Estaca zero para os gastos públicos - NILSON TEIXEIRA
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Estaca zero para os gastos públicos - NILSON TEIXEIRA


VALOR ECONÔMICO - 30/09

A perspectiva de que o País cresceria de forma substancial por muitos anos contribuiu para a avaliação, por parte dos governantes, de que a receita fiscal continuaria a aumentar expressivamente nesse período, diminuindo a urgência no avanço das reformas estruturais. Mais do que isso, permitiu que a distribuição de privilégios e vantagens permanecesse exagerada para vários grupos, dentre os quais profissionais liberais, funcionários públicos e empresas de diversos setores. Segundo o governo federal, as renúncias tributárias alcançarão cerca de R$ 300 bilhões em 2016.

A realidade não confirmou os sonhos de anos atrás. O país não cresceu em 2014 e estará em recessão em 2015, 2016 e, possivelmente, 2017. A probabilidade de a atual década ser mais uma década perdida em termos de expansão econômica é cada vez maior. Surpreende que, mesmo nesse ambiente, diversas camadas da elite continuem conseguindo ainda mais privilégios, mesmo com a expectativa de forte alta do desemprego.

A crise fiscal que o país enfrenta exige a reversão de muitos dos privilégios concedidos nas últimas décadas. É importante que o governo demonstre à sociedade que esses benefícios não podem ser mantidos apenas sob o pretexto de que são direitos adquiridos pela atual geração. Do mesmo modo, é necessário mostrar à população que os direitos concedidos ultrapassam em muito as condições do país mantê-los.

É crucial redesenhar a estrutura tributária e dar transparência no orçamento a todos os subsídios concedidos

Ao contrário de propor soluções apenas paliativas, o governo precisa debelar a crise fiscal de forma definitiva. Essa atuação tem que ocorrer em duas frentes.

A primeira é apresentar ao Congresso uma ampla reforma tributária. Perseverar com a atual estratégia de elevar impostos é muito desfavorável para o país. As recentes manifestações de diversos segmentos estão corretas ao defender que não há mais espaço para a elevação da carga tributária e que é necessário encontrar um rumo para evitar que a crise se torne mais generalizada. É crucial redesenhar a estrutura tributária e dar transparência no orçamento federal a todos os subsídios concedidos, de forma direta ou indireta.

O segundo eixo é propor ao Congresso uma reavaliação ampla da utilização das receitas fiscais. Talvez essa seja a principal missão do governo nos próximos anos. O argumento de que não há como cortar mais despesas é equivocado. A abordagem mais correta seria partir da estaca zero nos gastos públicos, analisando seus impactos sociais e econômicos. Isso tornaria a utilização dos recursos mais justa e transparente. Seria um trabalho muito difícil, pois as alterações na Constituição nas últimas décadas tornaram obrigatória parte substancial das despesas. Essa dificuldade também está associada à necessidade de aprovar legislação pertinente para reduzir ou eliminar vários desses gastos. Porém, isso não pode impedir a ação do governo.

Os primeiros gastos a serem avaliados, que correspondem a cerca de 50% das despesas do governo federal, teriam que ser os da Previdência Social e os dos salários e benefícios do funcionalismo público. A necessidade de estipular a idade mínima de aposentadoria em ao menos 65 anos, tanto no setor público como no privado, tanto para mulheres quanto para homens, incorporando uma regra de transição para a atual geração, é premente. Já há no Congresso o entendimento de que esse ajuste é fundamental. Porém, o governo ainda precisa encampar essa proposta.

Em outra frente, apesar de não ser possível reduzir salários imediatamente, o governo poderia, ao menos, impor limites rígidos para o teto salarial e limitar o aumento dos gastos com o funcionalismo público à inflação do ano anterior. Isso estimularia a busca de maior eficiência na máquina pública.

No entanto, isso é insuficiente. É necessário revisitar uma boa parte dos benefícios existentes. Em um primeiro momento, o Executivo e o Legislativo analisariam os custos e benefícios de todas as dotações orçamentárias, inclusive as transferências para fundos e programas governamentais. Muitos desses benefícios não contribuem para a melhoria do bem-estar social e tampouco aumentam a produtividade da economia.

Como forma de respaldo à tomada de decisão, o governo poderia definir que a Secretaria de Orçamento Federal, com o apoio de órgãos do governo, do Congresso e da sociedade, apresentasse, no prazo de 60 dias, uma avaliação dos custos e benefícios de todos os gastos e subsídios do governo presentes no Orçamento ou nos inúmeros fundos públicos. Esse seria um trabalho inestimável para a tomada de decisão sobre quais as prioridades.

A pressão sobre os congressistas seria enorme, em particular por parte dos grupos de interesse mais poderosos. Todavia, essa é uma das razões que tornam nobre o trabalho do Congresso: definir as prioridades na utilização de recursos públicos, que são ainda mais escassos na atual conjuntura. A decisão precisa focar no aumento da competitividade da economia e na redução das imensas distorções, que tornam o Brasil um dos países mais desiguais em termos de renda e riqueza.

Meus candidatos para as primeiras posições na lista das despesas discricionárias prioritárias são o Bolsa Família e os recursos que seriam utilizados para incentivar os professores do ensino básico a perseguirem melhores resultados nas provas de verificação. Entre as posições no fim da fila, os subsídios disseminados do BNDES, o abono salarial, entre muitos outros.

Apesar dos obstáculos, sou otimista. Caso encaminhadas ao Congresso e aprovadas com a devida celeridade, as propostas mencionadas aqui seriam capazes de reverter o sentimento desfavorável sobre as contas públicas. Tenho convicção de que reduzir ou mesmo eliminar programas, subsídios e renúncias tributárias que pouco ou nada contribuem para a melhoria da distribuição de renda ou da competitividade da economia é o melhor caminho para que o País possa sair mais forte desta crise.

Nilson Teixeira é economista-chefe do Credit Suisse, Ph.D. em economia pela Universidade da Pensilvânia




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