CRÍTICA: POSEIDON / Sigam-me! Sou crítica de cinema!
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CRÍTICA: POSEIDON / Sigam-me! Sou crítica de cinema!


Talvez você não acredite, mas gostei de “Poseidon”. Este remake não é de embrulhar o estômago. Pelo menos não tentam refazer o original quadro a quadro, como o inútil “A Profecia”. “Pô” é tão diferente do original que rapidamente a gente esquece de compará-los e curte o programa. Poseidon, pra quem não sabe, é o primo pobre do Titanic, sobre uma onda que vira um transatlântico em pleno reveillon e mata quase todo mundo dentro. Se bem que preciso falar do filme de 72. Lembro no original de uma gigantesca árvore de Natal e do pessoal subindo por ela pra chegar a um outro pavilhão. Da música que ganhou o Oscar. Do Gene Hackman com um penteado esquisito. Da Shelley Winters obesa como campeã de natação. De um menininho chato e sua irmã vinte anos mais velha. E do mais legal, de um grupo de sobreviventes indo numa direção, outro grupo indo na outra, e alguns pobres coitados no meio tendo que decidir quem vão seguir pra se salvar. Em compensação, não lembro de nenhuma onda virando o barcão, e olha que já devo ter visto o troço mais de cinco vezes. Não era uma obra-prima, longe disso, mas era bonitinho.

Na refilmagem, em menos de meia hora já fomos apresentados aos personagens e a onda vem pra afogá-los. Isso é bom porque, vamos ser francos, a gente não dá a mínima pro passado desse pessoal. Quem quer saber por que um garoto não tem pai? A gente quer mais é que um fio solto eletrocute alguns figurantes. O filme entende nossas aspirações, e é curtinho. Afinal, são as situações, não os personagens, que nos envolvem. Tipo: o que eu faria se estivesse caindo e um sujeito se pendurasse na minha perna e um elevador ameaçasse despencar em cima da gente? Em quantos segundos eu despacharia o carinha pro fundo do poço? Sabe, situações possíveis de acontecer e cheias de solidariedade humana como esta.

Agora, ou eu perdi alguma coisa enquanto fantasiava em como um dilúvio invadiria a sessão de cinema e afogaria os espectadores tagarelas ou não entendi bem por que o Josh Lucas (de “Ameaça Invisível”) é escolhido pra comandar um grupelho de sobreviventes. Quero dizer, se alguém gritasse “Sigam-me! Sou um bombeiro”, eu até consideraria. Mas por que “Sou um jogador de pôquer” qualificaria alguém a escalar um navio de cabeça pra baixo? Além do Josh tem o Kurt Russell como o segundo grande herói branco, Richard Dreyfuss como o solitário suicida que precisa que seu navio afunde liquidando cinco mil passageiros para descobrir o valor da vida (e que felizmente não grita pros colegas, “Sigam-me! Sou um suicida!”), e o Kevin Dillon (que é a cara do seu irmão Matt) como um insuportável cujas últimas palavras são “Sou um cara sortudo” (desculpa contar, mas não precisa ser bidu pra sacar). A direção é do Wolfgang Petersen, dos ótimos “O Barco” e “Na Linha do Fogo”, do mediano “Tróia”, e do pra-afundar-o-currículo-de-qualquer-um “Mar em Fúria”.

O maior acerto do filme, fora o ritmo, é o começo, nos créditos, quando o transatlântico é filmado ininterruptamente. Dá a impressão que eles montaram um navio de verdade pra poder afundá-lo, como se espera do cinema catástrofe. Mas foi gerado por computador. Há probleminhas, como um sujeito numa cena com um corte horrendo na perna. Na próxima cena ele já tá saltitante correndo de um lado pro outro do navio, num dos casos de cura mais rápidos da história. O corte nunca mais aparece. Daí chega uma hora em que o machão salvador tem que jogar coisas numa hélice. E eu quase gritei, “Joga o menino!”. Olha, não é nada contra criança, mas criança em produção hollywoodiana é terrível. Primeiro que a gente sabe que nada vai acontecer com elas. E depois que elas já nascem mini-gênios. Aqui o guri, antes de não ser jogado na hélice, adverte sua progenitora, “Mamãe, cuidado!”, o que fez a espectadora do meu lado suspirar, “Ai, que lindo!”.

Mas o maior problema de “Poseidon” é que ele é claramente machista. Os homens comandam toda a ação e até o menininho tem mais utilidade pública que as mulheres, que só estão lá pra serem salvas pelos heróis. No início uma jovem enfrenta seu pai por causa do “tom paternalista”. Mas o filme vai se empenhar em provar que o pai é que tinha razão, e a moça só vai passar do comando dele pro comando de seu futuro marido. Sem falar que os homens têm profissões. Um é jogador profissional, o outro é bombeiro e ex-prefeito, arquiteto, garçom, sei lá. As mulheres são mães, namoradas e filhas. Bom, pelo menos o filme não promove concurso de qual mulher fica melhor de vestido molhado. Mas se bobear a produção de 72 oferecia mais chances de heroísmo às mulheres que esta de 2006. Décadas de revolução sexual e os papéis permanecem imutáveis.

Noutra cena, a meia dúzia de sobreviventes precisa passar por um encanamento estreitíssimo. Acho que essa seqüência é uma referência a como a Shelley Winters não passaria. Juro que tava aguardando pra ver quem seria a sobrevivente gorda na refilmagem. Mas não tem. Desta vez todas as mulheres são iguais: brancas, jovens, e magras. Sério. Até as cadáveres. Este meu pensamento macabro durou pouco porque, ao sair, fiquei pensando no que aconteceria comigo e com o maridão caso um tsunami virasse o shopping de cabeça pra baixo. Se a gente já se perde em lugar seco e linear...





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