“Cartada” é praticamente um manual passo a passo do crime. Fala de um ladrão profissional altamente competente que possui uma boate em Montreal e quer deixar de ser bandido. Pretende casar e levar uma vidinha normal. Porém, antes disso entra num roubo arriscado a uma aduana canadense. Será sua derradeira falcatrua. Eles sempre prometem isso, né? Todo mundo que ele conhece o manda cair fora desta, mas, por seis milhões de dólares, ele é capaz até de suportar seu novo parceiro, um carinha que se passa por deficiente para espionar a aduana. Quem junta os dois é um velho gordo e endividado, que vive encomendando mercadorias pro larápio furtar.
Meu Deus! Nunca contei tanto da história de um filme. Viu como estou entusiasmada? Mais ou menos resumi a trama inteira. Não há mais do que isso. Não há surpresinhas mirabolantes ou dezenas de personagens incompreensíveis, daqueles que só servem pra complicar o enredo e fazer parecer que, uau, o roteirista realmente pôs a cabeça pra funcionar desta vez. O script de “Cartada” é simples e eficiente. Vai direto ao ponto, não enche o estofo de lições de moral, e é deliciosamente didático.
Eu fiquei na beira da cadeira o tempo todo. Pergunte pro maridão, que está com o braço roxo. Não sei por que torci pros bandidões. Talvez fosse por causa dos atores. Acho que torceria por eles mesmo se interpretassem a minha sogra. Imagina se os filmes, daqui pra frente, fossem estrelados por astros top de linha, como estes. O que seria da carreira do Ryan Phillipe, só pra ficar num nome? “Cartada” reúne os melhores atores de suas gerações, como Robert de Niro e Edward Norton, e, só de lambuja, o Marlon Brando. Os três estão brilhantes. Bom, o maridão me explicou, com veneno escorrendo da boca, que o Marlon está tão obeso que não há nenhuma cena dele subindo uma escada, por exemplo. Ou que o De Niro usa máscara durante suas aventuras porque assim a gente não enxerga o dublê. Tudo calúnia daquele invejoso, claro. Desconfio que ele seja um ladrão frustrado.
Aliás, uma das coisas que eu mais amo nas produções com o De Niro é que só nelas temos a chance de ver relacionamentos inter-raciais, um dos grandes tabus hollywoodianos. A bela Angela Basset, o par romântico dele nesta ocasião, não tem muito o que fazer. É a mulher do filme. Já no trailer, onde ela aparece por um milésimo de segundo, dá pra reparar que seu papel é insignificante. Mas, pra defender a falta feminina em “Cartada”, vou citar o Tarantino quando criticaram o incriticável “Cães de Aluguel” – “Pô, é a história de um roubo. Você não leva a namorada pra um assalto”.
Ah, e não adianta inventar que a gracinha do Edward Norton tá imitando o Kevin Spacey em “Os Suspeitos”. Nada a ver. Ele tá é a cara do Daniel Day-Lewis em “Meu Pé Esquerdo”, só que com um penteado melhor.