CLÁSSICOS: JACKIE BROWN / Black power
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CLÁSSICOS: JACKIE BROWN / Black power


Jackie em movimento. Ou quase (leia a primeira parte da análise antes).

Muito de Jackie Brown lida com o poder da protagonista. O bartender a trata com admiração. Ordell supõe que, quando ela vai a um bar, deve precisar usar “nigger repelent” (repelente de homens, talvez negros, mas ele usa a palavra nigger pra qualquer homem). Ela admite que “I do all right”, e ele insiste: “Aposto como você se sai melhor que bem”. Não é coincidência que na sua cena-chave, no shopping, em que ela toma uma decisão, ela está vestindo um terninho que lhe dá poder. Amo essa cena em que tudo gira em volta dela, criando uma grande vertigem.
Várias das cenas do filme são de Jackie em movimento. Ou melhor: a gente sabe que ela está em movimento (dirigindo um carro, andando numa esteira no aeroporto, frenética num shopping), mas não a vê mexer. É o que está em torno dela que gira e se mexe. É como se o filme dialogasse com ela: olha só, as coisas estão acontecendo e você está parada, quando vai agir? No final, a música explica, dizendo “eu fiz o que tinha que fazer”. Jackie cantarola a letra timidamente, com tristeza nos olhos. Sua tristeza é o enigma do filme. Por que ela está triste? Por não ter ninguém? Por não ficar com o único cara que a trata bem? Por imaginar que quatrocentos mil dólares não a levarão tão longe?E eu detesto rir disso, mas a morte da “gatinha de praia”, a Melanie, é divertidíssima. Não seria se a gente a visse sendo atingida pelo Louis, ou mesmo se víssemos o corpo dela estirado depois. Mas não vemos. Quer dizer, em Pulp Fiction vemos o John Travolta atirando sem querer no crânio do pobre estudante dentro do carro. Vemos seu crânio explodindo, os pedacinhos voando pra todo canto. E é hilário, pelo absurdo da situação. Muita gente critica o Taranta por essa cena - não deveria ser nada engraçado fazer rir de um branco atirando num negro. Ou um negro ser tão descartável. Mas ele não é mesmo um personagem importante. Importantes mesmo são o John e o Samuel L. Jackson, e o relacionamento entre eles. É quase um caso de amor. O John até pergunta, brincando, pro Samuel, “Você pode me dar uma massagem nos pés?”. Então, nessa cena do carro, rimos do acidente, da bronca que o Samuel dá no John, do John ficando revoltadinho com a bronca (como se fosse um casal birrento de longa data). No fundo, não estamos rindo do pobre rapaz assassinado. Mas também é verdade que não ligamos a mínima pra ele.Em Jackie, a gente liga pra Melanie. Ela é uma personagem petulante, cheia de vida, encantadora até, do seu jeito. Está quase sempre dopada. Adora fazer sexo (ouvimos isso mais do que vemos). E tem certeza absoluta que todos os homens ao seu redor são estúpidos. É hilário Louis não saber onde fica a saída do shopping, ou onde ele estacionou o carro, e a Melanie gozando dele a todo momento: “Tem certeza que você já assaltou um banco?”. Porque, pô, tá cheio de policiais no lugar, e como o burraldo não sabe onde está o carro? A gente sabe que ele está indignado com a situação, e já vem sendo violento com a Melanie desde antes de chegarem ao shopping. Mas a gente não tem a menor ideia que ele vai sacar uma arma e atirar nela! E essa surpresa é engraçada, inclusive porque ilustra e exagera o fato que homens não sabem lidar com adversidades, e são agressivos ao serem contrariados. Mais tarde Ordell, chateado por ter perdido seu objeto de maior valor, Melanie, reclama com Louis: “Você não podia apenas ter dado um murro na boca dela?”. Que é o modo que Ordell está acostumado a lidar com suas mulheres. Não que isso funcione para domá-las.
Por outro lado, o filme não é apenas feminista. Há todo um subtexto com outra opressão. O personagem do Samuel L. Jackson sabe muito bem em que mundo vive. Ele diz que a principal razão por estar com Melanie é que ela é branca, a sua gatinha da Califórnia. “Ter” uma loira (elas são vistas como objetos) é inacessível a negros pobres, e um símbolo de status para negros ricos, do chefão em Pulp Fiction (que tem a Uma Thurman) aos jogadores de futebol. Quando Ordell vai ao escritório de Robert, vê uma foto na parede dele com um negro que parece um armário. “Quem é ele?”, Ordell pergunta. Robert responde que é o sujeito que trabalha com ele. Mas Ordell insiste: “Ele é seu empregado e você é o chefe, é isso? Aposto como foi ideia sua tirar essa foto”. Robert fica calado, ansioso pra mudar de assunto.Tem também o lado de personagens que não conseguem deixar seus papéis. O funcionário de Robert repete “é o meu trabalho” em vários momentos. Mas o próprio Robert permanece imóvel. Quando Jackie lhe pergunta por que ele não fica com mais dinheiro, além dos 10%, ele insiste: “É a taxa que cobro”. Seu desespero é não ir atrás de Jackie. Bem antes, ele reconhece sua vaidade. Explica pra Jackie que, ao ficar mais velho, perdeu cabelo, e fez algo a respeito (não sabemos o quê). Ele também sabe quanto engordou desde que parou de fumar. Ele fala a sua idade (56 anos), fala de aposentadoria, de como está cansado. É provável que eles nunca mais se vejam. Ela vai pra Espanha e lhe mandará um cartão postal. No final, é só isso que vemos, e que precisamos ver: o rosto desolado de Robert, sabendo que perdeu sua última chance, e o rosto misterioso, talvez arrependido, talvez aliviado, de Jackie, pronta pra começar uma nova vida. Sozinha, como sempre. Porque ela já cansou de ser explorada pelos homens.




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