ENTREVISTA PARA A FOLHA SOBRE O CASO DO PROFESSOR
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ENTREVISTA PARA A FOLHA SOBRE O CASO DO PROFESSOR


Semana passada dei uma entrevista para a Folha de S. Paulo, para a querida Marcela Paes, que já havia me entrevistado outras vezes. A matéria saiu bem truncada no domingo, então pedi autorização pra publicar a entrevista completa aqui. Nem sei se o assunto ainda atrai interesse ou se alguém vai ler. Vocês estão todxs viajando mesmo!

Folha: Nesse caso específico do prof. Idelber, a troca de mensagens com as duas mulheres que se dizem vítimas pode ser considerada assédio sexual? Se sim ou não, por quê?
Resp: Acho que enviar foto não solicitada do pênis, como o professor em questão fez com várias mulheres, pode ser visto como assédio sexual. No caso das duas mulheres que denunciaram, uma delas tinha quinze anos quando começou a ser abordada por ele na internet. Mas não sei se foi assédio. Como eu disse o tempo todo, não considero criminoso o que ele fez (mandar mensagens; já usar seu cargo como professor para seduzir alunas é muito problemático, principalmente nos EUA). 
Eu e tantas outras pessoas ficamos surpresas ao constatar que a persona dele -– professor, intelectual, defensor dos direitos humanos, feminista -– é tão diferente do que ele parece ser em particular. Por exemplo, numa das mensagens com a adolescente, ele enviou os prints de uma amante que ele tinha tido. Quando o marido policial desta amante descobriu a traição, colocou uma arma na cabeça da esposa. E o professor usou este caso como modelo do seu sucesso. É bem perturbador.
A moça que me procurou para contar a sua história não era adolescente. É casada e tem 25 anos. Mas o que ela diz é que, se o professor não fosse tão bem conceituado, ela nem teria permitido ser adicionada por ele em sua rede social. É antiético fingir ser feminista para levar feministas pra cama.

Folha: Como as mulheres podem distinguir se estão ou não sendo assediadas nas redes sociais?
Resp: Acho que, de modo geral, as mulheres adultas sabem quando estão sendo assediadas. Uma foto do pênis não é algo muito ambíguo. Aí vai de cada uma decidir o que fazer. O importante é que quem queira denunciar tenha a coragem e as condições de fazê-lo.

Folha: Por que muitas blogueiras femininistas se calaram diante desse episódio?
Resp: Creio que é porque o professor era uma figura muito conhecida e admirada entre várias feministas, que divulgavam mais os textos dele do que os de qualquer blogueira feminista. Muitas preferiram se calar a criticar alguém que admiravam. O outro motivo é que o professor namorava uma feminista. Muitas acharam que falar sobre o caso era expor essa mulher.

Folha: Você foi criticada por outras feministas pela sua postura. Como enxerga essa divisão e essa reação contrária na militância feminista?
Resp: Estou acostumada. A divisão é comum entre as militantes feministas em inúmeros assuntos. Nunca há unanimidade. O que precisamos fazer é aprender a discordar. Por exemplo, não é porque uma feminista discorda da outra que seja mais ou menos feminista.

Folha: Na sua opinião, toda mulher que sofre assédio deveria se identificar? O que acha da não exposição dessas duas vítimas do caso Idelber?
Resp: Para mim, que há sete anos me exponho com meu rosto, nome completo, local de trabalho, todo dia na internet, e que recebo centenas de ameaças de morte e xingamentos simplesmente por ser feminista, é difícil dizer que uma mulher deveria se identificar, porque fazer isso é receber o tratamento que eu recebo. Tenho 47 anos, sou casca grossa e nunca me deixo abalar, mas estamos falando de moças jovens, com menos experiência. Por outro lado, dizer quem você é confere mais credibilidade ao que você está dizendo. De modo geral, por um lado quero que todas as internautas tenham coragem e assinem com seu nome completo. 
Por outro, só o fato de ter um avatar feminino já implica que a pessoa sofrerá muito mais assédio, insultos de cunho sexual e ameaças de estupro do que se tiver um avatar masculino. Então entendo perfeitamente quando uma internauta não quer se identificar.
No caso das duas vítimas, se elas já foram vilipendiadas de tudo quanto é jeito sem se identificarem, imagine como estaria a vida delas agora se todos soubessem seus nomes.

Folha: Por que o prof. Idelber foi tão defendido nas redes sociais? Tanto por homens como também por muitas mulheres?
Resp: Porque este é o comportamento padrão na maioria dos casos de denúncia. Duvida-se sempre das vítimas. As culpadas acabam sendo as vítimas. A sociedade adota o discurso de “denuncie sempre”, mas, quando há denúncias, a reação é sempre desmerecê-las. Como de costume, muitas pessoas só titubearam na defesa do professor quando um homem validou o que as mulheres diziam. Foi quando eu publiquei o depoimento de um ex-aluno do professor dizendo que o que aquelas duas vítimas contaram era só a ponta do iceberg, e que seu comportamento predatório na universidade americana onde dá aula era conhecido. Foi nesse ponto que a opinião pública mudou e muita gente passou a ver as atitudes do professor como impróprias. E foi só aí que o professor se manifestou, ameaçando todo mundo com processo, para intimidar mais vítimas de se manifestarem.

Folha: O que você acha do fato de que o prof. Idelber só gostava de sair com mulheres casadas?
Resp: Não acho nada. Esse é um fetiche dele. Se ele só se envolvesse com mulheres casadas que concordassem com sua abordagem, nem estaríamos falando do assunto.

Folha: Muita gente acha que as críticas ao comportamento do prof. Idelber tem cunho moralista porque ele só gostava de sair com mulheres casadas e também por praticar o "cuckolding". Qual a sua opinião sobre isso?
Resp: Acho incrível que muita gente veja as denúncias como moralistas, e não o fato de um professor que até um mês atrás era um modelo de feminismo escrever mensagens chamando mulheres que transam de putas e seus maridos de cornos. Eu e essas moças que denunciaram temos uma posição favorável quanto ao relacionamento aberto, por exemplo. Quem nas mensagens era contra o relacionamento aberto era o professor. Isso, pra mim, é moralismo.
Eu fico só imaginando o que várias das pessoas que defendem o professor estariam dizendo se fosse um pensador de direita que pedisse para uma moça com quem se comunica entrar num hangout e, quando ela entra, ele está se masturbando. Tenho a impressão que os defensores não seriam assim tão compreensivos. O que é incrível, para mim, é que este professor vinha fazendo isso há anos. Muita gente sabia, e ninguém falava nada. Quando uma das vítimas me procurou, eu pensei que o caso jamais viria à tona.
Que eu saiba, o “cuckolding” é algo bem diferente. No cuckolding há consentimento de todas as partes (amante, esposa, marido). O professor parecia sentir prazer em competir com esses maridos e humilhá-los. Pelas mensagens, percebe-se um comportamento totalmente narcisista, de alguém que tem um ego tão grande que é incapaz de olhar para o outro. Uma atitude nada bacana vinda de alguém que se dizia feminista. 




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