Cinco anos em cinco meses (ou do amor pelo lado de lah).
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Cinco anos em cinco meses (ou do amor pelo lado de lah).


Nao querendo ser monotematica, mas ja sendo, queria colocar para fora um post que martela ha alguns meses minha cabeça  sobre a França e sobre essa coisa de evoluçao - e talvez ovulaçao, porque parte desse post é oferecimento da minha tpm. 

Quando eu cheguei aqui na França (2009), me sentia uma estranha em absoluto. Eu estava convencida de que soh estava aqui por Camilo - apesar da antiga vontade de ir embora do Brasil (Brasil = Joao Pessoa. Joao Pessoa = casa dos meus pais). Até hoje, eu nao sei se fui feliz ou nao nesses anos todos em que vivi aqui. Acho que Camilo era uma boa fonte de felicidade que mascarava a solidao sentida. Eu acordava respirando Camilo, mas começava a beber às 8h da manha nos finais de semana pra ver se aguentava o tranco de estar sozinha. E eu, que gosto tanto de falar (o blog veio da vontade de falar, nao de escrever), comecei a me fechar na minha conchinha. 

Ia pro trabalho/faculdade, voltava pra casa, entrava pelas escadas exteriores que davam acesso direto ao meu quarto (para nao ter a necessidade de entrar pela sala e cruzar com meus colocs) e soh descia quando o jantar estivesse pronto. Uma vez terminada a refeiçao, eu subia e me escondia novamente. Disso, surgiram inumeras brigas ferozes com Camilo que, sei la porque, gostava de perder tempo falando merda com o pessoal la na sala. O unico momento em que eu me permitia ser social, era com um, dois, três, vinte, copos de cerveja na mao. Nao gostava de falar francês porque coloquei na minha cabeça que, por nunca ter feito um curso decente, eu nao sabia falar francês. 

E dai, mesmo estando tao longe, eu tinha uns pesadelos estranhos com meu pai. E me pegava com o coraçao acelerado pelo pensamento de um dia ter de ve-lo novamente. Mas ao mesmo tempo, eu pensava em Fabio e meu coraçao se enchia da mais fina angustia, aquela coisa negra que ia me secando por dentro - alguns a conhecem como "saudade". Mas aih a angustia ia embora e dava lugar ao medo. Eu tinha medo de falar, de contactar as pessoas, de sair, de voltar, de ficar e de ser. E, como se nao bastasse, vinha sempre, uma vez ou outra, aquela sensaçao de nao pertencer a lugar nenhum, e alguns pensamentos sempre introspectivos e pseudo filosoficos sobre a necessidade de se pertencer a algum lugar. Eu pertencia a Camilo. E ele dizia que eu era a casa dele. E parecia um bom acordo, porque a gente parecia feliz. E eu amei tanto esse homem! Eu nem lembro mais como era, mas sei que amei porque eu preferi me abandonar à abandona-lo.

Acho que meu amor se confundiu com dependência. Eu nao conseguia fazer nada sozinha. No começo, mesmo quando eu conseguia me exprimir razoavelmente em francês, eu pedia pra que ele fosse comigo ao médico. Eu fazia uma drama pra ele ir comigo resolver algo na Prefeitura. Eu entrava em pânico e fazia birra de criança pra que ele fizesse algum telefonema de meu interesse. Uma vez, a gente pegou uma briga fenomenal nos metros parisienses, porque eu queria que ele me acompanhasse a um lugar que ele nao queria ir - tudo isso porque eu achava que eu era incapaz de voltar pra casa sozinha. Ele corrigia meus trabalhos da faculdade. Eu nunca viajava sem ele. Nunca saia sem ele! Cinema. Camilo. Teatro. Camilo. Show. Camilo. Bar. Camilo. Sim, eu tenho muita vergonha de dizer isso. Eu realmente fui muito fraca. Eu achava que tentava mudar isso, eu queria que as pessoas falassem comigo, mas quando elas falavam, eu rezava pra que elas se calassem. Eu soh queria que elas soubessem que eu era mais interessante do que aquilo, mas eu nao queria fazer esforço pra isso, porque "esforço" subtendia "falar" e, isso, eu nao era capaz de fazer.

E, apesar de toda essa dependência, eu acordei e finalmente percebi que eu tava tao vazia, tao pobre, que eu nao o amava mais, que eu estava com ele, nao mais por amor, mas por medo e, nesse dia, eu realmente me senti (ainda mais) sozinha. Tentei colocar a culpa na minha extrema e fatal instabilidade. Culpei meu signo. Culpei a lua. Culpei Lula - porque todo mundo culpa o Lula. Culpei a França, o Brasil. E lembrava de Artur da Tavola (desculpa atencipada, pois citaçoes soam sempre quase esnobes) quando ele dizia que "(música é vida interior, e) quem tem vida interior jamais padecerá de solidão". Eu achava que tinha e, portanto...

Quando acabamos, eu entrei em depressao. Alias, aquilo deveria ter outro nome, porque depressao eu ja tinha sentido, mas "aquilo" era mais intenso e "aquilo" me transformou. Eu achava insuportavel viver, mas vivia porque eu sabia que fazer alguma besteira iria provocar uma tristeza semelhante na minha mae e esse pensamento me apavorava (desculpa o drama, mas foi assim que aconteceu e, apesar de eu nao entender mais aquela tristeza, eu sei que ela existiu e que foi dessa forma que ela fez parte de mim). Até que um médico me disse que aquilo tudo era, em parte, decorrência de um tumor. Fui pro Brasil desejando estar com meus pais. Sim, pai e mae. Fiz a cirurgia e, quando voltei, meus amiguinhos...

