CRÍTICA: FIM DOS TEMPOS / Casal discute relação durante o fim do mundo
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CRÍTICA: FIM DOS TEMPOS / Casal discute relação durante o fim do mundo


Shyamalan pros extras: Todo mundo seguindo o estilo Mark Wahlberg de atuar! Agora!

Fui ver Fim dos Tempos (The Happening), que estréia hoje em todo o mundo, numa sessão pra críticos em Detroit, e levei o maridão a tiracolo. Acredita que não o deixaram entrar? Nem comigo insistindo muito e garantindo que a múmia (ele) não entenderia nada do filme mesmo. Não quiseram nem saber: press only, só pra imprensa, apesar da sala vazia. Esse tipo de sigilo absoluto eu não vi nem em Indy 4. Injusto. O que aquele mentecapto ia poder contar pra alguém? Aliás, o que mesmo uma grande sábia como eu posso contar nessa crônica? Êta filminho difícil de criticar. Qualquer coisa é um spoiler. Portanto, cuidado com as críticas que você ler antes de ver o filme. Quer dizer, pode ler este texto sem medo que você não vai encontrar nada de relevante aqui. Prometo não desvendar lhufas. Mas tente ir virgem ao cinema. E não perca os primeiros minutos, que estão sem dúvida entre os melhores.

Tudo que você precisa saber tá no título do filme. Eu já cri-critiquei o trailer e, se posso dizer uma coisa, é que me enganei ao falar mal daquela cena dos hominhos voando. Não era o que eu tava pensando. Bom, o Mark Wahlberg faz um professor de ciências, o que já é preocupante. Imaginar o Mark como professor de qualquer coisa é uma árdua tarefa. Mas ele fala com a classe sobre crescimento de nariz e de como as abelhas estão sumindo (não preciso apontar qual assunto desperta a atenção dos alunos). Parece que Einstein disse que, depois que isso acontecesse (as abelhas sumirem, não o nariz crescer) a humanidade teria apenas mais quatro anos de vida. E Einstein, ao contrário do Mark, é um gênio, certo? Pausa pra um dado real que li: sabe quanto por cento dos professores de ciências nas escolas americanas têm curso de ciências que não seja o regular do ensino médio? 15%. É sério. Os outros 85% lecionam ciências com a bagagem que tiveram no high school. Imagina ensinar inglês com o curso que você teve na escola. É similar. Junte esse dado alarmante à teoria da evolução ter sido banida de boa parte dos estados americanos e... e a gente não precisa esperar pelo fim do mundo pra be afraid, be very afraid.

Outro ponto bastante assustador do filme é que o personagem do Mark tá em crise conjugal com a esposa. A mulher recebe telefonemas de um carinha, e a gente pensa que ela traiu o marido com esse sujeito. Lá pelas tantas ela confessa que comeu sobremesa com ele, e que tá se matando de culpa. Comentei isso com o maridão, e ele quis saber: “Qual sobremesa?”. De fato, tem uns chocolates por aí que podem significar muito mais que um adultério. Depois o Mark diz que comprou pastilhas pra tosse com uma farmacêutica atraente, e ele nem tava com tosse. Hello? O mundo na reta final e o casal brinca de provocar ciuminho um no outro? Deixa eu repetir: o mundo tá acabando. Essa não é a hora propícia pro casalzinho ficar discutindo relação.

Outra coisa que me incomodou, e que é comum no cinema-catástrofe, é que o foco mantém-se sempre na família nuclear (que, apesar do que pensa o maridão, não tem a ver com hecatombe). Ou seja, no casal e filhinhos. Como muitas vezes o casal é jovem e ainda não teve tempo de cumprir sua missão de povoar a Terra, e como não dá pra esperar nove meses, porque de repente o planeta acaba antes, é frequente o casal ser brindando com um rebento, no melhor estilo “toma que o filho é teu”. É o que acontece em Fim. Se bem que, mesmo com a presença infantil obrigatória, um adolescente cobra o Mark por ele e a esposa não terem filhos. É o fim mesmo. Vai cuidar da tua vida, rapá! A presença da menininha é um problemão pro filme e elimina o suspense, já que é raríssimo criancinha sofrer arranhão em produção hollywoodiana. É como se existisse um seguro-criança. Então, se alguém acompanhar a menina, tá com Deus (ainda assim, temi pela vida da garotinha no momento das declarações de amor eterno do casal. Temi que isso pudesse induzi-la ao suicídio). E existe o seguro-astro também. Eu não sou uma completa otária. Sei que não pagaram a maior grana pro Mark pra ele morrer rapidinho (por isso que o excelente O Nevoeiro foge das convenções de tantos jeitos. Mas sorry, periferia, esse você não vai ver no cinema).

