O PIOR CENÁRIO POSSÍVEL E MINHA CRISE PASSAGEIRA
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O PIOR CENÁRIO POSSÍVEL E MINHA CRISE PASSAGEIRA


Gente boa, muito obrigada de coração por todos os conselhos e palavras de apoio que vocês me deram durante a minha crise existencial. Como eu disse nos comentários, uma das vantagens de ter postado sobre o meu ataque de pânico tão pessoal é que minha mãe veio falar comigo com uma reação diferente do que eu esperava. Nada de desespero. Ela disse que se solidarizava comigo, que entendia o receio em largar a vida boa que temos aqui pra nos aventurarmos numa outra cidade, que a criminalidade de Fortaleza realmente é um problema, mas, em compensação, teríamos uma vida cultural mais intensa e com mais amigos que a que temos em Joinville, e diagnosticou, talvez corretamente, que o meu medo maior era de voltar a morar numa cidade grande, mais do que de um novo emprego. E emendou que, caso eu decida que iremos permanecer em Joinville, devo avisá-la com antecedência pra ela poder se matricular nas aulas de cerâmica e pintura a tempo.
Não sei por que estou desse jeito, tão medrosa. Não tem muito o que dar errado. Quando eu me mudei de São Paulo pra Joinville, 16,5 anos atrás, em julho de 93, eu não tinha nada além da casa, que havia acabado de comprar por 7,500 dólares. Todo o dinheiro que tinha era o que sobrou dos dez mil dólares que eu havia guardado nos sete anos anteriores. Eu tinha 26 anos, não tinha diploma, não tinha profissão definida (até então eu havia sido redatora publicitária, assessora de imprensa, e revisora), e mal tinha um namorado (o maridão hesitou em vir pra Joinville e só se mudou pra cá um semestre depois, o covardão—bom, ele me ajudou com toda a mudança, mas só veio em definitivo em janeiro de 94). Ele também não tinha grande coisa: um Chevette vermelho ano 78 que pouco tempo depois começou a ter goteira, e um “patrimônio” calculado em portas de madeira (é uma longa história: a família do maridão, nos anos 80, teve um depósito de material de construção. Quando o troço fechou, o maridão teve que optar se ficava com um apartamento ou centenas de portas. Adivinhem o que ele escolheu? Isso tudo foi antes d'ele me conhecer e poder evoluir como ser humano, então o perdoo. Mas ele trouxe as centenas de portas pra Joinville, e elas ocuparam nossa garagem durante vários anos. Ainda que muitos dos móveis que ele fez pra casa tenham sido feitos usando algumas portas, podemos dizer que ele superestimou o valor de seu patrimônio). E, lógico, a gente tinha o nosso charme, a nossa juventude, e nossa habilidade de jogar xadrez (a dele mais que a minha, cof cof). Num outro post eu contarei mais sobre minha primeira atividade comercial em Joinville, prometo. Tenho certeza que realmente tínhamos pouca coisa porque, uns poucos anos depois, surgiu a oportunidade de comprar um terreno por 20 mil reais, e a gente ficou muito inclinada a comprá-lo, mas ia ficar com a conta zerada. E, apesar de chegar aqui sem nada, nunca passamos pela menor dificuldade. Somos privilegiados e sabemos disso: conseguimos emprego, juntamos dinheiro, eu fiz (nesta ordem) especialização, graduação, mestrado e doutorado.
Quer dizer, não dá pra comparar a situação que tínhamos quando chegamos a Joinville com a situação que teremos chegando a Fortaleza. Dinheiro no banco, uma casa que vale mais, mais experiência profissional, diplomas e títulos. Apenas isso já seria suficiente pra avalizar nossa mudança. Some-se a isso que pelo menos um de nós dois terá um emprego garantido com um ótimo salário, numa profissão que estudou anos para poder exercer, e o medo que a nossa nova vida possa dar errado cheira mesmo a estupidez. Mas eu sou humana, né? (ok, há divergências). E, lógico: querer mudar quando a situação está ruim (como estava quando eu vivia em SP) não é difícil. Mas quando ela está boa, ninguém quer mudança nenhuma.
O legal dos recados que vocês me deixaram é que pude ver como vários deles são parecidos com os que eu dou a pessoas em situação parecida. Então por que eu não pulei uma etapa e dei eu mesma esses conselhos pra mim? Porque não funciona assim, evidente. Mas só posso concordar com vocês: nada é para sempre, nada impede que, se algo der errado, eu me mude de novo, ou mesmo se der certo eu ainda posso me mudar e curtir a aposentadoria noutro lugar. Eu adoto sempre uma tática do worst possible scenario, mas desta vez isso me escapou, o que foi um erro. Nessa tática do pior cenário possível, eu imagino tudo de ruim que pode acontecer. Eu adoro isso porque, quando a gente pensa em termos mais específicos, menos abstratos, acaba vendo que o pior, muitas vezes, nem é tão horrendo. Claro que em certas ocasiões me falta imaginação pra pintar cenários de horror, portanto, conto com vocês. Mas e aí, o que pode acontecer de tão ruim se eu me mudar pra Fortaleza? (sem altos terrorismos do tipo “eu posso ser assaltada e como sou pão dura e nunca tenho dinheiro o ladrão pode me matar como retaliação”. Essas fatalidades mais extremas não contam. Porque senão eu usaria “eu posso ser atingida por um helicóptero enquanto estou descansando na minha casinha em Joinville”). Vejamos os piores cenários:
a) eu pego Fonética não só no semestre que vem, mas no ano inteiro. Seria horrível, mas seria a mesma disciplina. Não teria que preparar tanta aula na segunda vez.
b) eu percebo que estou muito mal acostumada e que cansei de trabalhar duro, mas isso depois de no mínimo um ano, né? Eu largo o emprego e dou aulas de inglês numa escola de idiomas de Fortaleza. Até lá o maridão já tem renda pra nos sustentar.
c) eu não me adapto a Fortaleza (e a cidades grandes em geral) por vários motivos: sou assaltada, o trânsito é caótico demais pra eu dirigir nele, algo muito ruim acontece com meu gatinho Calvin (eu morro de medo disso, porque aquele inútil sai toda noite por aqui, mas em Fortaleza haverá mais carros, mais cercas elétricas, mais perigos). Eu aguento um pouquinho mais enquanto me preparo para outro concurso numa cidade menor, e aí nos mudamos.
d) adendo ao c: não há outros concursos porque o PSDB ganha as eleições de 2010. Esse realmente é o pior cenário possível! A gente se muda pra Suécia. Ou pro Uruguai. Não, sério. A gente pode se mudar pra uma cidade brasileira mais tranquila, onde dou aulas de inglês numa escola de idiomas.
e) os alunos, revoltados com a minha suprema ignorância em Fonética, armam uma reação à la Uniban. Reúnem-se diante da minha sala gritando “Bur-ra! Bur-ra!”. Tenho que pedir escolta policial pra sair. Após sindicância interna, a UFC decide que eu provoquei quando falei de palato mole e me demite. No dia seguinte ela revoga a decisão. Eu vendo a casa em Fortaleza e, com o dinheiro, compro uma noutra cidade.
Tá, tirando o cenário da volta do PSDB ao poder, nenhum deles parece assim tão terrível.
Estou mais tranquila. A crise passou. Eu disse que minhas crises eram vapt-vupt, não disse?




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