CINEMA QUE EXCLUI AS MULHERES
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CINEMA QUE EXCLUI AS MULHERES


Geena Davis em cena de Os Fantasmas se Divertem (88)

A atriz Geena Davis, que sempre esteve na minha mais alta conta (desde O Turista Acidental, e conquistando todo meu coração com Thelma & Louise; alguém se lembra dela em Tootsie, seu primeiro filme?), acabou de subir um pouco mais. Descobri que ela fundou um centro de estudos, o Instituto Geena Davis de Gênero na Mídia, para analisar a subrepresentação de mulheres no cinema para toda a família (eufemismo para cinema infantil). Nesses filmes, dos 5,554 personagens analisados, 71% são masculinos. Como Hollywood é um lugar totalmente dominado por homens (são homens 93% dos diretores, 87% dos roteiristas, 80% dos produtores), os gostos e valores desses caras brancos e héteros é que vão parar nas telas. Quando há uma roteirista mulher na jogada, as chances de uma personagem feminina de destaque ser incluída na trama aumentam bastante.
Numa entrevista que Geena deu ao New York Times em dezembro, ela afirma que se orgulha dos papéis que escolheu na sua carreira (“A única dona de casa que já interpretei foi em Os Fantasmas se Divertem”, diz ela, “e ela estava morta”), e que seu critério para essa escolha é “As mulheres se sentirão bem em relação a ser mulher quando saírem do cinema?”. Ao assistir filmes pra crianças com a filha pequena, Geena notou que a mesma falta de proporção que vemos no cinema adulto se mantém no infantil.
Os filmes pesquisados incluem desenhos animados, aqueles em que a gente só tem como saber que um bicho falante em duas patas é mulher pela voz e pelos longos cílios. Ou porque ela desperta alguma paixão no protagonista masculino.
Geena dá um exemplo de uma pequena vitória que alcançou. No primeiro Stuart Little, há uma cena (que eu não lembro de jeito nenhum) em que crianças usam um controle remoto para dirigir barquinhos num lago no Central Park. O diretor assistente era quem estava escolhendo os extras para compor a cena. Ele escolhia um menino, dava um controle-remoto pra ele, aí escolhia uma menina, e a colocava atrás do menino. Ou seja, aquele velho clichê de que meninos fazem coisas, enquanto meninas veem e torcem pro que os meninos fazem. Na ocasião, Geena foi até o assistente e sugeriu que ele desse metade dos controles remotos para as meninas. A resposta dele: “Puxa, que boa ideia! Por que não pensei nisso antes?” É, por quê, né? Até em cenas onde há multidões, o Instituto de Geena descobriu, apenas 17% dos extras são meninas. E em 25% das vezes essas meninas estão usando roupa curta, colante, ou reveladora demais.
Com alguns dados preliminares em mãos, Geena foi conversar com roteiristas, animadores e atores sobre esses resultados. Segundo ela, eles ficaram chocados. Eles (e todo mundo) desconfiavam que havia poucas protagonistas mulheres, mas não que havia tão poucas mulheres em geral nos filmes. Geena espera que, a partir de agora, o que esses caras costumam fazer (folhear um script se perguntando “tem algum personagem aqui que possa ser feito por um negro ou oriental?”) inclua também a questão “será que esse personagem pode ser mulher?”.
Pra quem está dentro do grupo privilegiado, não faz a menor diferença que 70% dos personagens em filmes infantis sejam homens. É até bom! Mas é relevante pensar em como essa subrepresentação afeta as meninas vendo tais filmes. O excelente documentário The Celluloid Closet, sobre o retrato que Hollywood pinta dos gays, entrevistou dezenas de pessoas homossexuais que trabalham no cinema. E todas elas diziam que era péssimo crescer sem se ver representada num meio de comunicação de massa como o cinema e a TV. Ou, quando havia um personagem gay, ele era sempre uma caricatura, um chiste, ou um vilão. Assim como as meninas negras aprendem já com dois, três anos de idade que seu cabelo é feio e ruim e precisa ser corrigido, as meninas em geral percebem que são secundárias. Elas entendem a parte que lhes cabe deste latifúndio.
Acho que nunca falei do Bechdel Test. Não é bem um teste, é só um motivo pra uma personagem de quadrinhos lésbica ir ao cinema. Pra que um filme mereça que ela o veja, ele precisa 1) ter pelo menos duas personagens femininas, 2) que falem uma com a outra, 3) sobre algo que não seja um homem. Por incrível que pareça, há inúmeros filmes importantes que não passam no teste (aqui um breve vídeo explicativo em inglês). E esses simples requisitos não significam que o filme seja bom ou feminista (pense em Sex and the City e praticamente todas as comédias românticas), apenas que ele tem pelo menos duas personagens com uma vida um tantinho mais completa.
Mas tem uma turminha que não liga pra nada disso. Eles repetem, como se fosse um mantra, “é só um filme”, “é só um livro”, “é só um comercial”, “é só uma palavra”. Pois é, é só a vida inteira.




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