CONTRA O ÓBVIO
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CONTRA O ÓBVIO


Eu já disse algumas vezes: escrevo pra quem gosta de mim, pra quem gosta do que escrevo, pra quem me lê. São nessas pessoas que penso quando crio um post. São pra elas que faço o blog. Não pra quem me odeia. Quem me odeia é fiel, vai me odiar sempre, independente do que eu disser ou deixar de dizer. As pessoas que gostam de mim podem eventualmente se cansar de ler posts tão longos, podem querer migrar pra outros blogs, podem achar que estou repetitiva; enfim, podem abandonar o blog por uma série de motivos (e acho que isso acontece sempre, e não só com blogs). Mas quem me odeia não vai desistir de mim nunquinha.
Aceito numa boa sugestões de leitor@s querid@s. Se tenho tempo e interesse, escrevo sobre aquele assunto que me pedem pra escrever. Pra mim isso não é querer pautar meu blog, é sugerir. E é maravilhoso e faz parte da comunicação. E @s leitor@s daqui são super antenad@s e vêem mil e uma coisas que eu não vejo. Se eu não escrever sobre determinado assunto que foi sugerido, el@s não ficarão de mal. Não ficarão cobrando. Certamente não pensarão que só porque não escrevi sobre uma atrocidade em particular quer dizer que eu concorde com ela.
Quem quer pautar o blog são as pessoas que me odeiam. Pra elas, eu tenho obrigação de falar sobre tudo que elas acham que eu tenho que falar. Mas se eu não escrevo pensando nessas pessoas, por que devo seguir suas ordens?
Tenho um hate club especializado em interpretar meus silêncios. Por exemplo, nunca escrevi sobre a condição das mulheres no Irã (tirando, talvez, quando falei de Persépolis. Isso conta?). Pra esse pessoal, só as mulheres iranianas são vítimas do machismo. Aqui no Brasil as mulheres são totalmente livres e têm todos os direitos assegurados, dizem eles. Em outras palavras, não há motivo algum pra ser feminista aqui. Mas no Irã sim. Lá elas precisam de mim, porque, óbvio, o Irã não tem suas próprias feministas (estou sendo irônica). Pô, até parece que tenho algum apreço por um governo, uma religião, um sistema, que relega as mulheres a segundo plano. Mas a verdade é que prefiro escrever sobre situações mais próximas a minha realidade. Não gosto absolutamente nada do Ahmadinejad, mas entendo que, pro governo brasileiro, tentar dialogar com ele é melhor que simplesmente tê-lo como inimigo número 1, impedindo qualquer possibilidade de comunicação. Isso me parece tão óbvio. Mas pro pessoal de direita (sim, porque não adianta negar, eu tenho dois hate clubs principais: gente de direita que me odeia por eu ser de esquerda, e gente preconceituosa que me odeia por eu ser feminista, anti-racismo, anti-homofobia etc. Muitas vezes o hater tem carteirinha dos dois clubes), o governo dialogar com o Irã é um sinal inequívoco que apoia as barbáries que o Irã comete contra as mulheres e gays (esse pessoal de direita não liga muito pras barbáries que mulheres e gays brasileiros sofrem). E eu não falar sobre isso é sinal inequívoco de que sou totalmente a favor do apedrejamento de iranianas. Estranho um pouquinho que o pessoal nunca me cobre pra falar das mulheres na Arábia Saudita e em outros países aliados dos EUA, como se a situação delas fosse um mar de rosas.
Acho também que essas pessoas ou usam de má fé ou são um tanto tolinhas. E não são só elas. Falta um pouco de interpretação de texto. De fazer conexões. Tipo: anteontem no Twitter recomendei uma excelente compilação de capas da Veja, e escrevi “Pra quem acha que a Veja é neutra e imparcial”. Recebi vários tweets de gente dizendo que as outras revistas, principalmente as de esquerda, tampouco são imparciais. Isso é óbvio. Não existe neutralidade. Mas eu disse que só a Veja era parcial? Acho que não. Acontece que, ao contrário das revistas à esquerda, que em época de eleição sempre declaram abertamente o seu voto (isso é ser transparente), Veja, Globo, Folha e afins posam de imparciais e apartidárias. E se tem uma coisa que leitor da Veja acredita é que sua revista-bíblia é totalmente neutra. Duvido muito que leitor de Carta Capital ou Caros Amigos tenha essa falsa impressão das revistas que lê.
Tem outra coisa também, que talvez não seja tão perceptível pra quem me lê. É que eu prefiro não escrever coisas óbvias. Por exemplo, agora o pessoal que me odeia cobra que eu fale de um caso escabroso de um dirigente do PT em Minas que estuprou sua enteada de 9 anos. O cara (que eu nunca tinha ouvido falar -- não sou filiada ao PT, não sou de Minas) participou da organização dos Blogueiros Progressistas, mesmo após ter sido condenado. Isso é horrível, não deveria ter acontecido, o criminoso já deveria ter sido expulso do PT faz tempo, e quem o blindou também. Mas também é bem horrível sugerir que os outros participantes do BlogProg MG ou do PT apoia(ra)m o estuprador. Eu e um monte de gente só ficamos sabendo do caso esta semana. Aí o pessoal fala: ah, mas e se fosse um dirigente do PSDB/DEM que tivesse estuprado uma criança? Aí choveriam posts contra o meliante, certo? Errado. Qual o meu interesse em escrever sobre o óbvio? Por que eu gastaria meu tempo escrevendo um post dizendo que o estupro é um crime hediondo que não deveria ser acobertado e que o estuprador deve ser punido? Todo mundo no meu blog pensa assim. Chover no molhado, pra mim, é chato. Eu faço o possível pra fugir do óbvio.
