Preciso resumir a história? Tudo se passa em 2035. Eu nem sabia que a gente ainda teria água daqui a três décadas, muito menos robôs. Mas o Will, que os odeia por causa de um mistério que será revelado (não aqui), tem que cuidar de um caso em que um deles pode ter infringido uma das leis principais da robótica, que é não machucar humanos. Ele contará com a ajuda de uma psicóloga de robôs (Bridget Moynahan, de “O Novato”), mas como ela é branca e o Will é negro, não rolará nem estalinho. Há leis em Hollywood que são muito mais rígidas que as da robótica.
O assunto desperta reflexões, não o filme. Por exemplo, eu gostaria de ter um robô daqueles? Olha, parece que hoje mesmo os japoneses já vendem cachorros-robôs pela bagatela de US$ 5 mil. Eles são tão reais que até latem e fazem xixi! Alguém em sã consciência trocaria o seu cão felpudo e fofinho por uma geringonça de metal? Duvido. Ah, dirá você, mas os robôs de “Eu, Bobo” são úteis. Podem até ser. Confesso que gostaria de ter alguém que picasse legumes com aquela velocidade, mas sou do tipo que prefere menos tecnologia pra, sabe, as pessoas poderem ter algum trabalho. Aliás, trabalho não, salário. Se a gente vivesse num mundo em que ninguém precisasse de dinheiro pra viver, e o trabalho fosse apenas um hobby, eu não teria nada contra robôs. Mas acho que nossa realidade não é bem assim, né? Vivemos no capitalismo. Sei que cobradores de ônibus e bancários são inúteis. Mas prefiro ter pessoas numa profissão descartável a uma legião de desempregados, você não? De qualquer forma, o melhor diálogo do filme se dá entre o Will e um robô mais sensível. O Will, defendendo a espécie humana, dispara: “Você não sabe compor uma sinfonia nem pintar uma obra-prima”. E o robô responde: “E você, sabe?”.
No entanto, a verdadeira luta de “Eu, Bobo” não é entre humanos e robôs. É entre All Star e Audi, pra ver quem faz mais merchandising. Quando eles mencionaram o par de tênis pela quarta vez, eu comecei a calcular quanto custa cada inserção e concluí que o filme dispensa uma grande bilheteria pra se pagar. Se bem que o Audi do Will tenta matá-lo. Nessa hora eu não me lembrei nem de “Blade Runner”, nem de “Matrix”, nem de “Metrópolis”, nem de qualquer outro clássico da ficção científica. O que me veio à mente foi aquela bomba do Stephen King, “Comboio do Terror”, em que todas as máquinas tratam de eliminar as pessoas. O maridão me tranqüilizou dizendo que, se algum dia isso acontecer, temos o Exterminador do Futuro pra nos proteger. O maridão também tentou me explicar o final do filme, que é bem aberto: “Os robôs talvez andem por aí sem rumo até fundar um país”. E eu: “Os robôs vão virar judeus?”.
A boa notícia é que se você, como eu, ainda não aprendeu a fazer baliza, em 2035 você talvez nem precise mais. Mas como nem tudo é perfeito, a tecnologia avançada produz um espectro computadorizado que diz “Esta é a pergunta certa” e em seguida se auto-desliga sem respondê-la, uma homenagem ao Windows, imagino. E alta tecnologia ou não, ninguém me convence que o maior efeito especial do filme não foi um envolvendo um gato molhado a ficar no ombro do Will. Gato não se deixa pegar por estranhos nem que a casa esteja desabando. Depois o gato é largado no Departamento de Animais Esquecidos do Cinema. E a gente não precisava conhecer a vovó do Smith, precisava?
No fundo, todos esses filmes são muito esquizos. Ao mesmo tempo em que eles nos fazem vibrar com a evolução da tecnologia, eles também nos fazem olhar pro nosso liquidificador com uma certa desconfiança. E quem precisa de mais problemas? É como um diálogo que tive com o maridão já faz um tempo. Eu: “Você gostaria de ter uma geladeira duplex que filtra água e pica gelo na porta?”. E ele: “Acho que já temos transtornos demais nesta casa”.