Quem faz a mulher do Mark é a Zooey Deschanel (Assassinato de Jesse James). Não conheço direito a atriz, que é bonita, mas estranha pacas. Faz caretas e tem reações bizarras, que não correspondem à trama. Na hora pensei: quem é essa amadora? Mas depois entendi a intenção do M. Night Shyamalan em escalá-la. É que há várias cenas com ela em que não acontece nada. Por exemplo, é só ela, um celular tocando, e suas caretas. O seu jeito esquizo de ser proporciona suspense. Será que ela bate bem? Será que ela já foi afetada por não-vou-dizer-o-quê-tá-afetando-a-população? E a parte que me toca: a mulherada ainda vai ter que usar batom quando chegar o apocalipse? Ai, já imagino a resposta: “é importante não perder a vaidade nunca”. Porém, pra ser justa com a Zooey (que raio de nome é esse? Zoei de Chanel?), o John Leguizamo, que faz o melhor amigo do Mark, também tá esquisito. Não há um só close do rosto dele que pareça natural. Apenas o Mark tá normal como sempre, com sua uma só expressão. Neste caso, a de preocupado. Não entendo bem a carreira do Mark, começando por quando ele era modelo de cueca da Calvin Klein. Gente, o Mark é lindo em qual universo alternativo? Porque no meu não é. Ele tem o torso compridão, pernas curtas, rosto comum. Como ator, ele fez algo de bom fora Infiltrados e Boogie Nights? Lamento dizer que, em Fim, seu momento iluminado é quando ele conversa com uma planta de plástico. Porque aí não tem ninguém pra roubar-lhe a cena (se bem que a planta passa mais emoção).

Talvez o que Fim tenha de mais refrescante (e, pensando bem, de inacreditável) é que o apocalipse chega e ninguém menciona Deus ou religião. Mesmo que o filme se passe no nordeste dos EUA, e não em Utah, ainda assim deveria estar cheio de fanático religioso. Tampouco está bem explorado o trauma pós-11 de setembro. Imagina que morre um monte de gente no Central Park, em NY. Iria gerar muito pânico e suspeita em todas as partes dos EUA. Cadê a paranóia? Pessoalmente, adoro história de epidemia e de catástrofe. Uma das coisas mais legais é o nosso lado consumista que vem à tona. Ah, o mundo acabou? Então dá pra entrar em qualquer estabelecimento comercial e pegar qualquer mercadoria? Eu acreditava que dava, até que veio o Katrina e li que seguranças preferiram atirar em possíveis saqueadores morrendo de fome e sede a deixá-los invadir a loja. Mas Fim não tem nada disso, até porque o período retratado é curto. No entanto, um adolescente tenta arrombar uma casa aparentemente abandonada e Mark o reprime: “O que somos agora, criminosos?”. Isso, o fim da civilização veio com tudo mas vamos continuar defendendo a propriedade privada.

Fim até tem um bom clima, o que para um filme de terror é tudo. Algumas imagens são bem aterrorizantes. O Shyamalan compreende que portas rangendo e sendo arrombadas habitam meus pesadelos. Mas o gosto que fica no final é que a gente já provou isso antes. Pra ser honesta, não pensei em Guerra dos Mundos ou nos Pássaros nenhuma vez durante a sessão. Pensei em Invasores de Corpos e no Dia Depois de Amanhã, isso sim. Ficando só na obra do Shya, Fim é melhor que Sinais e muito provavelmente, pelo que dizem, que Dama n'Água. E é pior que Sexto Sentido, Corpo Fechado e A Vila. Mas, depois de ver o filme, pense a respeito e me responda: como que uns manés se enforcam? E por que uma velhinha que não sabe o que está havendo convidaria estranhos de quem ela suspeita pra comer e dormir em sua casa? Isso nem o maridão faria.Categoria melhor ator: entre eu e uma samambaia, quem será que ganha? Mais sobre o filme aqui.





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