Geral
DOR NÃO TEM HIERARQUIA
Marcia Baratto deixou um lúcido comentário no post sobre a briga entre radfems e transativistas:
Segregar é uma clássica estratégia mascu para dizer que mulheres, ora bolas, exatamente por que têm vagina, são inferiores aos homens. Rads, ainda bem, não dizem nada disso, mas usam do argumento que é construído sobre a mesma categoria: biologia, para diferenciar mulher cis de mulher trans. Então para muitas feministas, aí eu me incluo, definir mulher (que é também gênero, construção social) por uma característica biológica é abraçar com carinho nossos inimigos. Não funciona para mim. Sobre socialização, sequer acho que há uma única construção social sobre o que é ser mulher, mas certamente, ser delicada, usar maquiagem, ser carinhosa, cuidar das pessoas, é uma das construções mais usuais, pelo menos para o imaginário de muitas escritoras feministas, geralmente todas de classe média ou classe alta. Que radicais queiram apontar como essa construção de uma figura de mulher dócil é também a contraparte obrigatória da figura de mulher submissa, acho ótimo. Só que acontece que a figura da mulher submissa também é construída de outras formas, que passam longe da imagem da mulher dócil, aquela que usa maquiagem, tem como único trabalho óbvio cuidar dos outros/família, e deve ser linda e cordial acima de qualquer coisa. Daí que eu não vejo muito sentido em acusar mulheres trans por quererem seguir esse estereótipo, por que ele não determina (pelo menos, na minha opinião) a estrutura de opressão sobre mulheres.
Mulheres agricultoras e operárias, por exemplo, têm historicamente no brasil sua figura de mulher projetada de forma complemente diferente: não se vestem bem, ou usam as mesmas vestimentas que homens (especialmente as mais pobres), não usam maquiagem, não devem chorar, precisam ser fortes o tempo todo, cumprem a dupla jornada de trabalho. A figura da mulher submissa aí é construída em outros termos, e a opressão específica de ser mulher, foge às relações da vida privada que são tão fortes para parte da crítica feminista dita radical. Meu problema com a vertente radical, então, é tornar política apenas a primeira construção da mulher submissa e não saber lidar muito bem com as outras figuras. E aí tem outra similaridade com o discurso mascu que me é assustadora: reduzir tudo a uma única imagem, com pouca tolerância para a diversidade. Eu presenciei feministas radicais brancas dizerem a uma trans negra que ela não tinha o direito de falar sobre racismo. Se uma negra não tem o direito de falar sobre racismo, então quem tem? E, dessa forma, agem segregando não apenas biologicamente, mas racialmente, mulheres de homens.
Por outro lado, entendo totalmente a questão do silenciamento que muitos espaços radicais sofrem não por segregarem trans, mas por terem uma pauta específica de atuação. Não tem jeito, temas com menstruação, aborto, parto, estão indissociavelmente ligados à característica biológica de ser fêmea, então precisam sim ser tratados por quem vivencia esses fenômenos. No fundo vejo essa questão como parte da nossa falta de maturidade em lidar com muitas dores, mas acho que haver espaços específicos para debates da pauta trans e rad em eventos feministas poderia começar a abrandar essas polêmicas, que não passam de uma disputa para dizer quem sofre mais. Gente, dor não tem hierarquia, quem sente, sente.
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