Outro exemplo: por mais que eu tenha me indignado com o caso do ex-marido que torturou e escreveu seu nome com uma faca quente nas costas da mulher, o que vou escrev
er sobre isso? Eu divulgo essa notícia no Twitter, mas não tenho muito mais que falar sobre ela. Eu a guardo pra que, talvez, quando eu escrever sobre misoginia e machismo, usá-la como exemplo. Mas só redigir uma nota pra mostrar minha revolta me parece redundante. 
Não é só isso. É que meus posts quase sempre são sobre reações a um ato, muito mais que sobre o ato em si. O que significa que eu raramente escrevo sobre um indivíduo, e sim sobre grupos, sistemas, ideias. Não é difícil de conferir. Quando Lindemberg matou Eloá, sua namorada de 15 anos, eu escrevi mais sobre a reação a isso, ou seja, sobre um programa de TV que disse que Eloá deveria casar com o carinha que bateu nela, a ameaçou, a encarcerou, e finalmente a matou. Quando três jovens estupraram e filmaram com seus celulares (e depois colocaram na internet) o crime contra uma garota em Joaçaba, meu foco não foi no óbvio (que tais atos são horríveis), mas na reação a esse ato ― sobre as hordas de carinhas que vasculhavam a internet em busca do vídeo com o estupro.
Alguns posts meu
s são mais informativos, narrando (e sempre comentando) um fato que acredito que não seja muito conhecido de quem me lê. Outros posts, como sobre a piada de Rafinha Bastos a respeito de estupro, ou a ridicularização do CQC à amamentação em público, eu faço para explicar algumas coisas que podem não estar claras pra muita gente (por que aquela piada é machista? Por que uma piada não é só uma piada? Por que ridicularizar a amamentação em público equivale a condenar a amamentação, ponto? Por que lutar a favor da amamentação em público é um tema feminista?). Escrever um post só pra condenar Rafinha ou CQC é fácil: bastaria colocar uma foto deles e uma legenda espirituosa, pronto. É, inclusive, o que meus haters fazem comigo (tirando a legenda espirituosa, a menos que você considere que chamar alguém de feminazi baranga gorda mal-comida tenha algo de espirituoso).
Mais uma coisinha a meu respeito. Eu não gosto de linchamentos. Sou contra a pena de morte. O que isso quer dizer? Que eu perdoo. Que eu acho que quem comete um crime tem que ser castigado pelo seu crime, mas eu, na minha enorme e quiçá ingênua esperança no ser humano, também creio em reabilitação. Acho que as pessoas podem mudar. Aliás, acho que têm que mudar. Então já fiz post perguntando por quanto tempo deve-se detestar, ou boicotar, um ator (tipo o Sean Penn) que bateu na mulher (tipo a Madonna). Pra sempre? Por alguns anos? Fiz a mesma pergunta referente ao Netinho, candidato derrotado a senador. Ele foi um monstro e espancou a mulher. Mas aparentemente se arrependeu e apresentou projetos em favor das mulheres. Devo sempre odiá-lo por ele ter batido na mulher? Mas isso não seria uma uma condenação perpétua? E se eu acredito na reabilitação? Não posso?
No que deve ser meu posicionamento mais polêmico até agora (ou ao menos um dos que meus haters mais citam), eu disse que o diretor de cinema Roman Polanski já havia cumprido sua pena pelo estupro de uma menina de 13 anos, que o crime tinha mais de trinta anos, e que havia muitos erros no processo, como demonstrado pelo excelente documentário Roman Polanski: Wanted and Desired (alguém viu? Sigo recomendando). Eu não fui a única a pensar assim ― mais de cem pessoas do cinema têm a mesma opinião. Inclusive, a justiça suíça negou a extradição de Polanski aos EUA por causa dos inúmeros erros no processo. Mas, dois anos depois, os haters continuam dizendo que eu defendo estuprador de meninas. Esses haters nunca falariam do Polanski se não fosse pra me atacar! Até parece que eles ligam pra vítima...
Não é muito diferente da atitude de meia dúzia de haters à esquerda, que me odeiam não sei por que cargas d'água. Na polêmica mais recente, fui bastante agredida verbalmente porque cometi o crime inafiançável de enviar um email a uma deputada homofóbica que disse mais ou menos isso pelo Twitter: “Eu também quero denunciar aquele blog que te ameaçou de morte e me xingou. Me mande os links pra eu encaminhá-los às autoridades competentes”. De repente, todos os posts que escrevi contra a homofobia foram apagados porque eu fiz aliança (você não sabia? Mandar um email é fazer aliança) com uma pessoa indesejável.
E por aí vai. E la nave va. Mas eu sigo escrevendo, quase sempre com muito prazer e vontade, pensando nas pessoas que gostam de mim e do blog. As que não gostam vão continuar usando cada vírgula escrita e não escrita por mim pra tentar me desabonar. E vão falhar. Porque quem conhece meu blog sabe perfeitamente bem o que defendo.




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