos meus oito fiéis leitores. Em Montevidéu eles vendem sorvete de chocolate amargo, e é uma delícia. Por que não fazem aqui?
Se eu menciono os pontos altos gastronômicos, também devo falar dos baixos. O mais fundo do poço foi um almoço num restaurante à beira da estrada em Gravataí. Eu comi a menor chuleta que já vi na vida enquanto o maridão olhava fixo pra um filé de frango duríssimo. Ele viu o meu desdém com o prato e comentou: "Eu sei que você não está gostando da comida quando começa a atacar a alface". É bom ter um homem que nos conhece tão bem. Mais tarde, numa pousada, ele insistiu que eu havia odiado o quarto. E disse: "Se aqui tivesse alface, você a comeria".

O ARGENTINO DE CAPÃO

Depois da viagem ao Uruguai, iniciamos o longo retorno pra Joinville. Primeiro demos aquela abastecidinha básica em São Lourenço do Sul, e logo tomamos o litoral. Paramos em Capão da Canoa, no norte do Rio Grande, não muito longe de Torres. Já tínhamos estado lá há dois anos e gostamos. As praias não são grande coisa, o mar é aquele de afogar Lolinhas, mas a cidade é bonita. Procuramos a mesma pousada onde havíamos ficado. É de um argentino que se lembrava da gente, o malucão. Ele é de meia idade, boa pinta e simpático, de um modo excêntrico. Ofendeu-se quando lhe perguntei se era de Buenos Aires. Como você vê, os portenhos não têm péssima fama apenas fora da Argentina. Bom, enquanto falava com a gente, ele disparava broncas com seu portunhol carregado: "O que esses tênis están fazendo secando en cima de mi jardin?". Os parcos funcionários não pareciam temê-lo nem um pouquinho.
Conversa vai, conversa vem, eu e o maridão revelamos que nossa próxima parada talvez fosse Imbituba. "Imbituba? Una porqueria!", ele rebateu imediatamente. Ahn, talvez Laguna? "Otra porqueria!". E começou a destilar veneno. Disse que Capão também era uma porcaria, mas olhou em volta, viu a bela pousada que tinha, e se arrependeu: "Bueno, Capón no és una porqueria total. Pero el viento és una porqueria!". Parece que o vento por lá é forte e constante. Mais pra frente, contamos que vivíamos em Joinville. Ainda fiz um adendo: "Não vai dizer que é otra porqueria, né?". E ele, muito sério: "No, Joinville no. Joinville és mui linda, de una forma diferente". Em seguida, ele nos recomendou o que chamou de um paraíso desconhecido: Ibiraquera. Noutra crônica eu falo de Ibiraquera, prometo.
O mais divertido de toda essa história foi que pedimos pro argentino que, na manhã seguinte, a pousada nos acordasse pontualmente às oito. Dito e feito. Na manhã seguinte, a figuraça bate à nossa porta e, com seu jeito mal-humorado e absolutamente cativante de ser, grita: "Ocho... Y media...".




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