Quando eu voltei, decidi mudar e fazer tudo o que eu queria fazer. Me libertei daquela vida vulgar que eu levava estando junto a você. Parei de me trancar no quarto. Decidi que meu francês nao é bom para um francês, mas que é bom para uma estrangeira. Perdi quase todo o peso ganho durante a doença. Entrei no mestrado, mesmo sabendo que nao haveria ninguém pra corrigir meus trabalhos. Fui descobrindo simplesmente o que era ser eu de verdade - quando comecei minha vida sexual/amorosa, engatei nove anos no stop de namoro e era a primeira vez em que eu estava vivendo sem um cara pra me dizer o que fazer (sou feminista, mas...). Fiquei meio perdida no começo porque sou o tipico clichê de menina que nao teve a figura do pai presente e que demanda muita atençao dos namorados. Agora, gasto meu dinheiro da forma que quero - agora nao gasto mais porque, se somos livres, "nohs gatos ja nascemos pobres", nao esqueçamos. 

Aprendi a viajar sozinha - na primeira vez que viajei sem Camilo, foi pra fazer um trajeto de pouco mais de uma hora. Compro uma quiche, entro no trem, me deparo com uma cadeira vazia ao meu lado. Aguento firme, mas ao ver que nao tinha ninguém pra dividir a porra da quiche, começo a chorar. E fico assim, comendo a quiche e chorando, tendo pena de mim. Deprimente. Hoje, eu prefiro viajar sozinha, isso me da a oportunidade de passar o tempo olhando pela janela, de observar as vaquinhas no pasto ou, em dias feios, de ver macro espermatozoides de chuva se formarem na janela do trem. Aprendi a planejar coisas sozinha. Viajo e, quando volto pra Lyon, vem quase sempre uma lagriminha emocionada me socorrer quando me dou conta de que aqui é minha casa. 

Eu cortei meus cabelos! Dei um pulo dificil para fora dos padroes e agora nao sou mais a menina de cabelos longos e lisos. Sou uma mocinha de cabelos curtos e cacheados (e crespos!). Decidi usa-los como eles sao e, porra, vocês nao imaginam a liberdade que é poder ser você mesma. Fiz o primeiro Amigo francês. E o segundo e o terceiro. E agora, quando eu chego em casa, as pessoas sorriem ao me ver. Quando estou estudando no quarto, elas batem na minha porta e me mandam descer. E eu ainda nao me acostumei com isso. Porque essas eram as pessoas que eu admirava em silêncio ha uns anos e, agora, elas me dizem "eu te amo". Eu amo meus colocs. Eu aprendo com eles. Sao dez ao todo. A gente fala tudo sobre tudo e sobretudo sobre nada. E acho que, finalmente, o que me salvou foram as pessoas. Eu ja tinha falado aqui, num post antigo, que o importante nao é o lugar, mas quem te rodeia. Pra mim, vida interior, Artur, sao pessoas. Eu preciso disso. Eu preciso falar, preciso ser ouvida, mas também tenho necessidade de ouvir, de conhecer o outro. 

Nesses meses em que passei longe do blog, recebi alguns emails de leitores desconhecidos que dizam "olha, desculpa, você nao me conhece, mas eu leio seu blog e sinto como se te conhecesse", e dai, elas me perguntavam se eu ia bem e contavam um pouco a historia de vida delas. Gente, eu amo! Eu acho isso genial! Gosto de gente dada (ui), aberta (ui), que nao faz pose, que nao faz tipo. No começo de 2008, um amigo me escreveu um email depois de ler um post antigo meu num blog antigo.

(...) Desculpe o texto pseudo-sério, mas seu post realmente mexeu comigo, de alguma forma... acho que fiquei meio emocionado, de alegria e tristeza por me sentir em sua pele. Ainda assim, quero que você guarde pra sempre a forma como te admiro; bem como a forma verdadeira como você ama esse negócio de viver - que faz parecer que você não tem medo de nada, parece que nada é realmente tão grande que não possa ser alcançado.

Pois é, eu tive medo de muita coisa, mas parece que continuei conquistando-as  - pelo menos era isso que Camilo me fazia tentar enxergar. Acho que aqui, na França, eu tive a oportunidade de crescer. Sim, poderia ter sido em qualquer outro pais, mas nao foi. Foi longe de casa, longe do meu perimetro de segurança. Me fudi muito sozinha, mas percebi que tudo isso fui eu quem provocou. E, apesar de achar que fosse enlouquecer em certos momentos por nao ter ideia do que fazer com minha vida, olho pra tras e sorrio com toda a ironia que me acompanhou. A vida é irônica. E soh. Sinto como se tivessem me dado uma injeçao de vida. Decidi parar de me vitimizar, de achar que eu sou fraca. Ninguém sabe que você é fraco até que você o diga - gente, baixou o satanas da auto-ajuda? E, finalmente, acho que estou onde eu queria estar. A França me emociona ♥. Aqui é casa e vai ser casa pelos proximos nove anos - a nao ser que eu queira partir de novo, porque eu tenho a escolha. Mas tenho amado esse pais. Adorei fazer o post anterior, adorei perceber que eu faço parte disso. Nao foi pela beleza do pais que eu vim, mas foi pela beleza que eu fiquei. E, sim, pelo povo. Nao escutem os clichês que rolam por aih sobre os franceses. Os franceses sao sim um povo amavel. E quem diz o contrario, nao conhece os franceses. 

Sei que a vida vai continuar nao sendo facil. Mas eu tou bem acompanhada. Eu tenho eu. :)







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