Geral
A hora da verdade - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 08/09
Embora a parte de embargos de declaração do processo do mensalão tenha se encerrado sem alterações substanciais nas decisões tomadas durante o julgamento, as duas últimas sessões do Supremo Tribunal Federal deixaram no ar uma possibilidade de que os votos minoritários e até mesmo os dos ministros que não participaram da dosimetria viessem a definir as penas dos condenados, numa distorção do resultado do julgamento realmente absurda, como chamou a atenção o Ministro Luiz Fux.
Se prevalecesse a posição do Ministro Teori Zavascki, estaria aberta a porteira para a revisão de todas as demais penas pelo princípio da isonomia que certamente seria reivindicado pelos advogados de defesa dos condenados.
Mais ainda, se os embargos infringentes vierem a ser aceitos como recursos válidos num processo de ação originária do Supremo Tribunal Federal, já temos mais um tema para o debate do novo corpo de juízes: a redução das penas de todos os condenados por formação de quadrilha, proposta na sessão de quinta-feira pelo Ministro Teori Zavascki e apoiada pelos de sempre Ricardo Lewandowski e Dias Toffolli e pelo impenetrável Ministro Marco Aurélio Mello, que se orgulha de votos contra majoritários.
Como foram quatro os votos, mesmo derrotados, eles poderão trazer o assunto novamente à baila nos embargos infringentes. E assim o julgamento não terá mais fim, com embargos dos embargos seguidos de novos recursos. O Ministro Teori Zavascki teve uma atitude inusitada na quarta-feira, pois saiu de uma posição rígida de não admitir mudanças nessa fase de embargos de declaração para passar a aceitá-las indiscriminadamente, a fim de reparar o que considerava injustiças do processo.
Os embargos de declaração não se prestam à avaliação da justiça da decisão, e sim a sanar eventuais ambiguidades, contradições, omissões ou obscuridade. Na prática, Zavascki quis transformar esse recurso num arremedo de ação de revisão (artigo 621 do Código de Processo Penal), que ele mesmo apontara como a única maneira de rever os votos já dados.
A redução das penas de quadrilha na verdade livra os condenados dessa imputação, pois, como o STF recebeu a denúncia em 6 de dezembro de 2006, o crime será considerado prescrito com penas menores de dois anos. Se não havia perigo de prescrição, pois, de acordo com o Artigo 109 do Código Penal, a prescrição da pena, se superior a quatro anos e não excedente a oito anos, acontece em 12 anos, hoje esse perigo é real com a possibilidade de redução da pena.
Mas talvez nem mesmo seja preciso chegar- se a esse requinte, pois se o crime de formação de quadrilha for rejulgado, aparentemente já existe uma nova maioria, formada pelos ministros Teori Zavascki e Luís Roberto Barroso, que têm uma visão bastante restrita para essa acusação.
Não aceitaram a acusação de formação de quadrilha no julgamento do senador Ivo Cassol e podem perfeitamente seguir os outros juízes que também não viram no mensalão esse crime.
O temor derivado dessa possibilidade é que os condenados se aproveitem de uma decisão de que não houve formação de quadrilha para alegar que o julgamento todo tem que ser revisto, pois a base da denúncia da Procuradoria Geral foi que José Dirceu chefiou uma quadrilha de dentro do Palácio do Planalto.
Mesmo que corrupção ativa e formação de quadrilha sejam crimes autônomos, o nexo da acusação pode vir a ser contestado, no mínimo para ganhar tempo com novos recursos.
Haveria condições legais e políticas para uma reviravolta completa no julgamento do mensalão depois de quase seis meses de sessões nas duas fases já cumpridas? A opinião pública terá confirmada a suspeita de que a Justiça brasileira não funciona para aqueles criminosos do colarinho branco que têm bons advogados e conexões políticas? Essas são as questões que terão que ser respondidas pelo novo plenário do Supremo, a partir de quarta-feira.
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