Brincadeirinha. Estou tentada a contar montes de piadinhas sobre psicanalistas pra afastar o tom amargo do filme. Mas não o farei. Infelizmente, terei de narrar um pouquinho da história. Posso até estragar algumas surpresas pra você. Prepare-se: o diretor, roteirista e produtor Nanni Moretti (“A Missa Acabou”, “Caro Diário”) interpreta um analista tranquilex numa cidadezinha litorânea. Seu consultório fica nos fundos de sua casa. Seus pacientes são meio neuróticos, mas sua família se dá bem. Quer dizer, ele tem preocupações com o filho adolescente, que roubou um fóssil (é na Europa, lembre-se) da escola e não tem espírito competitivo. Vamos acompanhando sua vidinha até que... seu filho morre num acidente. Por favor, seja sincero – mencionar que o filho morre é revelar a trama? No momento em que você lê um título como “O Quarto do Filho”, você já não sabe que o garoto vai falecer? É que tem crítico cheio de dedos por aí temendo desvendar reviravoltas da trama, como se o espectador/leitor fosse supor que um filme com este nome trataria do quarto do rapaz como lugar pra orgias.
Parecido com o que os críticos fizeram com “Entre Quatro Paredes”. Inclusive, é inevitável vincular os dois filmes, lançados mais ou menos na mesma época, ambos aclamados. Realmente, ambos são bons e não trazem vestígios de melodrama ao retratar a morte de jovens e a reação dos pais em vilas costeiras. Admito que gostei mais de “Paredes” (que também leva “quarto” em seu título original; tá vendo, é um sintoma!), apesar de seu final a la “Desejo de Matar” (agora sim contei o filme). “Filho” é mais sereno, mais otimista. No fundo, os dois me fazem lembrar o que minha crítica favorita, Libby Gelman-Waxner, disse sobre assistir a filmes que falam de gente comum lidando com problemas existenciais. Ela acha ótimo e compreende que tais películas a tornam um ser humano melhor, mas será que essas pessoas não poderiam resolver suas crises interiores enquanto explodem a cabeça de um alienígena? Liga não, a Libby é americana.
Interessante que “Filho” tenha um psicanalista como personagem central. No início, ele até acha graça de seus pacientes, que reclamam que ele não os cura, e que só se sentem melhor ao sair do consultório e comprar roupas na lojinha ao lado. Empreiteiros da moda que não sabem onde abrir suas lojas, pensem na dica. Quando o filho morre, o analista vira um exemplo do “faça o que eu digo, não faça o que eu faço”. E é normal identificar-se com seu drama: se já era difícil concentrar-se nas divagações de seus pacientes antes da tragédia familiar, depois fica impossível.
O filme tem cenas comoventes e eu, pra variar, chorei feito um bebê. Parece que não faço outra coisa nas minhas últimas experiências cinematográficas. Sua reação deve ser a mesma ao ler estas linhas, né? Numa seqüência, o pai vai buscar a filha durante um jogo de basquete e a moça, ao vê-lo com aquele rosto sofrido, automaticamente entende que um infortúnio ocorreu. É um belo momento.