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HOMEM, E SE A GROSSERIA NA RUA FOSSE COM VOCÊ?
Pra maior parte das mulheres, uma grosseria na rua será vista como uma invasão. Um total estranho fala com ela sobre algo sexual, do seu corpo (e muitas vezes a frase vem acompanhada de uma "inocente" passada de mão)! Vai por mim: a gente não gosta não. Se a cantada for à noite, então, a gente gosta menos ainda. Se a cantada for à noite, quando a rua está vazia, a gente tem medo. Pavor. É difícil entender isso sem ser mulher, ou sem se colocar no nosso lugar, mas faz um esforço, vai: você tem mulher, namorada, mãe, filha, avó e, por incrível que pareça, todas já passaram por isso. Sei que você não acredita, mas (quase) toda mulher tem uma história de horror pra contar. O que não quer dizer que ela vai querer contar pra você. Um terço das mulheres no mundo já sofreu algum tipo de violência sexual. Creio que os outros dois terços escaparam por pouco. Eu escapei por um triz de várias situações, e olha que eu vim de um lar privilegiado, protegido, sem predadores internos
. Mas ninguém está a salvo. Nasceu mulher, vai passar por uma (ou mais, muitas mais) situações terríveis na vida. A gente aprende desde cedo pra não falar com estranhos (meninos também aprendem isso, não?), a desconfiar de estranhos, e mesmo assim não tem jeito: vem um estranho falar com a gente de qualquer forma, mesmo quando a gente é criança sem corpo formado ainda.
A gente também é treinada a não reagir. E, caso aconteça algo pior, a gente é educada para ter certeza que a culpa foi nossa, que foi a gente que provocou de alguma forma, que poderia ter evitado... Portanto, tudo conspira contra nós. E vocês homens, como foram educados nesse caso? Foram educados que mulher sozinha é mulher disponível, seja na rua quanto no bar. Foram educados que vocês têm que dar em cima de toda e qualquer mulher que passar pelo seu caminho, se não vocês não são másculos o suficiente. Isso é péssimo pra vocês, e taí uma coisa que não dá pra culpar as mães. Eu pelo menos não conheço mãe nenhuma que ensina o filhote a mexer com menininhas na rua. Vocês foram educados (e acho que nós também, porque escutamos isso o tempo todo) que mulher a-do-ra ouvir grosseria na rua ― mesmo que ela demonstre não ter gostado, no fundo ela tá fingindo e amou, e sabe-se lá por que ela não segue você pro seu apartamento naquele exato instante (mulher é um bicho muito esquisito mesmo).Num post sobre grosserias, a Letícia comentou: "Acho q o q talvez os faça entender um pouco como nos sentimos é se imaginar andando sozinho pela rua e dar de cara com um grupo de outros homens q elogiam alto, em público, partes específicas do seu corpo - dando nota, até! -, descrevem o q gostariam de fazer com vc e evidenciam sua excitação através daqueles sons masculinos típicos, tipo aquele "sssssss", sabe?" (As Olívias tem um vídeo sobre o desconforto que homens sentem ao serem assediados por mulheres. Não quero recomendar muito, porque o grupo tem um outro vídeo, esse nojentão, sobre homens calando mulheres através do sexo oral). O Patrick também perguntou: "
Vocês gostariam de levar cantada de um gay na rua? Ou isso lhes daria 'razão' para agredi-lo?" Os leitores homens, os mesmos que reclamavam que pô, vocês feministas querem acabar com a paquera!, disseram que não achariam nada de mais. E então o Patrick praticamente escreveu um post: "Eu estranhei as respostas, porque a minha experiência na vida real é bem diversa. Cito três casos (o 1 me foi relatado, o 2 e o 3 foram consequências de questionamentos meus em sala de aula):1) um amigo, defensor dos direitos das minorias, anti-homofóbico, sem preconceitos, ao passear de mãos dadas com sua esposa por uma praia nos Estados Unidos, com alto índice de frequência de homossexuais, sentiu-se constrangido só de pensar em levar uma cantada.2) um colega de sala, na faculdade de direito, relatou como, ao brincar no carnaval de Olinda, entrou por engano numa 'rua gay', e saiu de lá correndo com medo de receber uma cantada. Ele fez esse relato para justificar porque tinha preconceito com homossexuais e era contra o PL que criminalizava a homofobia.3) um professor de direito penal relatou porque alguns tipos penais estão ultrapassados. Deu como exemplo que não se pode considerar como atentado ao pudor um beijo de língua numa mulher, mesmo que arrancado à força, durante uma festa carnavalesca, ainda que em via pública. Na visão dele, se a mulher está lá, implicitamente concordou com um 'contrato social' que estabelecia um 'vale tudo' em certos aspectos. Quando lhe questionei, então, se isso também valia para 'um negão de 2m que o abraçasse e arrancasse à força um beijo de língua' (ironizei três preconceitos simultaneamente: machismo, racismo e homofobia), ele respondeu que era 'obviamente uma situação diferente' e puxou uma leva de risadas da turma para me constranger e evitar responder à minha pergunta."Dizer grosserias na rua é, além de demonstração de poder da parte dos homens (só quem tem poder se dá ao direito de avaliar), uma espécie de terrorismo sexual. É uma prática cultural que pode e deve ser mudada, assim como vem sendo diminuída em vários países mais ricos. As brasileiras que já viajaram ao exterior veem a diferença, e as europeias que viajam pra cá também. Elas não estão mais acostumadas com esse tipo de tratamento neandertal. E não é incrível? Apesar de grosserias na rua não serem mais socialmente aceitas em muitos países, lá as pessoas continuam se conhecendo, paquerando, namorando, casando. Não é que houve uma queda abismal no número de relacionamentos hétero depois que todo mundo passou a considerar um grande loser quem dissesse "Se eu tivesse uma mãe assim, mamaria até os trinta anos". Mas não podem ser apenas as mulheres que condenem essas idiotices. A gente já faz isso, e elas continuam. São vocês, homens, que têm que achar isso inadmissível. Faça a sua parte: converse com seus amigos. Explique que esse comportamento ridículo só queima o filme de todos os homens. Sim, inclusive o seu.
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