Bom, quem leu o parágrafo acima e pensou “Reagan? Quem?” tampouco deve saber que este filme é um remake de um terror de três décadas atrás. O original não é uma obra-prima nem que a vaca tussa. É bonzinho até a metade. Depois, quando o pai do coisa-ruim passa a ouvir padres malucos recitar poeminhas e viaja até Roma e Israel pra conhecer mais doidos (e pra descobrir o que qualquer espectador inteligente já sabe faz uma hora), o troço cai muito e fica chacal, quero dizer, sacal. Mas fez enorme sucesso, gerou três seqüências, e agora este remake desnecessário. Tanto o velhinho quanto o novo poderiam ser mais interessantes se fossem mais ambíguos, mais pro jeitão do magnífico “Bebê de Rosemary”, em que existe a chance de não haver diabo coisa nenhuma, e d’a protagonista estar alucinando tudo aquilo. Aí a gente ficaria com o declínio de um homem poderoso planejando matar uma criancinha. Mas não é assim. “Profecia” deixa claro desde o primeiro quadro que o bebê é diabólico mesmo.
A melhor coisa do original, disparado, é a música do Jerry Goldsmith, com coro gregoriano sussurrando “Anti-Cristo”. Não acredita? Então pegue o DVD de 76. Veja a cena dos macacos reagindo ao guri, ou do guri indo de carro pra igreja. Não tem comparação. E tudo isso por causa da trilha sonora, que é das mais banais nesta refilmagem quase quadro a quadro. Jogaram duas ceninhas de pesadelo só pra tentar assustar. Mas a embaixada americana em Londres era e continua sendo a casa da mãe Joana, onde qualquer padre perturbado pode contar pro embaixador, “A mãe dele era um chacal”. E como que ele sabe? Ué, tem prova. Tá na Bíblia.
Aqui os atores estão mal e não convencem. Só a Mia Farrow no papel de super nanny tá bem. O menininho do original era fraquinho, mas, perto deste daqui, merece um Oscar póstumo. Em 76 quem fazia o pai era o Gregory Peck, talvez um pouco velhinho pro papel, mas ainda assim eficaz. Desta vez o Liev Schreiber (de “Sob o Domínio do Mal”, versão 05) fica com eterna cara de tacho. Não sei se a culpa é dele ou dos diálogos. Por exemplo, a mulher dele acabou de dar à luz e o bebê morreu. Um padre diz pra ele, “Ó, ela nunca mais poderá ter...” E o carinha: “poderá ter o quê?”. É um gênio esse embaixador. Esse diálogo surreal só se torna mais crível quando a gente pensa na eficiência da política externa americana. E, claro, quando descobrimos que o carinha é afilhado do presidente americano. Tá nos genes! Depois o mesmo superdotado intelectualmente conversa com um psiquiatra, e o papo é teológico. Um pergunta pro outro, “Você acredita em?..”, e o outro, “Em? Em?” Alternativas possíveis: a) Deus; b) ursinhos rosa; c) vida inteligente em outros planetas. Com um pessoal tão devagar eu parei de me preocupar com o fim do mundo, porque não mudaria muita coisa mesmo.
A parte da decapitação é até engenhosinha. No original, essa cena virou clássica, mas beira o ridículo. Tem três câmeras filmando, e a gente vê e revê o cara perdendo a cabeça sob vários ângulos, em câmera lenta. E ambas as versões estabelecem rottweilers, e não pitbulls ou dobermans, como cães do demo. A cena do cemitério na refilmagem é estúpida. Quando a gente vê um rottweiler no quarto, ele é o bicho mais barulhento do mundo. No cemitério vários cães conseguem se materializar em cima da vítima de repente (no original havia mais cães e, ouvindo os comentários do diretor, a gente fica sabendo que durante as filmagens os rottweilers estavam mais interessados em montar uns aos outros do que em morder o Gregory Peck).
E o encontro final entre a babá e o embaixador é puro trash, se bem que o senhor do meu lado quase bateu no teto por causa do susto. Pode ser que ele seja mais sensível do que eu, uma casca-grossa de marca 666.
A Coisa Ruim e seu Rottweiller