GUEST POST: RELATO DE ALGUÉM QUE JÁ FOI REAÇA
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GUEST POST: RELATO DE ALGUÉM QUE JÁ FOI REAÇA


O jovem Matheus me enviou este relato:

Lola, tenho lido seu blog quase que diariamente nos últimos tempos. Leio sempre os relatos que as pessoas te mandam e ficava morrendo de vontade de mandar o meu, mas sempre achava que não tinha nada de mais pra contar. Até que li um texto seu em que você diz que é muito raro uma pessoa reacionária mudar suas ideias. Foi aí que eu resolvi mandar algo.
Eu tenho 17 anos ainda, mas sempre me interessei muito pelas coisas do mundo. Não sei até onde isso foi bom, talvez eu tenha perdido uma parte da infância e da adolescência, ou talvez tenha sido positivo, sei lá. O fato é que eu sempre tive posturas reacionárias. Pra isso, colaboravam as palavras de pessoas com quem eu convivia e que eram exemplo de vida pra mim, além de leituras, opiniões de famosos, essas coisas todas. Em suma, eu era um menino que, já antes dos 15 anos, odiava gente pobre, achava que beneficiários de Bolsa Família eram vagabundos, odiava mulheres "promíscuas", essas coisas todas que a gente vê no discurso coxinha por aí.
Tudo muito bem, mas aí chegou a adolescência, e a fase de desenvolvimento da sexualidade. Lá pelos meus 12 anos eu percebi que era diferente daquilo que todo mundo (e eu também) esperava. Eu gostava mais de olhar pros meninos, e dizia que "gostava de mulher" sem muita convicção ou vontade. Mas eu acreditava realmente que aquele desejo pelo mesmo sexo era uma fase, uma coisa que eu podia mudar se não "praticasse". Nunca fui religioso, quando eu tinha 15 pra 16 anos tornei-me ateu, mas mesmo assim eu abominava aqueles pensamentos "errados". De alguma forma, eu sentia que podia esconder aquilo tudo. E isso intensificou o machismo na minha jovem vida.
Eu reproduzia discursos heteronormativos e machistas porque, de certa forma, isso fazia com que a minha verdadeira condição fosse mascarada. Fiquei alguns anos assim. Não sei se você chegou a conhecer a comunidade oficial da cidade de São Paulo, no Orkut. Pois bem, aquilo era um antro de mascutrolls em diferentes graus de loucura, e eu participava. Foi um lugar onde absorvi muitas ideias atrasadas e patriarcais. Quando eu penso nos motivos de ter participado daquilo, percebo que a negação da minha sexualidade é a única explicação cabível. Enfim.
No começo deste ano, eu mudei de cidade. Foi um choque pra mim, mas ao mesmo tempo uma chance de recomeçar, longe de pessoas com as quais estava acostumado, e de ideias também. Acho que uns dois ou três meses depois, uma certa noite, conversando com amigos online, percebi que não dava mais pra me esconder no armário, e pela primeira vez admiti ser gay. Não sei explicar o que eu senti naquele momento, só sei que foi uma das melhores sensações da minha vida. Só não foi melhor do que contar pra minha mãe (que me aceitou plenamente), alguns meses depois.
O fato é que, depois dessa admissão pra mim mesmo, comecei a enxergar as coisas de uma maneira muito diferente. Percebi que eu poderia apoiar ideias reacionárias pro resto da minha vida se quisesse, mas que seria um absurdo. Afinal, são essas mesmas ideias que levam outras pessoas a serem mortas na rua simplesmente por serem gays, como eu. São essas ideias que discriminam mães solteiras/sozinhas, justamente o tipo de mãe que eu tive (meu pai morreu quando eu tinha uns 7 anos). 
Eu não poderia ser feliz apoiando gente que diz que eu sou uma aberração, que acha que eu tenho que ser curado. Foi nessa época que o Marco Feliciano se tornou presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias na Câmara. Ao mesmo tempo, eu estava convivendo com pessoas novas, algumas incríveis e outras incrivelmente machistas e, portanto, homofóbicas (ninguém sabia que eu era gay, não que eu tivesse medo, mas achava que ninguém tinha nada a ver com isso, e ainda acho, apesar de achar que me assumir foi importante).
Hoje eu sou outra pessoa. Não sei se posso dizer que sou de esquerda, mas digo que sou. Existem ainda muitos traços de preconceito em mim, mas estou tentando superá-los pro meu próprio bem. Sabe, eu sou esperançoso. Vejo toda essa onda conservadora com muita tristeza, mas a cada comentário que a rechaça fico mais feliz, tenho mais perspectivas em um futuro onde eu arrume um namorado/marido e possa demonstrar carinho com ele no meio da rua, se quiser, sem medo de ser atacado.
A sociedade nos impõe formas de pensamento opressoras, mas a chave pra nos livrarmos disso está dentro da gente. Não tem código escrito que diga que eu não posso ser gay, que eu não possa "demonstrar". É tudo regra que alguém caga pra nos oprimir. Por isso, com as possibilidades que surgem, eu luto contra o machismo. Não posso deixar as coisas serem do jeito que são por comodismo. Não quero que nenhum outro adolescente ouça de professores, como eu ouvi, "Por favor, não tenho nada contra gays, mas não seja um". Isso doeu, principalmente porque eu ainda estava na fase da dúvida, e já recebi um balde de água fria na cara.
Não saio dizendo que sou gay, mas quem me pergunta ouve que sim, eu sou. Acho que, mais do que um ato pela minha felicidade, isso é militância. Mostrar que nós existimos, queremos respeito e apenas respeito, em tudo. A nossa classe é desunida, as minorias costumam ser, mas eu não me importo. O que eu puder fazer pra melhorar o mundo e as pessoas eu vou fazer. Posso estar parecendo bobo ou idealista, mas é o que eu sinto, o que eu quero, de verdade. Acredito que não é nos escondendo que vamos conseguir alguma coisa. E quando digo isso, falo de todxs nós.




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